08/03/2018

Autorização de animais de companhia em Restaurantes: até onde vai a seriedade?




Mário Russo
A Assembleia da Republica Portuguesa tem primado por muita ineficiência nas leis que prepara e aprova. Uma investigação académica de doutoramento, relativamente recente, chegou à conclusão que essa ineficiência custa anualmente cerca de 4% do PIB português. É um valor colossal que não deveria deixar ninguém descansado. Mas vamos admitir que houve uma sobrevalorização nos cálculos do pesquisador e que essa cifra é 300% menor, ou seja, é de 1% do PIB. Este valor deveria merecer uma avaliação muito cuidadosa, mas nada foi feito. Nos últimos anos a situação só tem piorado porque o nível dos deputados, de um modo geral, é absolutamente deplorável. Claro que a culpa não é deles, pois emanam da sociedade. É o custo de uma sociedade que exibe um défice cultural e de educação muito elevado.
Esta introdução vem a talhe de foice, após ter lido a notícia da aprovação de um decreto-lei que autoriza a presença de animais de companhia em restaurantes.  Fiquei surpreendido, porque não é com decretos destes que se ajuda a proteger os animais de companhia, sobretudo cães e gatos que muitas vezes são vergonhosamente abandonados pelos seus donos, depois de deixarem de ser “bebés” fofinhos e passam a ser adultos e com menos “piada”. No Verão é frequente aumentar o número de animais abandonados pelas ruas. Os seus autores abandonam-nos para irem para férias “descansados”. Não há apoio material para que as autoridades possam fiscalizar este comportamento inaceitável. Infelizmente muitos animais até são maltratados pelos seus donos e permanecem impunes.
O que se tem verificado é a falta de apoio a associação que tratam de animais abandonados, por falta de espaços condignos, de comida e tratamento veterinário. Por outro lado, há falta de apoio veterinário para que as pessoas com baixos rendimentos que têm animais de companhia possam usufruir deste tipo de serviços necessários para os animais amigos, porque as clínicas veterinárias privadas são caras. Sei por experiência própria, pois temos em casa vários animais de companhia e os custos são por vezes mais elevados que os do sistema de saúde humana.
Foi, por isso, uma surpresa para mim a aprovação deste decreto fútil do PAN  e da Assembleia da Republica, que não se dá ao respeito pela banalidade e ineficiência. Assisti ao debate na RTP, Prós e Contras e, se tivesse dúvidas, elas foram dissipadas pela hipocrisia das posições dos defensores do decreto, para quem a não admissão dos nossos amigos caninos ou felinos em restaurantes é sinónimo de brutalidade e mau trato para com os animais. Os argumentos são fúteis, fundamentalistas e falsos, além de hipócritas, porque não resolve nenhum dos verdadeiros problemas que deveriam ser o centro das atenções da Assembleia da Republica, porque os animais de companhia em restaurantes podem pôr em causa a segurança alimentar,  porque os animais podem ser vetores que transportam microrganismos patogénicos, além de poderem pôr em causa a liberdade de quem pretende usufruir do prazere uma refeição sem ser incomodado pelos mais que naturais instintos dos animais, que estarão sujeitos à pressão de um ambiente que não é o deles.
Eu, e a minha família, adoramos animais, todos foram resgatados na rua. Tratamos deles com carinho há mais de 20 anos. Alguns já morreram de velhice e foi o equivalente à morte de um parente. Mas jamais iriamos submeter os nossos queridos amiguinhos a um ambiente “hostil”, porque não é esse ambiente que vai trazer-lhes qualquer felicidade e bem-estar. As nossas férias são cuidadosamente preparadas para que haja sempre gente em casa para tratar dos nossos amiguinhos irracionais.
Por outro lado, temos muito respeito à liberdade de todas as pessoas. A minha liberdade termina onde começa a liberdade dos outros e isso não conta nada para os nossos deputados que aprovaram esta lei esdrúxula e grotesca.
A aprovação deste decreto é uma infeliz ideia da Assembleia da Republica que se presta a dar guarida à irresponsabilidade de um partido “inexistente”, sem ideias, inócuo e até pernicioso. O PAN é um folclore tipo empresa unipessoal para manutenção de um único emprego do seu líder, um espertalhão inculto, pouco rigoroso no discurso, vazio de ideias social e ambientalmente úteis, que só vinga numa sociedade inculta e pouco rigorosa.
Mas pior é a horda de deputados simplórios e ignorantes que assinam de cruz uma lei infeliz, que vem comprovar a ineficiência das leis e o correspondente elevado custo no PIB do país.