No 90º debate do Clube dos Pensadores Joaquim Jorge convidou
António Costa para falar de política, como é natural, sobretudo por ser o líder
do PS e putativo Primeiro-ministro de Portugal. Após a tradicional apresentação
do convidado com uma breve nota biográfica, onde realçou o seu vasto e rico
curriculum, bem como aspetos da sua vida fora da política, pois é um ser de
carne e osso, deu a palavra ao convidado.
António Costa começou por dizer que faz este ano 30 anos da
adesão de Portugal à União Europeia, na altura a CEE e que há dois períodos
distintos a assinalar. Um primeiro deste a adesão até 2000 em que Portugal
cresceu mais que a média europeia e quase sempre acima de 3% ao ano. Depois
disso, só num ano, em 2007, teve crescimento de 2.7%. De resto foi a estagnação
e faz a pergunta que se impõe: o que aconteceu para limitar o crescimento do
país.
Os sucessivos governos não perceberam o porquê desta
dicotomia. Em primeiro lugar, o acordo multifibras que permitiu a entrada da
China, praticamente sem condições; o alargamento a Leste e a adesão ao Euro.
São estes os três fatores que causaram a estagnação por falta de estratégia
para o combate e dificultaram o ajustamento da economia. O problema, disse AC,
não se resolve com choques fiscais, nem com chiques de austeridade, como os
resultados mostram. Ainda hoje saíram números do desemprego pelo INE que são
uma vergonha para o Governo, pois há aumento e não diminuição deste flagelo. No
entanto, o Governo de PPC continua a teimar em prosseguir a sua cruzada de
empobrecimento do país (ir além da Tróika).
Portugal está hoje com uma riqueza ao nível de 15 anos atrás,
que mostra o falhanço ao ataque ao crescimento do país.
Para António Costa, o desenvolvimento e competitividade do
país terá de assentar no conhecimento, alicerçado na educação, na inovação e
formação de qualidade. Não pode assentar nos baixos salários nem no
empobrecimento do país. Não pode ser com uma Administração Pública
desqualificada e desmotivada que o país pode tornar-se competitivo. Por isso,
tem uma estratégia que é uma Agenda para a Década, que o país deve prosseguir
num processo de continuidade de políticas e de estratégia, com os pés bem
assentes no chão. Por isso, um grupo de trabalho com especialistas em economia
e provas dadas, está a produzir um documento com rigor, a que se juntarão
contributos válidos da sociedade, porque acredita que as verdadeiras reformas
se fazem de baixo para cima e não ao contrário, como tem feito este governo,
haja visto os casos das fusões de Freguesias, do mapa judiciário e da supressão
de serviços em muitas localidades, com os resultados que se conhecem. No
entanto, instado a responder sobre o assunto, AC disse que com ele o que está
bem é para manter, o que está mal para corrigir e outras situações são para
refazer. Deu o exemplo do diálogo que manteve em Lisboa para fazer a reforma
administrativa, pese embora ter maioria. Fez com base no diálogo.
A dita reforma do Estado não é cortar salários ou cortar
serviços de proximidade. O que o país precisa é de uma Administração Pública de
qualidade, que possa atrair os melhores para ser competitiva, desburocratizada
e competitiva. Os quadros que Portugal forma devem estar ao serviço do país,
injetando nas empresas o melhor que temos e não incentivá-los a emigrar, para
sobreviver, como fez Passos Coelho.
Em segundo lugar, Costa disse que é preciso ter uma agenda
europeia, porque muito se decide em Bruxelas. Ter uma visão e construir
alianças para que sejam bem-sucedidas as nossas pretensões. E deu o exemplo
recente da Grécia. António Costa disse que o Governo português não tinha de
apoiar o Syriza, mas jamais teria de o criticar e ainda mais ostracizar, porque
todos os governos que sejam contra a austeridade, que está bem de ver não
resolveu nenhum problema europeu, são importantes para que a visão ortodoxa da
austeridade da senhora Merkel seja questionada.
Quanto à agenda nacional para o crescimento ela será
construída com o apoio de todos para mobilizar a sociedade para a resolução dos
problemas endémicos que padecemos.
Quanto aos programas, para terem êxito têm de merecer a
confiança. O que se diz numa campanha tem de ser cumprido quando eleito, e não
como aconteceu aos últimos 3 PM que fizeram o contrário do que prometeram em
campanhas logo que chegaram ao poder. Aliás, AC disse que leu o que Passos
Coelho disse no CdP, que evidencia o contraste da sua prática governativa,
porque mentiu aos portugueses. Com António Costa tal não acontecerá, porque o
programa é baseado em dados com adesão à realidade nacional, realizado com
rigor por especialistas.
À pergunta se de facto ia cumprir com a promessa de reposição
dos salários dos funcionários públicos, Costa disse que tal se deve a imposição
do TC e por isso, é uma questão de justiça e de cumprimento da mesma. Sobre o
ajuste fiscal disse que não pode ser dissociado do conjunto dos impostos. A
única promessa avulsa tem a ver com a redução do IVA da restauração, pela
importância que o setor do Turismo tem no país.
Também não refutou em falar da polémica afirmação aos
investidores chineses que o PSD quis cavalgar o mérito da dita melhoria.
António Costa disse que naquela circunstância tinha de ter uma posição de
Estado, até porque não tem de dizer mal de tudo, e muito menos do seu país
estando fora de casa.
Criticou o Governo por não ter apoiado uma ideia do PS da
criação de um Fundo Europeu para o desemprego, por quem António J Seguro se
bateu, pois quando há uniões monetárias acentuam-se as divergências só
combatidas com orçamentos federais para corrigir assimetrias.
Costa também respondeu às questões relativas á transferência
de competência para as freguesias. Deu o exemplo de Lisboa, avaliando o que a
proximidade faria melhor e que meios camarários também deveriam passar para as
freguesias. Tudo feito em diálogo, sem receios de perda de poder. Para António Costa,
o Governo ainda não identificou o problema do país e sempre disse que ia além
da Tróika, mesmo com os sinais que levaram a Comissão Juncker apontar para a
necessidade da Europa ter uma agenda para o crescimento com a injeção de meios,
tal como o próprio BCE, com a compra de dívida soberana, fez com que Passos
Coelho se penitenciasse pela sua teimosia e falta de estratégia. Disse AC que o
país não tem de imitar os outros, mas ter a sua própria agenda estruturada e
rigorosa e construir as alianças no seio da UE para vencer esses objetivos.
Sobre reformas,
António Costa salientou a necessidade de uma reforma eleitoral com eleitos por
listas, respeitando a proporcionalidade, mas também com círculos uninominais
para responsabilizar e ligar mais eleito e eleitor. Quanto á regionalização,
tão diabolizada nos últimos tempos, António Costa não teve receio em responder
que é favorável, mas as condições atuais aconselham a que se avance passo a
passo, desde logo com a fixação das 5 Regiões Plano e pela sua democratização,
via eleição dos dirigentes pelos autarcas respetivos, deixando de ser nomeados
pelo governo. Conferindo uma legitimidade democrática que hoje não têm. No
futuro far-se-á a avaliação, sem dramatismos, para avançar para a
regionalização. Para isto não há que alterar a constituição, nem fazer
referendos.
O tempo escoou e Costa não pode responder à pergunta que eu tinha
preparado porque na gestão de tempo Joaquim Jorge deu por encerrado o debate. A
pergunta aqui fica. A eleição de Costa para líder do PS foi um capital de
esperança diante de tanta malvadez perpetrada pelo atual Governo. No entanto, há
uma conjugação de vários fatores: a baixa do preço do petróleo e dos juros
sobre o financiamento da economia por ação do BCE; o efeito previsível do
dinheiro do novo quadro comunitário (gera espectativas, já reveladas por
inquéritos de esperança nos portugueses); o efeito negativo Sócrates e do
curropio de socialistas a Évora, diante de tamanha evidência de que há algo
obscuro a clarificar. Também nada a favor de Costa é o líder Parlamentar, Ferro
Rodrigues, certamente uma boa pessoa, mas sem chama, sem brilho, triste, sem
imagem, sem argumentos, sem dialética, que perde todos os debates. O Presidente do Partido não está articulado com
o líder, revelando-se um desbocado, populista, que promete o que sabe não poder
cumprir (contra o que Costa pediu), dando a imagem de pouco rigor e um
facilista. A máquina propagandística do PSD a fazer render algumas destas
debilidades.
Mário Russo |
A sala esteve a transbordar pelas costuras num debate muito
esclarecedor e emotivo. Muito haveria a debater, mas Costa disse que se eleito
cumprirá a promessa a Joaquim Jorge de voltar ao CdP. Assim esperamos.