28/02/2009

O CÃO DE ÁGUA


José Magalhães

Falar sobre o cão de água português, vem a propósito do novo cão da família Obama. Num repente, já se diz à boca cheia, que na Administração Americana se fala Português. Se bem que já escolhido, o cachorrinho ainda não tem nome, e já se movimentam por aí, grupos a tentar arranjar o nome ideal para o bicho. Por mim, o nome de sonho, já que é uso moderno dar nomes de pessoas aos animais de estimação (e já agora o sr Obama deveria juntar à raça um nome bem Português), bem poderia ser Sócrates, já que tejo, bobi, piloto ou fiel, estão decididamente fora de moda. Para além disso, consta que ladrará como qualquer outro e não morderá se bem ensinado.
Cansa imenso estar constantemente a ouvir falar do que o sr Obama faz, do que o sr Obama não faz, dos elementos da Administração do sr Obama que afinal já o não são, ver cartazes do sr Obama, ouvir piadas racistas do sr Obama, telemóveis, pensos, capas, cuecas, camisas, suspensórios e outros artigos quaisquer que eles sejam, do sr Obama, e agora também o cão do sr Obama.
As notícias dos jornais, dos telejornais e outros meios, traduzem esse fascínio para os nossos concidadãos, que é o facto de um cão de uma raça chamada Portuguesa, ir passar a viver como emigrante de sucesso nos Estados Unidos da América, terra das oportunidades. Teremos emissões em directo de Washington, com especialistas caninos a botar faladura e a adoçar a boca do porteguesinho, com o nosso sentido patriótico, o prestígio da nossa Pátria e o nosso ego cada vez mais exaltados.
Portugal exultou com a notícia. Já exultara antes com a hipótese, agora andamos todos satisfeitinhos e de sorriso de orelha a orelha com a confirmação da escolha.
Com isso, esquecemos as constantes falências, o número crescente de desempregados, o congresso “folow the líder” (bem, este talvez não), o FreepotGate, a guerra dos professores, a anunciada guerra dos médicos, as greves, a compra de acções da Cimpor, o novo aeroporto de Lisboa, o TGV, a nova ponte de Lisboa, as obras na frente ribeirinha de Lisboa, os cinco mil euros de condenação por corrupção, a apreensão de livros com pinturas de um pintor célebre, o Magalhães atrasado, o BPN, o BPP, Dias Loureiro, o casamento dos homossexuais, a eutanásia, a linha do Tua, a recessão, os 150 000 milhões de euros da nossa dívida, a regionalização, e mais um arrazoado de coisas que nem vale a pena lembrar. Tudo esquecido por via das notícias importantes sobre o novo cão mais importante do mundo.
E depois, depois de pensar em tudo isto, depois de ver com o que é que Portugal exulta, fico triste, ao verificar que os nossos principais orgulhos, as coisas que mais nos enobrecem e nos notabilizam, a par das vitórias externas no futebol, e outras de igual importância, não passam de coisas insignificantes, de pouco ou nenhum valor, reles e mesquinhas.