08/04/2014

EUFEMISMOS E EXAGEROS


Tereza Halliday
O título do meu artigo de 10/3/2014 nesta página foi “Palavras de marqueteiro político”.  Alguns do ramo reagiram com desconforto ante a suposta conotação derrogatória do termo “marqueteiro”. Um preferia ser chamado marquetólogo, outro disse que é melhor usar a expressão “especialista em marketing”. Se a terminação “eiro” para o nome de algumas profissões soa maldita a certos ouvidos supersensíveis na área do marquetingue (grafia usada por Luiz Fernando Veríssimo), então chamemos engenheiro de especialista em engenharia, ou talvez engenhólogo. O prurido terminológico quanto a “marqueteiro” talvez se origine no fato de algumas profissões terminadas em “eiro” terem menor status: bombeiro, pedreiro, marceneiro, faxineiro... Como todos os profissionais da comunicação, o marqueteiro político pode ser sério ou chicaneiro. É fácil trapacear, no escorregadio terreno da argumentação, no qual todos temos um lote, como usuários de palavras... Mas, não é a terminação em “eiro” que vai denegrir uma profissão. Felizmente recebi também e-mails bem-humorados de marquetistas (outra sinônimo possível) políticos sem melindres.
 A bem intencionada onda do politicamente correto ignora nuances de significados. “Vem cá, neguinha”, sempre foi uso carinhoso. Já ouvi a expressão “meu preto” aplicada carinhosamente a um namorado de pele alvíssima . Mas,  usar o termo “negro” para alguém de pele escura  virou crime racial. Depende do contexto e da entonação.  “Negro sem-vergonha” e “galego sem-vergonha” são agressões verbais. E devem ser evitadas, pelo respeito a todos. Mas, usar eufemismos exageradamente na ânsia de não ofender ninguém, desagua em enrolação.  Chamar empregada doméstica de “secretária” não aumenta nem encobre o status da babá ou cozinheira, que dignamente ganha a vida com estas ocupações.  Lamentavelmente, há preconceito no próprio grupo social de faxineiras e afins,  que são vítimas de comentários de vizinhas mais jovens: “Eu, hein, trabalhar na casa dos outros? Deus me livre”. Podem se esfalfar como comerciárias, mas acham indigno ganhar a vida no serviço doméstico.
Felizmente, um grupo vítima do excesso de escrúpulos verbais recusou a designação “portador de deficiência auditiva”. Querem ser chamados de “surdos” mesmo. Sem panos mornos nem ofensa. Também há um contingente de pessoas mais velhas que recusa os eufemismos “melhor idade” e “idoso” (este, sacramentado pela terminologia oficial). Primeiro, porque, os últimos anos de uma longa vida, com as mudanças de vigor, dificilmente podem ser chamadas de “melhor idade”. Segundo, porque os longevos de bem com a vida, mesmo enfrentando limitações, sabem que são velhos e não se ofendem com isto.  Mas ainda há quem prefira eufemismos para adocicar o envelhecer.  É prudente perguntar “Como você prefere ser chamado?” O território semântico é um pisar em ovos.