09/02/2013

Os Oradores

Miguel Mota
Os nossos políticos do topo são excelentes oradores (o Prof. Vítor Gaspar é, obviamente, uma excepção) e fazem magníficos discursos. Boa voz, muito convencidos daquilo que dizem (o que é bom para convencer os que já estão convencidos) e entusiasmam os correligionários presentes, que os aplaudem freneticamente. É claro que os ouvintes presentes são todos do seu partido e acham que o que ele diz é, realmente lapidar. Isso chega para ficarem contentes e não passa pela cabeça desses ouvintes raciocinar sobre o que ouviram, relacionar com os factos presentes e passados e muito menos tirar conclusões.

Uma outra boa qualidade que têm é um inexcedível descaramento. Vi e ouvi, na televisão, Seguro, em Coimbra, num desses magníficos discursos. Começou com uma longa lista de coisas boas que quer para Portugal. Foram muitas e, certamente porque todos as queremos, foi muito aplaudido. Simplesmente, nada disse de como as obter, as acções necessárias para as alcançar. Nada. Nadinha. Mas isso que importa, se falou tão bem!

Depois, atacou violentamente o governo que temos por estar a destruir o estado social, algo completamente inadmissível. Aplausos frenéticos de todos aqueles que já se esqueceram de que foi o seu partido, o PS, que iniciou em grande esse ataque, começando por extinguir o abono de família – criado pelo Salazar – e um bom número de centros de saúde, além de outros serviços públicos. E os pobres cidadãos, além da perda monetária do abono de família, passaram a ter de contar com bem maiores deslocações ou, em alternativa, pagar a privados que, em muitos casos, logo abriram a sua loja, aproveitando essa brecha.

Isto por um partido que se diz socialista e muita gente julga que “é de esquerda”, algo que só foi no seu início, quando andava de braço dado com o PC, em ocupações, e Mário Soares, na rua, de punho erguido, berrava “Partido Socialista, um partido marxista”. Mas esse esquerdismo acabou cedo, mesmo antes do seu chefe declarar que tinha metido o socialismo na gaveta, donde nunca mais o tiraram. Nesse dia o partido devia ter mudado de nome.

Voltando ao discurso, ouvi um enorme ataque aos políticos que prometem uma coisa em campanha e depois fazem precisamente o contrário. Até estamos de acordo. Mas já não deve estar lembrado das magníficas propostas e promessas do seu partido em 2005 e de como fez tudo descaradamente ao contrário durante os seis anos em que foi governo, de como afundou a economia e as finanças de Portugal e de como colocou o país nesta vergonhosa situação.

Note-se que o que descrevo neste exemplo se aplica a todos os partidos. Convém também lembrar que os cidadãos portugueses, além de não se poderem candidatar a deputados, não podem votar em pessoas e só podem votar em partidos. Porque – muito se apregoou – as pessoas não interessam, o que interessa são as ideias. O Salazar “tinha” de manipular os resultados das votações porque, estupidamente, deixava que as pessoas se candidatassem. Agora, não há “perigo” de ser eleito alguém que não convenha porque só é candidato quem a meia dúzia de ditadores decide. Os eleitores dum círculo têm toda a liberdade... de escolher, presumivelmente para, em seu nome, irem legislar e governar, um desses pacotes de candidatos, já escolhidos pelos chefes dos partidos. E isto, para a quase totalidade dos portugueses, incluindo ilustres politólogos, é “democracia”!
Para termos eleições livres é necessário alterar os Artigos 149º e 151º da Constituição*, da forma que já propus:

Artigo 149º
Alterar para:

Os Deputados são eleitos por círculos eleitorais uninominais, constituídos por um conjunto de freguesias adjacentes, somando um total de (40.000 a 50.000 ?) eleitores ou, no caso de haver freguesias com mais do que esse número de eleitores, por bairros adjacentes, de forma a situarem-se dentro daqueles limites.

Artigo 151º
1 - Alterar para:

As candidaturas serão apresentadas, nos termos da lei, por um grupo de não menos de X nem mais de Y eleitores do respectivo círculo eleitoral.

Definir os números X e Y. Pode considerar-se como referência a eleição para o cargo de Presidente da República, em que a proporção é de, aproximadamente, um a dois por cada mil eleitores. Para um círculo de 40.000 eleitores teríamos 40 a 80 proponentes, que parece ser número aceitável.

2 – Suprimir

 Termino com o final do artigo “Partidofobia e partidocratite”, que publiquei no “Expresso” em 1979:
“Partidos políticos como congregações de homens com o mesmo credo político, sim! Partidos como órgãos de poder paralelo, não! E partidos como órgãos de poder ditatorial, três vezes não!"