Mário Russo |
O Brasil está a passar por um período crítico da sua
existência devido à inundação de casos de corrupção em catadupa. Todos os dias
as televisões e rádios, para além dos jornais, relatam casos de políticos ou
agentes da administração nas esferas municipal, estadual ou federal, envolvidos
em esquemas de elevada corrupção que fazem corar qualquer pessoa minimamente
séria.
Segundo a voz corrente, dizem que aqui no Brasil a corrupção
é endémica e está nas veias da própria população, que acha normal dar uma
propina (luvas) a funcionários para a tramitação de “papelada” em repartições
públicas. No entanto, esta perceção, hoje em dia, parece já não ser verdade,
pois não constatei em várias situações em que pessoalmente tive de tratar de
assuntos burocráticos em órgãos públicos e deparei com sistema avançado de
atendimento e apoio ao cidadão, através de informatização, muitas tarefas
realizadas via internet e, por isso tudo sem a necessidade das tais luvas, que
eram comuns, mas há algumas décadas atrás.
No entanto, o mesmo não se passa na esfera política e
económica (grandes grupos económicos), cujo comportamento foi o oposto, sobretudo
após a entrada do PT na governação com o governo Lula, iniciando-se um projeto
de poder em que o dinheiro seria arrecadado para comprar votos dos deputados, batizado
de “mensalão”. Assim começou uma verdadeira caça a recursos públicos através de
drenagem de dinheiro de grandes empresas públicas e privadas, com ênfase na
Petrobras, uma das maiores companhias do mundo, à época. Também as obras
públicas foram usadas como fontes de arrecadação, pois uma percentagem drenava
para os cofres dos políticos, de todos os partidos, porque os partidos de poder
nos diversos Estados faziam o mesmo que era feito a nível federal.
O BNDES, Banco Nacional de Desenvolvimento Económico e
Social, um banco que deveria financiar o desenvolvimento do Brasil, financiou
obras no Peru, em Cuba, Venezuela, Angola, entre outros países, todos com luvas
pagas aos políticos, sobretudo através de uma das maiores empresas de
construção do mundo, a Odebrecht, incluindo em Portugal.
Recentemente o ex-Presidente Lula foi condenado a 9,5 anos
de prisão em primeira instância. Agora até o Presidente Michel Temer, que foi vice-Presidente de Dilma
Russef, que foi destituída do poder por irregularidades, escapou de ser
investigado por um Congresso de deputados na sua maioria corruptos que votaram
a favor do parecer de um dos compinchas da tafulhada que se vive neste momento.
O que se passou nas negociações para votar a favor de Temer,
é indiscritível. Compra de votos com dinheiro público, mas tudo de forma legal,
tal os instrumentos legais existentes na política brasileira,, em que deputados
eleitos por um partido, passam para outro através de negociação tipo jogadores
de futebol. Não consigo perceber como o Presidente consegue não esconder a cara
na areia diante de tamanhas denúncias. A todo o momento há mais uma ameaça de
julgamento por corrupção, barradas com as negociações costuradas nos bastidores
da política rasteira.
A corrupção, comandada pelas grandes corporações económicas,
comprava, literalmente, os políticos e agentes da administração de forma
inacreditável. Milhões e milhões para roubar o povo, fraudar a qualidade de
carne, obter contratos fraudulentos, roubar a merenda escolar, beneficiar ilegitimamente
de juros em financiamentos públicos com prejuízos para o banco BNDES, entre
outros.
O que está a mudar e
torna-se uma luz no horizonte é a ação dos novos promotores e juízes, com
relevo para o corajoso Sérgio Moro, que são a grande esperança de mudança de
paradigma, prendendo e julgando os poderosos, coisa impensável há uma década
atrás. De facto, pela primeira vez na história deste país os ricos e poderosos
estão a ser presos num sinal a todos, que não há ninguém acima da lei.
Na outra “ponta”, o Rio de Janeiro está entregue às traças
há várias décadas, onde o tráfico é rei e comanda a vida pública na capital do
Estado e cidades vizinhas. Cada governador eleito é pior que o seguinte,
lambuzando-se à grande e francesa. As obras das olimpíadas foram um fartar
vilanagem. O governador de então, Sérgio Cabral, está preso por roubo
estratosférico de recursos do erário público.
Os bandidos já mataram só desde janeiro, mais de 95 polícias
em serviço. São de tal maneira ousados que desafiam literalmente o sistema de
segurança. Roubam cargas de camiões com mercadorias, camiões dos correios com
encomendas ou carros de valores bancários e montam escolta enquanto saqueiam as
cargas.
O que vai acontecer e para onde vai o Brasil?
É uma questão que todos fazem. A economia, no meio deste
caos, começa a dar sinais de crescimento deste portentoso país, tão riquíssimo
em recursos naturais e biodiversidade, quanto injusto, indiferente ao
descrédito dos políticos. A ação dos empresários começa a sentir-se.
A depuração que se começa a verificar, pode ser mesmo o
sinal de que o país pode mudar para o que todos os brasileiros desejam, mas não
será fácil nem na mesma velocidade da ação dos promotores e juízes. De facto,
diante do anacronismo dos novos políticos, filhos das velhas manhas dos
caciques, numa corrente monárquica, em que são filhos e netos de deputados que
seguem a cartilha passada.
Esta é a incógnita que se vive por aqui, mas ainda assim,
com sinais de mudança e esperança. Após a prisão dos poderosos, com relevo para
o ex-Presidente Lula, nada vai ficar como dantes.