É bem conhecido o facto de as
estatísticas poderem ser usadas para dar uma ideia erradas duma situação real e
são muitos os casos que o demonstram. Há tempos um jornal publicou uma lista,
elaborada pela OCDE, do que pagam de impostos, em média e em percentagem do
PIB, os cidadãos de vários países. Portugal aparece com um valor abaixo da
média e os Estados Unidos ainda mais a baixo. Os valores mais altos eram os da
Dinamarca e da Suécia, o dobro da percentagem paga pelos americanos. Olhando
para essa estatística poderia pensar-se que os coitados dos dinamarqueses e suecos
são "explorados" pelo estado, que lhes cobra tantos impostos.
Enviei uma carta ao jornal a
chamar a atenção para o facto de, na Suécia, o ensino - todo, incluindo o
universitário - ser gratuito e a saúde apenas tem simbólicas taxas moderadoras,
enquanto nos Estados Unidos, tanto o ensino superior como a saúde, são
caríssimos. Em Portugal é o que se sabe, com governos que se dizem socialista e
social democrata e as suas acções desmentem estrondosamente os seus rótulos. O
jornal enviou-me uma amável mensagem a dizer que eu tinha toda a razão e dando
umas esfarrapadas desculpas para não terem comentado o gráfico, mas não
publicou a minha carta. Por esse facto publiquei no LE (29-12-2011) o artigo "Um gráfico enganador".
Também é conhecida a anedota que
relata o caso de dois homens que vão a um restaurante. Um deles come um frango,
enquanto o outro apenas vê. A estatística diz que cada um deles comeu meio
frango.
Vem isto a
propósito de declarações recentes que "provavam" que os funcionários
públicos são uns beneficiados porque ganham, "em média", mais do que
quem trabalha para os privados. E assim, mais uma vez, com a estatística e as
"médias" se provava o facto dos funcionários públicos serem uns
privilegiados. Há que corrigir essa "estatística" e, como nos casos
citados, ver um pouco para além das "médias".
A verdade é que, nos escalões inferiores
dos ordenados, muitos dos que trabalham para os privados ganham menos do que os
seus equivalentes no estado. Mas nos escalões superiores ganham muito mais. Têm
sido denunciados muitos casos dos fabulosos ordenados e pensões de vários
privados - entre os quais os bancos que os cidadãos agora alimentam com os seus
magros salários - e em muitas empresas, incluindo as chamadas "empresas públicas",
que não estão sujeitas às normas rígidas e restritivas dos funcionários
públicos, funcionam como privadas e são alimentadas com os tais magros salários
da grande maioria dos cidadãos. Na CGD, na PT e muitas outras é o que se sabe.
Na RTP, que custa aos cidadãos vários centos de milhões de euros por ano,
pagam-se ordenados muito superiores ao do Presidente da República.
Eu sugiro que apresentem a média,
tanto para o estado como para os privados, dos conjuntos de ordenados que estão
para baixo da média do total e a média do conjunto dos que estão para cima da
média do total. Certamente que esses números mostrariam como os empresários
portugueses pagam mal aos trabalhadores de escalões baixos, mas remuneram muito
mais que no estado os escalões superiores.
Miguel Mota