01/11/2011

Investir para Competir ( continuação)

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para perceber o que está em jogo se for descurado um dos termos
da equação.
Gostaria de salientar a decisão do governo de sobretaxar as
maiores empresas em sede de IRC.
Nos últimos largos anos bati-me pela redução do IRC. E julguei
que estivessem reunidas as condições para que, finalmente, o país
caminhasse para uma solução que beneficiasse as empresas e a
economia. Porque deixar a poupança nas empresas é fundamental
para haver investimento, para formar os colaboradores (todos eles,
incluindo a actualização dos quadros dirigentes) e para se poder
criar emprego novo.
Pois bem, foi uma expectativa defraudada por uma decisão que
acentua o preconceito em relação às empresas de sucesso e que
apresentam lucros – é um contributo para a deriva populista,
alimentada por algumas franjas minoritárias da sociedade, segundo
a qual as empresas que mais riqueza produzem, que mais impostos
pagam e que mais emprego criam são, afinal, merecedoras de
censura e punição.
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Esta ideia é um dos principais factores da baixa produtividade
nacional, porque se passa para os cidadãos a mensagem de que não
vale a pena ser empreendedor, competitivo, gerar riqueza ou inovar.
Porque esses são os que o Estado penaliza em primeiro lugar!
Isto tem consequências e é bom que os portugueses as
compreendam: menos investimento, menos emprego, menos
competitividade, menos receitas para o Estado e menos
crescimento para o país. Além do mais, o aumento do IRC parece
ser um convite à relocalização das empresas noutros países, mais
amigos dos investimentos e dos reinvestimentos…
É um cenário difícil para todos, mas este aumento de impostos, a
que se junta a dificuldade crescente de conseguir crédito bancário,
levará a uma retracção sem precedentes no investimento das
empresas. Aliás, o investimento português em 2011 será pela
primeira vez insuficiente para repor as amortizações do stock de
capital.
Portugal tem já uma taxa de IRC das maiores da Europa e a
generalidade dos países com quem competimos por investimento e
financiamento comunitário têm impostos mais baixos – Eslovénia
e Croácia têm um IRC de 20%; Hungria, República Checa,
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Eslováquia e Polónia 19% e Roménia 16%. Parece tratar-se, pois,
do tal convite ao investimento nesses países.
Pensava que tinha razões para acreditar no alívio da carga fiscal
das empresas. E não as tinha por conversas privadas ou garantias
subterrâneas. Os discursos de tomada de posse do Presidente da
República e do Primeiro-Ministro criaram-me essa convicção. Os
dois alertaram para o papel das empresas que investem e correm
riscos porque elas são o motor da economia. Sem elas não há
crescimento de produção, aumento de produtividade, investimento,
emprego e receitas para o Estado.
Subscrevi o que disseram, até porque já o vinha defendendo há
muito. Acreditei que chegara o momento para um verdadeiro
choque competitivo. Parece que tenho razões para estar desiludido.
Mas maior deve ser a desilusão do país, que assim vê mais uma
vez dificultada a recuperação económica e atrasada a oportunidade
de crescimento.
Pedem-me que procure argumentos para falar de esperança e
competitividade. Ao contrário do que alguns possam pensar, sou
um optimista. Mas sou um optimista que acredita na acção como
motor da história, que acredita no estabelecimento de metas
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concretas que nos façam acreditar que a austeridade e o esforço de
todos (que considero fundamental) servirá para fazer a diferença e
não para que tudo fique exactamente na mesma.
A evidência cabal de que a Sonae acredita no futuro e por isso
aceita correr riscos está bem patente nos investimentos muito
próximos de mil milhões de euros que fazíamos até 2009.
Aliás, como se poderia ter desenvolvido o mundo empresarial pelo
qual sou responsável, sem ser optimista e assumir os riscos dos
elevados investimentos que foram feitos?
Não podemos, realmente, subestimar a importância do
investimento na recuperação e crescimento da economia. Segundo
disse recentemente o ex-Presidente Clinton, bastaria que uma boa
parte do dinheiro disponível nos bancos americanos, e também nas
empresas privadas, fosse libertada e investida na economia para
que o mundo saísse da crise.
Eu sou de facto um optimista, que acredita em esperanças reais
mas não em palavras que o vento leva e afasta para longe.
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O problema em Portugal não é um plano de austeridade; o
problema é não saber para onde vamos a seguir. Acredito que
ainda vamos a tempo e que este governo possa ficar para a história,
se estancar a hemorragia e criar condições para haver investimento
e crescimento económico. As próximas gerações dependerão disso.
Sei que o mundo é hoje tão estreitamente global que muitas
equações não dependem da bondade das decisões políticas ou
empresariais. Pois bem: essa é uma questão que nos surgirá, ou não,
depois de resolvermos os nossos problemas: equilíbrio do défice,
crescimento da economia, empresas competitivas, educação
adequada às necessidades do país, sociedade civil influente,
reforma da administração pública e da justiça.
Sem esta parte do trabalho não chegaremos a ter tempo de nos
preocuparmos com o que não controlamos. Porque a esta crise
seguir-se-ão outras e um dia, mais cedo do que tarde, teremos de
regressar a um passado que julgávamos distante e estaremos
condenados por décadas e gerações.
Os nossos filhos e netos saberão o que hoje apenas podemos
imaginar com recurso a perguntas mais ou menos retóricas:
O que pode acontecer na China, Índia ou no Brasil?
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No Médio Oriente, estes regimes darão lugar a outros?
O que podemos esperar da Europa e do Euro?
Que explosões sociais poderão surgir?
Poderão os mais velhos continuar a ter direito a uma reforma?
São vários os perigos e as oportunidades, mas é bom que saibamos
que existe a possibilidade de o futuro poder não ser tão admirável
quanto isso. Por isso, agora mais do que nunca, façamos o que nos
compete.
Façamos o que nos compete sem olhar para trás e sem temer o
futuro antes de tempo.
Em primeiro lugar, como tenho dito e repetido: o Estado tem a
obrigação de desenvolver o sector primário. Ou melhor: de criar as
condições adequadas a esse desenvolvimento através de incentivos
de natureza legal e fiscal. Porque dentro de vinte anos, o mar, a
agricultura e a floresta poderão ser um dos nossos trunfos decisivos
em termos de competitividade.
Recordo-vos alguns números: hoje, 46% dos agricultores têm mais
de 65 anos – a média europeia é de 23% (INE). Só 0,81% têm
formação agrícola - a média europeia é de 8,72%. Ainda segundo
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dados do INE (Recenseamento Agrícola de 2009), existem 304 mil
explorações agrícolas que ocupam 4,6 milhões de hectares. Em dez
anos desapareceram 112 mil explorações e a superfície utilizada
recuou mais de 450 mil hectares – o que corresponde ao
desaparecimento de uma em cada quatro explorações.
Temos bons solos, um clima extraordinário e reservas de água para
sermos tão competitivos como os melhores na produção de azeite,
fruta, legumes e leite. É incrível e escandaloso como não somos
auto-suficientes em produtos como batatas, limões, alhos, cebolas,
pepinos e tomates. Com a qualidade dos nossos solos deveríamos
exportar esses produtos e não ter a necessidade de os importar. Só
66 mil dos 110 mil hectares de regadio do Alqueva estão em
funcionamento ou em vias de o estar (EDIA, Fevereiro 2011, e
Ministério da Agricultura). A bacia do Tejo tem 251 mil hectares
de regadio e mais de 1 milhão de hectares não aproveitados
(1.295.428 hectares de área total regável - projecto AquaPath,
Federação Nacional de Regantes de Portugal, 2008).
Tal como na agricultura, a floresta sofre de uma estrutura de
propriedade fragmentada, onde muitas vezes o seu abandono é
mais proveitoso do que a sua exploração. Esse facto é sublinhado
quando se fala sobre incêndios e prevenção, mas pouco tem sido
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feito para contrariar esta tendência e mudar a situação. Isto, apesar
de o governo anterior, dado o crescimento em 2010 das
exportações de pasta de papel e celulose, ter assumido que era
prioritário o desenvolvimento dos principais sectores da indústria
florestal portuguesa: cortiça, madeira, aglomerados e mobiliário.
Impõe-se, neste domínio, pelo menos, legislar eficazmente e
urgentemente no sentido do emparcelamento eficiente e da
construção e gestão de um cadastro de propriedades.
Convém ter presente que a área florestal ocupa cerca de 38% do
território e emprega mais de 200 mil pessoas (5% da população
activa) e é responsável por 4% do PIB e 14% do PIB industrial -
números estes que poderiam ser mais elevados se a floresta fosse
bem gerida em Portugal e se fosse mais bem aproveitado o seu
potencial de empregador de trabalhadores que não necessitam de
uma elevada formação média.
Nas pescas, as estatísticas são ainda mais alarmantes. Entre 1999 e
2008 reduzimos em 20% a nossa frota pesqueira (de 10.808
embarcações para 8.585); a frota nacional tem apenas 5,8% da
capacidade de carga da frota pesqueira do conjunto da União
Europeia, o que contrasta com o facto de a maior Zona Económica
Exclusiva da União ser detida por Portugal e com o detalhe de
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sermos o terceiro maior consumidor de peixe per capita do mundo,
logo a seguir ao Japão e à Islândia. As nossas quotas de captura são
penalizadoras – não é respeitado minimamente o nosso potencial
de captura. Importamos 350 mil toneladas de peixe e exportamos
apenas 100 mil. Deixámos de pescar bacalhau no Atlântico Norte
e hoje o que comemos vem todo de fora.
Por tudo isto, é claro que o país precisa de recuperar o seu sector
primário, precisa de aumentar a sua competitividade nas áreas em
que possui óbvias vantagens. Além do mais, é um investimento
que semeará desenvolvimento e criará postos de trabalho em
grande quantidade e com tendência de perenidade.
Eis aqui, pois, um ponto em que deveria focar-se uma
confederação empresarial abrangente, dado que se trata de um
tema que interessa à economia como um todo e que pode e deve
ser complementado pela discussão das alavancas tecnológicas
contidas no potencial da Internet e das TIC.
De resto, um sector primário eficiente, sofisticado e competitivo é
condição indispensável ao lançamento de indústrias (de 1ª e 2ª
transformação) com potencial de exportação.
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Todos conhecemos os números. Sabemos o que se tem dito sobre
eles. Na última década, quando o mundo parecia correr sobre as
rodas do progresso, Portugal não cresceu. Continuámos a consumir
a um ritmo muito superior à nossa capacidade produtiva e
mantivemos os salários a crescer mais do que a produtividade.
Endividámo-nos, reprimimos a poupança e investimos em obras
megalómanas com objectivos difíceis de descortinar.
Mesmo em 2010, o tão elogiado e importante aumento das nossas
exportações (que cresceram 14,8% em relação ao ano anterior no
comércio de bens) não foi suficiente para travar o aumento do
fosso da nossa balança comercial (no último ano importámos
51,613 mil milhões de euros, num crescimento de 9,6%) e
pergunto-me se não terá sido conseguido à custa do
desbaratamento de fundos públicos.
E, na verdade, sem termos delineado uma estratégia de equilíbrio
das nossas contas externas, nenhum modelo de desenvolvimento
sustentável poderá vingar na economia portuguesa.
Não haja ilusões: o futuro depende de todos.
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Depende do talento e da coragem dos governantes, da capacidade
de ousar dos empresários, do empenhamento dos trabalhadores e
sobretudo da sua valorização profissional e disponibilidade
sectorial e geográfica para fazer um zig-zag global.
Precisamos de uma verdadeira mudança de paradigma que permita
a coexistência entre o equilíbrio das contas e o crescimento.
Volto a dizê-lo: uma coisa não pode existir sem a outra. O preço a
pagar pelo equilíbrio das contas não pode ser a miséria absoluta e o
nascimento de um exército de excluídos. E sê-lo-á se não houver
crescimento económico.
Também não podemos pactuar com uma cultura de prudência em
relação ao risco, que valoriza os mais os prudentes e defensivos e
não aqueles que pretendem ir mais além.
O fracasso não é bem encarado nem compreendido. E quem não
encara bem as tentativas falhadas nunca estará ao lado de quem
inova. Porque na inovação o fracasso é um lugar-comum.
Há que ousar e arriscar na diferença, reter os nossos talentos,
mudar o paradigma da educação, investir numa cultura de
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exigência que comece na primária e termine em universidades
mais viradas para o exterior e em contacto directo com as empresas
e com o foco nas prioridades do país. É fundamental cruzar o
interesse dos empresários com a sede de descoberta dos cientistas e
dos inovadores.
Se não nos diferenciarmos dos outros, se não oferecermos ao
mercado produtos ou serviços em que os outros não pensaram,
então teremos menos hipóteses de crescer. Um pequeno país
precisa, muito mais do que um grande, de inventar novos produtos
que depois possam ser descobertos por um mercado global ávido
de novidades.
Esta é a história do comércio: foram sempre os mais inovadores, os
que procuraram ocupar ou encontrar os espaços em branco – no
que alguns designam por Estratégia de Blue Oceans -, que
triunfaram.
Outra das nossas necessidades vitais é formar elites preparadas
para os desafios.
As nossas crianças e jovens devem ser formadas numa ideia de
empreendedorismo e inovação, devem ter conhecimento de novas
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tecnologias, devem falar e compreender línguas estrangeiras.
Trata-se de um novo modelo educativo que não tenha medo de
formar para a excelência, que não convoque fantasmas nem
preconceitos históricos para justificar a não existência de quadros
de honra, que não impeça os melhores de serem ainda melhores.
Só 17% dos portugueses têm o ensino secundário completo
(CEDEFOP através do Eurostat) - na União Europeia a média é de
45%.
Alguns dos nossos doutorados eternizam-se em cursos de pós
doutoramento e estágios, quando poderiam contribuir mais
activamente para o país.
É preciso definir as prioridades para os próximos vinte anos, têm
de se adequar os currículos a essas prioridades, temos de fazer um
pacto de regime para a educação que salvaguarde futuras
mudanças no poder e há que perceber que a educação não dispensa
a ideia de proximidade: tem de fazer-se apelo a uma espécie de
“regionalização” ou “localização” da educação que permita
envolver as famílias e responsabilizar os professores.
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O diagnóstico da nossa falta de competitividade também está feito
e não é tempo de desperdiçar mais recursos com diagnósticos.
Sabemos o quanto é nefasto um empreendedor não ter ambição de
inovar, apetência pelo risco e sede de excelência e o curioso é que
não nos distinguimos particularmente em nenhum dos três vectores.
As empresas apostam pouco na competição interna, o risco não é
estimulado nem premiado, os recursos humanos qualificados e
especializados são mais vistos como ameaças ao status quo do que
como uma oportunidade de evolução para a estrutura.
Esta é então uma boa oportunidade para as empresas. Devem
estimular, premiar e dar espaço aos colaboradores para pensarem e
apresentarem soluções. Isso, por experiência própria o digo,
transforma as empresas, torna-as mais competitivas e
potencialmente vencedoras. Há que confiar nas pessoas e estimular
a sua capacidade de iniciativa, há que ouvir as suas ideias e
oferecer a justa compensação pelas mesmas.
As empresas portuguesas têm pontos fracos, reconheçamo-lo. As
maiores são grandes em Portugal, mas, na maior parte dos casos,
são pequenas quando em competição no mercado global e é isto
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que é crucial entender para se criarem as condições para melhorar
a competitividade das empresas.
Sem melhorarmos os nossos serviços e sem um aumento de
investimento em I & D não conseguiremos crescer, criar emprego
e competir com as empresas internacionais.
Sei que tudo isto é também consequência de um mercado de
trabalho rígido, da falta de estabilidade macroeconómica, da
insuportável burocracia e da pouca visão e coragem dos políticos.
Mas deixemos o passado e saibamos corrigir o futuro.
Este é também um tempo de grande dificuldade e fragilidade para
a banca portuguesa. Os bancos portugueses, forçados a uma
necessária recapitalização para fazer face à lógica negativa da
economia, parecem à mercê da volatilidade dos mercados, da
especulação bolsista e da crise da dívida pública.
Chegámos mesmo a um ponto em que os bancos cortaram crédito
às boas empresas para o canalizarem para várias outras, menos
eficientes, para evitar falências ou por motivos proteccionistas e
segundo critérios totalmente opacos.
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Mas não se pode escamotear as responsabilidade próprias dos
bancos. Embora este não seja o tempo para apontar o dedo, é
crucial andar para a frente e cortar a direito no caminho certo,
sempre sem perder a referência fundamental de que a actividade
bancária tem um carácter fiduciário ímpar e que dessa confiança
por parte dos seus clientes depende a prosperidade do negócio e,
afinal, da economia.
Os bancos têm de voltar a apostar no modelo de negócio que
provou ser saudável e sustentável e que pressupõe análises de risco
muito ponderadas nos seus investimentos, com menor propensão
especuladora, e mais disponibilidade para emprestar aos Estados,
com risco (desejavelmente) zero.
É também importante corrigir o mismatch de prazos entre os
empréstimos que a banca faz a longo prazo e o endividamento que
contrai a curto e médio prazo e que não é, obviamente, sustentável.
Tudo isto é vital para que o dinheiro dos depositantes volte a entrar
no circuito virtuoso da economia e volte a servir o propósito que
nunca deveria ter abandonado: financiar as empresas de todos os
sectores da economia. A importância do contributo da CEP pode
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aqui ser determinante, nomeadamente na promoção da
transparência do sistema bancário, que afinal gere fundos das
famílias e das empresas.
Por outro lado, a sociedade de informação, que tantos julgaram ser
o caminho para a sociedade do conhecimento, trouxe-nos uma
situação nova.
A quantidade imensa de informação disponível obriga a
redobrados esforços de reflexão, mas o ritmo a que somos
obrigados empurra a maioria para uma acção sem a reflexão
suficiente. Uma acção que, muitas vezes, é o resultado da pressão
mediática e de uma deficiente análise da informação disponível.
Também aqui, pois, são necessárias mudanças. Porque a
competitividade também se joga na capacidade que tivermos todos
de olhar para o médio e longo prazo - não apenas para as
minudências e para as preocupações imediatas e de curto prazo.
E isto aplica-se aos políticos, aos empresários e aos indivíduos,
como é evidente.
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São necessárias reformas que atenuem o risco das más decisões
dos políticos – a necessidade de ganhar eleições não lhes pode
limitar a capacidade de agirem da melhor forma.
É que uma parte da sua actividade dedica-se ao que o país precisa,
mas outra parte ao que necessitam para sobreviver no lugar em que
estão, pelo que considero fundamental haver mecanismos que
permitam responsabilizar os decisores políticos, que não devem
sentir-se livres para se concentrarem no curto prazo e na sua
própria eternização ou em projectos megalómanos, mal geridos,
que alimentam a vaidade de alguns ministros e os cofres dos
empresários amigos.
Hoje, mais que nunca, os líderes políticos e empresariais têm de
oferecer o seu exemplo.
Neste tempo, em que é preciso decidir a pensar no longo prazo, o
seu exemplo deve ser inquestionável ao olhar dos outros, quer seja
do país ou da equipa. A sua ética deve ser clara, transparente,
estrita e respeitada.
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E de entre os vários deveres importantes de um bom líder quero
destacar a coerência. Porque numa época onde tudo é posto em
causa todos os dias é decisivo contar com pessoas que saibam para
onde caminham.
Pessoas com um carácter, honestidade e competência.
Pessoas que façam sentir aos outros que os seus objectivos são os
do país ou da empresa, nunca a subordinação à sua própria vaidade.
Pessoas que estejam predispostas para a mudança, pessoas
corajosas e capazes de arriscar.
Criemos condições para recomeçar. Reconhecendo as prioridades,
estabelecendo metas de longo prazo, formando os nossos jovens
para que cumpram objectivos considerados estratégicos, investindo
no sector primário e nas empresas.
Uma última nota, para terminar como comecei, dirigindo-me ao
Senhor Presidente da CEP.
Agradeço o convite que me foi dirigido e estou aqui presente com
muito gosto, mas não escondo que poderia estar mais à vontade se
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CEP fosse a sigla simples e focada da Confederação Empresarial
de Portugal.
É que, apesar de se apresentar como uma Confederação
Empresarial, a CEP parece fazer gala de se manter presa ao
passado, à sua génese de confederação industrial.
Isto parece-me uma desnecessária imprecisão e, desta forma, a
meu ver, está-se a subaproveitar a capacidade representativa e
agregadora de uma confederação que deve, justamente, bater-se
pela competitividade das empresas portuguesas,
independentemente do sector em que se integram, objectivo esse
que, aliás, foi o único a nortear a decisão da Sonae de integrar esta
confederação.
Não vejo - para ser sincero - como é que será possível a uma
entidade que se identifica ainda publicamente como CIP prosseguir
adequadamente os objectivos que se propôs nos seus próprios
estatutos:
Fará sentido uma tal entidade "representar, interna e
externamente, a actividade económica nacional"?
Congresso das Empresas e da Actividade Económica
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Será realista cometer-lhe a tarefa de "apoiar as empresas de todas
as dimensões e sectores, com autonomia e independência", onde
parecem coexistir objectivos contraditórios (por ex., investimento
em bens transaccionáveis vs. não transaccionáveis, ou produção vs.
distribuição)?
Poderá ela ser "porta -voz das empresas, assumir e defender os
seus interesses e propostas junto das instâncias económicas,
políticas e sociais"?
Será credível que se assuma como "um parceiro essencial do
diálogo social" e que possa "negociar, em nome das empresas,
com os parceiros sociais e o poder político"?
Não minha opinião, a resposta é: Não.
Essas são tarefas - muito importantes - para uma Confederação
Empresarial que não esteja associada a qualquer sector específico e
que não deve, portanto, ter pruridos em desligar-se de vez das suas
origens antigas para enfrentar o futuro com o distanciamento
necessário à abordagem de problemas transversais.
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Deixo-vos, pois, um desafio final: mais representatividade de todos
e menos de alguns;
mais CEP e menos CIP;
ou, para ser totalmente sincero: apenas CEP!
Isto não é, a meu ver, um pormenor. Trata-se de uma questão de
enfoque e, com isso, de capacidade de representação e de peso
efectivo de uma Confederação Empresarial, sendo que não ignoro
o importante papel que uma CIP e outras associações sectoriais ou
locais podem desempenhar na defesa de sectores ou profissões
específicos.
Admito, aliás, que seja uma ideia próxima dessa que leva a que em
Espanha exista uma grande e importante confederação empresarial
- a Confederación Española de Organizaciones Empresariales
(CEOE) -, que reúne cerca de um milhão de empresas, e que tenha
sido recentemente criada em Itália, em 2010, a R.E.TE.
(Rappresentanza E TErritorio - Imprese Italia), uma associação
que pretende ser uma plataforma de representação empresarial
unitária e que nasceu do entendimento entre várias organizações
sectoriais “sobrepostas” (a Casartigiani, a CAN, a
Confartigianato, a Confcommercio e a Confesercenti). A par da
R.E.TE. existe também a Confindustria, uma associação
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empresarial italiana histórica, que reúne empresas industriais e que
não se confunde com aquela.
Já em França, a representação patronal assenta em duas grandes
organizações - a Association Française des Entreprises Privées
(AFEP), que reúne várias das empresas cotadas que fazem parte
do CAC 40, e o Mouvement des Entreprises de France
(MEDEF), que representa 750.000 empresas.
O meu objectivo com estes pontos – e que faz parte do meu desafio
– é sobretudo dar um contributo para se encontrar aquilo que
designo por "porto de destino", isto é, uma organização-objectivo,
onde devem agrupar-se os debates em torno de questões tão
diferentes como os problemas macro-económicos, as relações
laborais ou alguns interesses sectoriais, regionais e locais.
Termino, então, agradecendo, uma vez mais, o vosso convite e
obrigado pela vossa atenção.






Belmiro de Azevedo