19/05/2015

Quem somos e para onde vamos



João Paiva 
A Europa, a União Europeia e o Euro estão a atravessar momentos críticos. Não porque a sua existência é ameaçada, mas porque se percebeu, devido a fatores diversos, que o caminho escolhido na encruzilhada que ficou lá para trás não foi, porventura, o correto. A União Europeia evoluiu talvez de forma errada para uma união monetária que, com o avançar dos tempos, absorveu e distorceu toda a sua essência inicial. O caminho daqui para a frente poderá ter que ser repensar o Euro, os termos em que é utilizado pelos países e toda a conceção de solidariedade europeia, outrora tão pregada por Adenauer, Monnet, Schuman e restantes pais deste modelo social, político e económico em que nos inserimos. Esta é a minha opinião.
O nosso Velho Continente, exportador, no passado, de ideias e valores humanitários, propulsor de movimentos de igualdade, justiça e democracia para todos os cantos do mundo, criador de uma paisagem global à sua imagem e semelhança, enfrenta uma crise grave de várias vertentes. Contudo, o que mais me assusta não é a incapacidade das economias europeias de competirem entre si e com as exteriores. A gravíssima crise de confiança armada em todas e entre todas as nações deste nobre continente parece-me bem mais alarmante que quaisquer ingerências de dívidas soberanas, reduções de PIBs ou aumentos de défices orçamentais. Há o estigma corrosivo por parte dos pequenos de que os grandes os exploram e enriquecem à sua custa e, no reverso da medalha, a ideia sobranceira, por parte dos grandes, de que os pequenos sugam a sua riqueza para descansarem errantemente acomodados sobre leitos subsidiários. Esta situação de rivalidade trouxe-nos à condição instável atual europeia. A vulgar imagem de que, quando algo corre mal, culpas são atribuídas de uns a outros, ilustra esse fenómeno certamente muito negativo que se tem vindo a verificar pela União Europeia que é o crescimento da inclinação da população votante em direção a forças políticas extremadas, muitas delas baseadas em valores altamente reprimíveis e que se situam numa posição totalmente adversa a todos os ideais basilares do projeto europeu pós-Guerra.
“We must go back to teach Europeans to love Europe” – palavras de Jean Claude Juncker. Penso que tudo se possa refletir nessa frase.
É-me difícil falar de doenças e seus sintomas de forma alegre. Mas a partir de agora escrevo sobre algo melhor: o Futuro. Melhor porque acredito em nós, europeus. Nada me enche de maior orgulho que poder dizer, em primeiro lugar, que descendo do povo cantado por Camões e, em segundo lugar, que pertenço a esta nação vasta e multicultural que, ao longo dos tempos, deu ao mundo a sua forma e espalhou o Bem. Por isto e porque a ideia de que somos “tão iguais, tão diferentes, tão europeus” deve levar a União Europeia a encontrar soluções que façam vontades e pensamentos diferentes convergir em prol do bem comum, é necessária compreensão. Fazer com que devedores e credores percebam que o projeto europeu ultrapassa a Economia. O Euro tornou-se a cara de toda a ideologia política da União e isso foi o princípio do problema. A verdadeira força que iniciou o movimento das rodas dentadas que edificaram a nossa Europa unida foi a procura de uma paz duradoura e a exaustão da guerra; foi a busca de um sentimento mútuo de solidariedade e compaixão que se espalhasse desde o nosso soalheiro Cabo de Sagres até às cidades frias da Península Escandinava. Ignorar isto ou simplesmente elevar interesses do Euro aos reais interesses da União Europeia é estar a agir contra todo o pensamento que fez a Europa recuperar dos tempos negros do meio do século XX. A UE não é o Euro! O seu sucesso ou insucesso não se mede por resultados numéricos. A missão é, sempre foi e para sempre será bem mais vasta!
A meu ver, possíveis alargamentos da União apenas ganham razão de ser se forem abordados com base nestas ideias. Fazem sentido se forem vistos como expansão ideológica da democracia e da entreajuda a sociedades que carecem delas ou não as vivem em pleno. É imperativo que se apague da mente dos líderes da União a ideia de que a aceitação de um novo país na UE simboliza pouco mais que uma aquisição estratégica de megaempresa com o fim de lucro. Isso é o que eu acho que tem que mudar. Na minha opinião, o caminho passa por repensar a moeda comum e as suas políticas, não pondo em causa a sua existência.
Bem, esta é a forma como vejo a Europa do meu tempo. A “solidariedade de facto” que Schuman defendeu no seu discurso de 9 de maio de 1950 como princípio basilar para o desenvolvimento é, apesar de tudo, defendida pela grande maioria da população europeia e isso é algo que ninguém pode negar. Contudo, em situações precárias como aquelas que alguns países da União atravessam neste momento, é necessário olhar para trás, perceber onde estamos e planear para onde vamos. Se fizermos este exercício, todos juntos e despidos de nacionalismos exacerbados, conseguiremos prosseguir. Eu acredito no que nos trouxe até aqui e no que nos faz combater pelo bem de todos.
Sou Europeu orgulhoso e só posso ansiar que o povo da União, elevando no ar o azul e amarelo da bandeira, em marcha conjunta e a passo folgado, cante a uma só voz a “An Die Freude” que Schiller para nós escreveu, na língua original ou naquela que mais lhes aprouver, porque ser europeu é isso mesmo: defender uma ideia comum, entoá-la em diferentes dialetos e cooperar com vista a um futuro melhor.

United in Diversity! In Vielfalt geeint! Unie dans la diversité! Unidos na diversidade!

*texto para concurso da União Europeia