29/12/2007

Encerramento de urgências


Mário Russo


Há decisões políticas que só podem ser tomadas após um adequado estudo técnico que as suportem. Em determinadas áreas o peso da opinião técnica deve ser maior que o peso político, porém, noutros casos ocorre o contrário. No primeiro caso temos a decisão técnica de localização de uma infra-estrutura a pesar mais que a opinião política, mas há casos em que a dimensão política deve ser maior que a técnica, designadamente quando factores sociais e humanos estão em jogo.

Isto vem propósito do programa de reordenamento da rede de saúde em Portugal, encetada pelo governo PS e o sr. Ministro Correia de Campos, que decidiu cumprir o programa de governo e, por isso, encerrar uma série de SAP, urgências e maternidades.

Certamente que o estudo técnico encomendado pelo ministério de CC é um estudo racional e levou em conta dados objectivos, convertidos em rácios de eficiência e eficácia e de custos per-capita, etc. Se fosse para reordenar a distribuição dos stands de automóvel de uma dada marca seria muito bom.

Ocorre que trata-se de uma área de grande sensibilidade para as populações. Com efeito, ao encerrar uma urgência em Vouzela, por exemplo, desprotege a população e cria um grande desconforto, pois estas sentem-se abandonadas ante uma fatalidade eventual. O argumento de que é preferível ter urgências de qualidade longe que “falsas urgências” é um argumento quantitativo, mensurável pelos padrões de unidades recomendáveis, esquecendo o parâmetro mais importante, que é o ser humano. É, também, um critério contabilístico e economicista.

A existência da tal falsa urgência, que seja apenas por um médico e um enfermeiro, é da maior importância para as populações, pois são profissionais que dão a primeira ajuda (nem que seja psicológica) confortando doente e acompanhantes, podendo, depois, encaminhar para uma unidade completa, se a situação o justificar. Mas não haverá, nesta situação, a sensação de abandono, de incerteza, de angústia. Há um profissional que avalia a situação e, na maior parte dos casos, tem solução imediata, ou diferida, providenciando solução em outra unidade melhor equipada, transportando o paciente já com um primeiro cuidado tomado e com informação para que a unidade que o receberá, estar preparada para a sua chegada.

O que está a acontecer não tem respaldo na dimensão humanista da política. Com efeito, falta a tal dimensão humanista e social que deve ser o baluarte da política na sua mais nobre expressão e que algumas vezes denunciei deste governo, dito socialista.

Deixar que milhares de portugueses se sintam inferiores, retirando-lhes conforto em área tão sensível como é a saúde, é um erro político só apoiado por cobardes seguidores partidários, como o são o líder do PS do Porto e certos deputados do PS, cegos e seguidistas.

Se esses deputados fossem eleitos em círculos uninominais, tal certamente não ocorreria. Assim, os “boys”, de comprovada incompetência, são a voz do seu dono, pactuando com processos de organização economicista de fazer corar de vergonha merceeiros.

Por outro lado, nem bom senso estas decisões têm, senão vejamos: encerrar uma urgência em Vouzela, mas deixar a de S. Pedro do Sul, poderia fazer algum sentido, mas encerrar ao mesmo tempo as duas, é uma total falta de bom senso que ilustra a cegueira das opções tomadas.

Para tomar decisões eminentemente técnicas, sem levar em consideração os aspectos psico-sociológicos e humanistas da política, não passa de uma tarefa de contabilistas. Nestas circunstâncias seria melhor e mais transparente sermos governados por 4 bons contabilistas (para trabalharem por turno), dispensando-se a “tropa” que acompanha o exército de ministros e secretários de estado, economizando ao país milhares de milhões de euros e concretizando-se o objectivo da obsessão demente do défice.

Triste o país que é governado por tecnocratas insensíveis, frios e calculistas, mas é o que temos.


membro do clube , professor no IPV e frequente no blogue