Caro Pedro Passos Coelho, sei que tem muitos conselheiros, mas da minha parte pode ter a certeza que não vou cobrar nem exigir nada em troca. Não vou pedir emprego para ninguém da minha família ou amigos, nem nenhum benefício para a minha grande companhia, nem para correligionários de uma qualquer máquina partidária paquidérmica. Não vou pedir que me imponha para o Conselho de Administração da próxima joia da coroa que vai ser vendida a preço da “uva mijona”, a TAP, métier que eu percebo tanto, como Catroga, Celeste Cardona e outros percebem de Energia e Eletricidade.
Sei que a sua missão é difícil e tenho-o em boa conta quanto à intenção de nos governar e ajudar o país a sair deste buraco. Não duvido que tenha sensibilidade e que esteja angustiado com a fome que grassa em Portugal, tal como qualquer um de nós.
Está a tentar fazer reformas que possam mudar o status quo reinante e que ainda não deram o efeito que pretende. Mas as coisas estão a azedar. O episódio do “cerco” ao ministro da economia é apenas um de vários que se poderão repetir. Certamente que aquelas pessoas não queriam fazer mal ao ministro. Apenas o desespero lhes impulsionaram a manifestarem-se de modo que ficasse uma marca. A marca do desespero, da fome, da desesperança que o seu governo tem imprimido na governação, sem piedade.
Apesar disso, sei que fica preocupado, mas isso não resolve nada. As suas ações são noutro sentido. Austeridade custe o que custar, como se fosse um remédio forçado a ser tomado, um purgante que não cura a doença e já tem provas, mas continua a ouvir os seus “meninos”, muito competentes tecnicamente, ao que se diz, mas sem experiência nem idade vivida para ter sensibilidade social e política, para quem tuno não passa de uma contabilidade analítica.
Olhe para quem o rodeia e não tenha medo de reconhecer que a maioria é bem-intencionada, mas de uma confrangedora inexperiência. Já reparou que a grande maioria nunca geriu uma simples mercearia? como podem governar um país? São tecnocratas que fazem bem as contas do quanto têm de cortar em benefícios para diminuir a despesa. De inventar formas capciosas de embutir impostos diretos com o afã de arrecadar mais, mas a economia teima em afundar-se e a levar para a cova milhares de empresas e de empregos e com isso mais despesa social para apoiar, ao que se segue novos cortes sociais e mais impostos até à sufocação total.
Não faltará muito e o Estado não terá uma só função social. Está a caminho de ser um verdugo cobrador de impostos e coveiro do país, mesmo com os elogios que lhe chegam, que são os dos coveiros.
Pois, meu caro PM, se pensa que se resolve o problema da forma que tem feito, está enganado. Isso custa-lhe em sono, desespero e tranquilidade, e ao país e portugueses, a vida. A situação só tende a piorar. Eu vaticinei há cerca de um ano ao conhecer o seu plano, que em Junho deste ano, com o saque que fez aos subsídios “inalienáveis e impenhoráveis”, começaria um verão de desespero para milhares de famílias. Estamos apenas no início.
Tem razão em dizer que o Estado tem de ter as contas em dia. Mas se pensa que endireita o que foi um regabofe de 30 anos, com maior furor nos últimos 10 anos, em apenas 2 anos, está redondamente enganado e enganam-lhe. Saber qual o nosso limite de resistência é uma manifestação de inteligência, que tenho a certeza não lhe faltar. A sua missão não deve ser o algoz do povo que o elegeu, mas demonstrar que é líder e que os funcionários da troika não têm razão. Que a agenda da Sra. Merkel, favorável à sua Alemanha não nos serve. Faça por Portugal o que Merkel tem feito pela Alemanha e pelo povo alemão.
Diga aos seus “meninos” que cada medida tomada num excell não é apenas uma conta, mas que põe milhares de famílias a fazer contas à vida e as levam ao desespero e angústia.
A solução também não está apenas em Portugal, pois é global, dado a falência do modelo de enriquecimento ilícito implantado nesta economia de casino e que chegou ao fim de linha. Leia mais Nouriel Roubini e Paul Krugman e menos Fridman e não oiça os seus “meninos” tecnocratas e inexperientes, pese embora a sua boa intenção de contabilistas.
Não aceite o meu conselho. Decida por si ante a sua genuína perceção da situação no seu país, na Europa e no mundo. Inove, seja corajoso e verdadeiro líder. Não seja um capataz de interesses nublados. Mostre que um pequeno país pode ter um líder de dimensão europeia. Nos momentos difíceis é que emergem os verdadeiros líderes. Só lhe peço que se candidate, terá um país consigo.
Cordialmente,
Mário Russo