31/08/2012

O maior veículo de cultura dos portugueses


Preocupa-me que a capacidade de propagação viral da televisão venha a legitimar formas de expressão que me soam incorretas (digo soam e não que o são porque, porventura, neste momento até já podem estar a ser integradas no léxico português, sem que eu o saiba, com o argumento de que a língua é viva e como tal sujeita a modificações). Não questiono o acordo ortográfico, que até já adotei, mas custa-me ouvir conjugações de verbos que aprendi como incorretas e que são usadas constantemente por pessoas de responsabilidade na televisão, e que, mais tarde ou mais cedo, poderão ser legitimadas com o argumento do seu uso generalizado. Refiro-me aos verbos com duplo Particípio Passado.
Eu aprendi na escola que nos verbos com duplo particípio passado, quando conjugados com os auxiliares ter e haver se usava o particípio passado regular (a terminar em -ado ou –ido). Por outro lado, na voz passiva, com auxiliar ser e estar, se usava a forma irregular apocopada do particípio.
Verifico, há uns tempos a esta parte, que se está a pôr de lado, de forma sistemática, a forma regular do particípio passado e a empregar-se a forma irregular também com os auxiliares ter e haver. Os erros mais frequentes que ouço na televisão e ao vivo: Ter morto (matado); ter impresso (ter imprimido); ter vago (vagado); ter sujeito (ter sujeitado); ter salvo (ter salvado); ter expulso (ter expulsado); ter extinto (ter extinguido); ter aceite, (ter aceitado). Uma curiosidade: sabe-se lá porquê, mas o corretor automático do Wordpartilha” da minha opinião de que estes exemplos que mencionei estão de facto errados, com a exceção do ter morto que aceita como correto.
Quando submeti a minha tese, já passaram uns anitos, fui ver os modelos de teses anteriores e em todas elas no agradecimento praxe estava escrito: “À Universidade X por me ter aceite como aluna de doutoramento”. Na altura para fugir ao uso desta forma, do meu ponto de vista incorreta, mas para não ser considerada, no mínimo, excêntrica por ser a única a escrever “ter aceitado”, usei a conjugação dupla ter sido aceite.
Claro que há verbos que só têm uma forma de particípio passado e outros em que só a forma irregular é usada, neste caso são as chamadas exceções, não sei o porquê delas, mas não discuto porque assim as aprendi (ex: verbo escrever, ter escrito e não ter escrevido), mas qualquer dia as exceções passam a ser a regra e as regras serão exceções vá-se lá saber porquê!
Eu própria já começo a questionar o uso das formas regulares que me soam mal por estarem tão em desuso, mas como tenho vontade de aprender e a pretensão de falar bem, até porque sou professora, gostava muito de ser elucidada por alguém que saiba mais do que eu destas matérias. Tenho consultado alguns dicionários e sites e não há coerência na explicação do porquê destas coisas.
Custa-me aceitar que a ocorrência sistemática de um erro e sua vulgarização através da imprensa televisiva e escrita acabe por o legitimar. 

Manuel Vaz Velho

*escrito novo AO