03/08/2012

As médias


           É bem conhecido o facto de as estatísticas poderem ser usadas para dar uma ideia erradas duma situação real e são muitos os casos que o demonstram. Há tempos um jornal publicou uma lista, elaborada pela OCDE, do que pagam de impostos, em média e em percentagem do PIB, os cidadãos de vários países. Portugal aparece com um valor abaixo da média e os Estados Unidos ainda mais a baixo. Os valores mais altos eram os da Dinamarca e da Suécia, o dobro da percentagem paga pelos americanos. Olhando para essa estatística poderia pensar-se que os coitados dos dinamarqueses e suecos são "explorados" pelo estado, que lhes cobra tantos impostos.

Enviei uma carta ao jornal a chamar a atenção para o facto de, na Suécia, o ensino - todo, incluindo o universitário - ser gratuito e a saúde apenas tem simbólicas taxas moderadoras, enquanto nos Estados Unidos, tanto o ensino superior como a saúde, são caríssimos. Em Portugal é o que se sabe, com governos que se dizem socialista e social democrata e as suas acções desmentem estrondosamente os seus rótulos. O jornal enviou-me uma amável mensagem a dizer que eu tinha toda a razão e dando umas esfarrapadas desculpas para não terem comentado o gráfico, mas não publicou a minha carta. Por esse facto publiquei no LE (29-12-2011)  o artigo "Um gráfico enganador".

Também é conhecida a anedota que relata o caso de dois homens que vão a um restaurante. Um deles come um frango, enquanto o outro apenas vê. A estatística diz que cada um deles comeu meio frango.
Vem isto a propósito de declarações recentes que "provavam" que os funcionários públicos são uns beneficiados porque ganham, "em média", mais do que quem trabalha para os privados. E assim, mais uma vez, com a estatística e as "médias" se provava o facto dos funcionários públicos serem uns privilegiados. Há que corrigir essa "estatística" e, como nos casos citados, ver um pouco para além das "médias".

A verdade é que, nos escalões inferiores dos ordenados, muitos dos que trabalham para os privados ganham menos do que os seus equivalentes no estado. Mas nos escalões superiores ganham muito mais. Têm sido denunciados muitos casos dos fabulosos ordenados e pensões de vários privados - entre os quais os bancos que os cidadãos agora alimentam com os seus magros salários - e em muitas empresas, incluindo as chamadas "empresas públicas", que não estão sujeitas às normas rígidas e restritivas dos funcionários públicos, funcionam como privadas e são alimentadas com os tais magros salários da grande maioria dos cidadãos. Na CGD, na PT e muitas outras é o que se sabe. Na RTP, que custa aos cidadãos vários centos de milhões de euros por ano, pagam-se ordenados muito superiores ao do Presidente da República.

Eu sugiro que apresentem a média, tanto para o estado como para os privados, dos conjuntos de ordenados que estão para baixo da média do total e a média do conjunto dos que estão para cima da média do total. Certamente que esses números mostrariam como os empresários portugueses pagam mal aos trabalhadores de escalões baixos, mas remuneram muito mais que no estado os escalões superiores.

Miguel Mota