02/01/2013

Crescimento económico sem investimento financeiro

 

Miguel Mota
Os economistas costumam fazer uma relação directa entre o investimento financeiro e o desenvolvimento económico. Tem fundamento essa relação pois, para montar uma fábrica, para abrir uma loja ou para instalar um sistema de rega numa exploração agrícola, são necessários investimentos financeiros.

Há, no entanto, outro tipo de investimentos, que Portugal tem negligenciado, que são capazes de conseguir melhorias económicas sem exigirem mais dinheiro. Trata-se de apenas alterar métodos de funcionamento, às vezes bastante simples mas que podem produzir melhorias significativas.

Na agricultura, o sector que conheço melhor, são numerosos os casos a modificar. Ao longo de décadas tenho indicado vários, pela palavra oral e escrita. Infelizmente, o Ministério da Agricultura tem feito muito pouco nesse sentido. A alteração duma fórmula de adubação ou dum sistema de poda, mais económica forma de aplicar um pesticida, mais eficiente maneira de usar uma máquina ou dum processo de colheita, outras formas de vender os seus produtos, etc. são melhorias que podem ser conseguidas sem investimento financeiro.

A actual ministra mostrou, logo no início do seu mandato, além duma surpreendente boa informação, uma determinação de inverter o processo de destruição da agricultura que vinha sendo executado desde o 25 de Abril e que atingiu o máximo de intensidade com o governo Sócrates, que chegou ao cúmulo de devolver a Bruxelas centenas de milhões de euros destinados a essa tão carenciada e tão necessária actividade. Merece – a nova ministra, não Sócrates – os melhores elogios por esse facto.

Passado mais de ano e meio, embora a acção tenha bastantes aspectos positivos, penso que ficou aquém do que podia ter sido feito, principalmente nos dois sectores que são essenciais para fazer progredir uma agricultura globalmente atrasada e pouco competitiva. E o país bem necessita dos resultados económicos que determinadas acções lhe dariam.

Sem uma investigação agronómica de boa amplitude e muito eficiente, cujo objectivo último é descobrir formas de agricultar melhor, no sentido mais lato, não há progresso. Como se sabe, a investigação que não seja das universidades tem andado a ser destruída – a agronómica e de outros sectores – uma criminosa acção que já custou à economia do país quantias astronómicas.

O segundo serviço necessário, hoje no mundo chamado de extensão agrícola ou extensão rural, tem por objectivo levar até aos agricultores os conhecimentos de que eles carecem, incluindo os que vão sendo produzidos pela investigação agronómica.

Há anos que me bato para que o Ministério da Agricultura inicie um Plano Intensivo de Investigação Agronómica e de Extensão Rural. Vi uma pequena melhoria no sector da investigação agronómica, embora com alguns aspectos que penso poderiam ser melhores, e na extensão, além de casos pontuais – como sempre houve – penso que não está em marcha o Plano Intensivo, pelo menos como eu o imagino. Naturalmente, dado o miserável estado das nossas finanças e haver prioridades nos gastos de que discordo, não penso em acções que exigissem investimentos que o Ministério das Finanças não quer atribuir.

Nos outros sectores pouco poderei dizer. Mas a avaliar por alguns casos pontuais de que há conhecimento público, imagino que se possa fazer imenso. Fala-se muito em reforma do estado, algo vago mas, do que já se viu, depreende-se que o que se pretende é dar negócios a privados, com o povo a pagar. Vale a pena lembrar que “reforma” era uma palavra usada antigamente. Depois, com o mesmo significado, passou-se a chamar “restruturação”, para voltar agora a ser reforma. Em vários escritos já chamei a atenção para o facto de mais importante que qualquer alteração de estrutura, importa corrigir os milhentos erros de funcionamento. Comentei o caso relatado por um jornalista que, para levantar uma simples encomenda vinda do estrangeiro teve de ir, munido da respectiva documentação, três vezes ao aeroporto, numa delas gastando lá um dia inteiro e passando por doze funcionários, todos, aliás, cumprindo bem o que lhes tinham mandado fazer. É óbvio que a “reforma” a fazer é ter a comandar esse serviço alguém competente para encurtar drasticamente aquele complicadíssimo circuito.

Um outro exemplo é ainda mais taxativo. Peter Villax, à frente da empresa de sucesso fundada por seu pai, publicou no Expresso, num dos primeiros meses de 2012, um artigo em que relata que desistiu de instalar em Portugal mais uma fábrica e foi comprar uma na Irlanda porque aqui as complicações burocráticas e as demoras são de tal grandeza que tornam difícil o progresso.

Parece-me, portanto, que antes de pensar em reformas, suprimir feriados, juntar freguesias, aumentar impostos, etc. o que o governo deve fazer é corrigir os imensos erros – de correcção fácil e sem investimento financeiro – de que enferma a máquina do estado, pela qual é o único responsável.