09/11/2006

Ex-autarca continua a denunciar actos ilícitos


Rui Santos


Ex-autarca continua a denunciar actos ilícitos
Paulo Morais defende o ataque cerrado às causas da corrupção

O grande problema no combate à corrupção reside na falta de abordagem às causas que a originam. Esta é a convicção de Paulo Morais, que no último debate promovido pelo Clube dos Pensadores, disse mesmo que a corrupção “é um tema esquisito na sociedade portuguesa. Ou é moda ou é tabu”. Para o ex-autarca da Câmara Municipal do Porto discute-se “muito” os sujeitos e as consequências. A ausência de um debate sobre as causas torna a corrupção uma “passerelle onde alguns se passeiam”.
No debate organizado pelo Clube dos Pensadores, Paulo Morais abordou essencialmente a corrupção nos pelouros de urbanismo das autarquias, numa clara alusão à sua experiência na Câmara do Porto e às denúncias que efectuou à Polícia Judiciária (PJ). Segundo o ex-número dois de Rui Rio, as principais funções destes órgãos autárquicos - “planear o território, licenciar e fiscalizar” - são passíveis de subversão, bastando para isso conhecer bem o sistema e ter acesso a um bom gabinete de advogados, “que muitas vezes são os fazem assessoria à Assembleia da República na legislação e depois dão pareceres imperceptíveis. Não sei como é que não há prédios no meio do Rio Douro”.
Para uma plateia bastante atenta, o antigo vice-presidente da autarquia portuense deu igualmente soluções para terminar com a corrupção, confusão administrativa e tráfico de influências, que levam à transferência, no mínimo dúbia, de solos de reserva agrícola para solos com potencialidade construtiva. Paulo Morais defendeu a simplificação dos Planos Directores Municipais, que são “documentos de planeamento imperceptíveis e que não se conseguem discutir publicamente. O planeamento devia ter poucas páginas e ser simples”.
A pouca clarividência das regras faz com que o licenciamento se torne num processo burocrático moroso. “As regras deviam ser claras para facilitar o licenciamento”. Já a fiscalização, segundo Paulo Morais, é uma “fraude absoluta” nos moldes em que se mantém, o que leva a “uma figa sistemática. A fiscalização devia ser aleatória para todos os edifícios, seja de que ano for, mas com regulamentos diferentes”. Paulo Morais terminou dizendo que a corrupção pode ser “combatida de forma sistemática. O tema tem que ser debatido e a justiça tem que ser funcional”.

Documentos são enviados para o Ministério Público

Questionado sobre o processo de corrupção autárquica em que já foi ouvido pelo Departamento Central de Investigação e Acção Penal, Paulo Morais referiu que todos os documentos que lhe têm chegado às mãos “são entregues na PJ”, depois de confirmada a “veracidade dos factos, porque nem tudo o que me entregam é verídico”.

“Corrupção faz parte da Natureza Humana”

Frederico Valarinho, director da revista Focus, foi um dos convidados do Clube dos Pensadores para este debate. Para o jornalista, “a corrupção existe porque faz parte da Natureza Humana” e deu como exemplo o processo de criação de Portugal, em que “D. Afonso Henriques corrompeu o Papa”. A solução, num país que “não se escandaliza com a corrupção”, passa pela “denúncia”.
César Costa, arquitecto, foi o convidado da plateia e falou na sua experiência de trabalho com as autarquias. O poder político é um dos principais responsáveis na corrupção, já que “a justiça não funciona e, por isso, Portugal não é um Estado de direito democrático”. Joaquim Jorge, membro fundador do Clube, também apontou o dedo ao “poder político”, que é quem “nomeia o poder judicial”. Para o biólogo a solução seria “criar um órgão independente de combate à corrupção”.

jornalista e membro do clube