Miguel Mota |
A
FAO declarou 2016 o Ano internacional das leguminosas. O objectivo é aumentar o
cultivo e o consumo das plantas deste grupo, com vantagem para a melhoria do
solo agrícola onde são cultivadas, e da saúde das pessoas e animais que as
consomem.
As
leguminosas são das plantas com maior teor de proteínas, variadíssimos
compostos químicos formados por um grande número de aminoácidos. Estes são
apenas 20 mas, tal como peças de Lego, é possível formar com eles variadíssimas
proteínas.
Os
animais não são capazes de fabricar aminoácidos, que são apenas sintetizados
pelas plantas. Como são essenciais à vida, os animais têm de comer plantas ou
animais que comeram plantas para os adquirirem.
O
valor das leguminosas para a melhoria dos solos resulta de viverem em simbiose
– uma associação com beneficio para
ambos – com bactérias capazes de captarem o azoto do ar e sintetizarem
compostos azotados, algo que o homem é capaz de fazer, mas com elevado consumo
de electricidade, para produzir os nitratos, adubos muito usados na
agricultura.
A
bactéria, de seu nome científico Rhizobium
leguminosarum, forma pequenos nódulos nas raízes, fáceis de ver quando se
arranca uma faveira, um trevo ou qualquer outra leguminosa. Vive à custa da
planta. Mas cede-lhe grande parte dos compostos azotados que fabrica a partir
do azoto do ar pelo que, ao contrário das gramíneas, como o trigo, não
necessitam de adubos azotados. E os resíduos que deixam no solo, tornam este
mais fértil que antes dessa cultura.
Como
quaisquer outros seres vivos, também as bactérias apresentam variabilidade
genética e algumas são mais eficientes que outras na captação do azoto do ar. A
investigação agronómica selecionou estirpes mais eficientes do que as que
geralmente existem no solo e hoje não se justifica a cultura de leguminosas sem
inocular as sementes com uma estirpe apropriada do Rhizobium. Nos artigos sobre “O azoto”, que publiquei no Linhas de Elvas em 2010, relatei os ensaios
realizados na década de 1950, na Estação de Melhoramento de Plantas, em Elvas,
pelo Prof. Villax, ensaios que acompanhei e fotografei. Como se pode ver nas
fotografias, é espectacular a diferença de desenvolvimento entre os talhões das
plantas inoculadas e das não inoculadas.
Quando me encontrava a trabalhar na tese então necessária,
descansava um tanto desse trabalho escrevendo um pequeno livrinho, que editei
em 1954, intitulado “Uma guerra entre as plantas”. Embora também entrem
humanos, as principais personagens são plantas de duas famílias, a das
Gramíneas e a das Leguminosas, que travam entre elas uma guerra surda. O chefe
das Gramíneas é o Senhor Trigo, que mostra um certo desdém pelas Leguminosas.
Estas, sentindo-se diminuídas, enviam uma delegação aos engenheiros agrónomos
da Estação de investigação para saber como podem melhorar a sua situação.
Quando lhes são referidas as verrugas nas raízes, confessam-se envergonhadas
por esse “defeito”. É-lhes explicado que, ao contrário, devem orgulhar-se de
tão valiosa qualidade.
Ao fim de alguns ensaios e demonstrações em que entram
membros das Gramíneas e das Leguminosas, compreendem que não há razão para se
guerrearem mas antes para colaborarem. O que era uma guerra entre as duas
famílias termina com um final feliz, num almoço de confraternização.
A pesar de tudo isto, que já é tão antigo, creio que a
agricultura portuguesa ainda semeia muitas leguminosas sem inoculação.