06/02/2007

O REFERENDO… AINDA






Dina Conceição

Há duas campanhas, como sabemos: Liberdade versus Existência. Ora, eu pergunto se a liberdade não necessita de existência para se realizar ? A mulher, que parece ser a única vítima para os defensores do "Sim", só pode ter liberdade se existir, e por isso eu pergunto: como pode alguém decidir sobre a existência do próximo - terá a mulher (ou fosse quem fosse) a liberdade de escolher sobre a vida ou morte do filho que está a gerar? Não estou a condenar o que a mulher faz, mas a focar o que o "Sim" pretende afirmar como um recurso legítimo e indiscutível. Uma coisa é clara: para decidir é preciso existir, e se tiramos a vida a um ser que luta pela vida em condições limitadas (útero materno) como podemos apelidarmo-nos de democratas? Quando tiramos a vida a um bebé em formação tiramos tudo, desrespeitamos a sua liberdade, a liberdade que ele devia ter de viver. O "Não" defende a Vida, a Existência do ser humano que tem o direito de viver, independentemente de outra coisa qualquer. Como se pode dizer que a vida não é um valor absoluto, que a vida não é o valor máximo, o valor a partir do qual todas as coisas são algo? Não é a vida humana uma riqueza insubstituível? Não são os homens que constroem leis, sociedades e nações? Sem vida humana não há discussão, não há referendos, não há campanhas, não há mulheres, não há liberdade. A liberdade pressupõe a existência, é correlativa dela e nada é sem ela. Por outro lado, agora que surgiu a possibilidade da suspensão da aplicação da lei - que está prevista no código penal - os defensores do "sim" parecem não querer aceitar! Então o problema é a despenalização da mulher ou do aborto? Torna-se claro que o "Sim" visa a legalização do aborto mais que a despenalização das mulheres... afinal, o principal argumento do "Sim" desapareceu. Mas o "Não" mostra a sua coerência quando afirma a defesa da vida acima de tudo e a despenalização da mulher. Se podemos conciliar a vida humana nesta fase delicada e a despenalização da mulher devíamos votar "Não", mas se o que queremos é que se possa abortar sem justificação alguma então parece que o "Sim" é o melhor. Outro argumento do "Sim" é a questão do começo da vida, mas eu frizo o seguinte: se o começo da vida é discutível então como é possível abortar algo que PODE SER alguém, uma pessoa? Já ninguém conhece o significado da expressão "benefício da dúvida"? Eu apelo aos partidos que cheguem a um consenso, mas parece que alguns estão mais preocupados em imitar os outros (a "moderna" Europa) do que em dialogar e encontrar NOVAS SOLUÇÕES - Portugal poderá ser o pioneiro numa lei mais justa para todos: homens, mulheres e crianças. Não esqueçamos que cada aborto destrói não só a vida do bebé como pode causar perturbações físicas e /ou psíquicas na mãe, no pai, nos avós, nos tios, etc. Claro que se o pai, avós, tios, etc e tal não souberem o que a mulher fez, é ela que arca com esse peso a vida toda - legalmente sozinha com a sua consciência - abandonada aos seus fantasmas em consultas psiquiátricas o resto da vida... Um bebé não nasce só de uma mãe, a mãe é o ser que o transporta no ventre enquanto se desenvolve, o bebé possui um património de reelações genéticas complexo, um bebé tem parentes além da mãe e tem uma vida que não é a da mãe. A barriga da mãe é dela, mas o seu filho não é uma parte do seu corpo, o bebé é um corpo com características próprias e irrepetíveis. Não somos donas dos nossos filhos, eles são postos à nossa guarda para deles cuidarmos - o que devíamos reivindicar seria as condições apropriadas para cuidarmos dos nossos filhos, netos, sobrinhos e não as condições para serem mortos, muitas vezes sem que o saibamos ...
professora de Filosofia