14/03/2015

Saber fazer contas



Miguel Mota 
Embora sejam escassos os estudos económicos sobre o que rendem alguns investimentos de alto valor, já escrevi vários artigos sobre o tema, pelo menos desde 1969. Entre os mais recentes posso citar o do Público de 27/3/2014, intitulado “O que rende a investigação agronómica”. E, antes desse, uma série de 11 artigos sobre “A nova equipa na Agricultura”, publicados no “Linhas de Elvas” entre Julho e Setembro de 2011, em que mostrei os juros fabulosos que rendem às finanças nacionais, alguns serviços do Ministério da Agricultura, nomeadamente a investigação agronómica e a extensão rural.
Há anos, tentei calcular o valor da educação, que tenho razões para pensar que é muito alto. Obtive os ordenados dos funcionários públicos em função do seu nível escolar (instrução primária, 5º ano do liceu, 7º ano do liceu, bacharelato, licenciatura e doutoramento). Do Ministério da Educação só consegui obter números globais, sem os custos por aluno, de cada um daqueles graus e, por essa razão, nada publiquei.
Não estou sozinho a chamar a atenção para esses investimentos fabulosos. Por exemplo, o Presidente do Automóvel Clube de Portugal, Carlos Barbosa, no seu Editorial no n.º 744, de Setembro de 2014, da revista do clube, a propósito de o governo recusar financiamento para o Rally de Portugal escreve:
"O Rally de Portugal é o maior evento desportivo e turístico anual realizado no País. Os estudos de impacto económico realizados todos os anos apontam sempre a mesma conclusão: o valor total é cem vezes superior ao investimento público, o sector do turismo é largamente beneficiado pelos milhares de estrangeiros que se deslocam para a prova e regressam depois dela, a receita fiscal é também enorme para os cofres do estado.”
Quando se discutia o tratamento da hepatite C, vi na televisão o Bastonário da Ordem dos Médicos declarar que, mesmo sendo caro, esse tratamento era um bom investimento, pelo que poupava, em custos para a saúde, dos doentes não tratados.
No caderno “Zoom”, distribuído com o Diário de Notícias de 3/3/2015, vários depoimentos referem que os investimentos em saúde causam aumentos no PIB.
Com estes elementos, sou levado a concluir que os nossos dirigentes não sabem fazer contas e, por essa razão, têm andado, há décadas, mas com a maior intensidade desde 2005, a destruir alguns desses serviços, como tenho denunciado. Digo que não sabem fazer contas porque não tenho provas em contrário. Aos que me dizem que sabem – mas não apresentam provas dessa sabedoria – eu respondo que, se isso fosse verdade, estaríamos perante um caso gravíssimo de gestão danosa, um crime punido pelo Artigo 235º do Código Penal. Se soubessem fazer contas e, em vez de investirem nesses sectores, andassem deliberadamente a destrui-los, esses governantes estariam a destruir Portugal. A mando de quem? Até prova em contrário, continuo a pensar que não sabem fazer contas.