
Miguel Mota
O défice, diferença entre as despesas e as receitas, quando estas são inferiores às primeiras, é sempre algo indesejável. Seja a nível duma dona de casa, seja a nível do governo duma nação, o caso é idêntico: gastou-se mais do que se recebeu.
Só duas causas levam a uma tal situação: ou se vendeu património (delapidando o capital) ou se ficou a dever, seja não pagando compras, seja contraindo um empréstimo.
A nível nacional, há que analisar os dois lados da questão e ver onde estão as causas, isto é, que defeitos houve nas receitas e que excessos houve nas despesas.
Num artigo que escrevi em fins de 1995, mas que não chegou a ser publicado, dizia:
Em 18 de Agosto de 1995, o "Tal & Qual" publicou números, do próprio Ministério das Finanças, que mostravam o que é que pagavam de imposto, em média, por ano, diferentes trabalhadores por conta própria. Alguns desses números eram de estarrecer:
Dono de café e restaurante........12 contos
Comerciante...............................25 "
Dono de pensão ou hotel...........32 "
Construtor civil.........................33 "
Comerciante por grosso............61 "
Agente imobiliário....................70 "
Arquitecto e engenheiro..........140 "
Advogado................................152 "
Médico....................................420 "
Isto é, o governo do PSD mantinha um sistema (legal ou ilegal) de pagamento de impostos que, além de extremamente injusto, deixava o governo sem uma receita de impostos importantíssima. Olhando para os valores da tabela fica-se com a impressão de que estão ali, em impostos que deveriam ser pagos, alguns centos de milhões de contos, talvez o suficiente para cobrir o défice orçamental. Mas também não pode deixar de se assinalar a espantosa apatia dos mais prejudicados que, perante um facto que "toda a gente sabia", não levantavam um clamor de exigência de justa correcção do sistema.
Entretanto, vieram a público outros casos igualmente afrontosos e revelando igual inépcia dos governos. Um deles foi a notícia de terem "prescrito" dívidas ao IRS de contribuintes que não pagaram o que deviam. Este facto espantoso é difícil de explicar só por "incompetência" e sugere algo bem pior. Não é possível compreender como é que não foi feita uma penhora aos faltosos antes dessa "conveniente" (para alguns...) prescrição. Deve ser fácil a qualquer Ministro ou Secretário de Estado das Finanças determinar que os Chefes de Repartição de Finanças enviem ao seu gabinete as listas dos nomes das pessoas cujas dívidas ao fisco estão a menos de um ano e a menos de dois anos de "prescrever". E se algum desses membros do governo não sabe o que fazer em tais casos... é porque não está à altura do cargo. E logo entrariam alguns milhões.
No caso de haver contestação e a dívida ir para tribunal, sugere-se que ela deixaria automaticamente de prescrever e, se o tribunal não desse razão ao devedor, a quantia a pagar seria duplicada e a penhora imediata. Crê-se que só medidas drásticas poderão moralizar o sistema e evitar o escandaloso descalabro actual.
O mesmo sistema de duplicação da quantia em dívida seria aplicada aos casos das multas, se o multado for para tribunal e este não lhe der razão. E como também veio nos jornais que todos os dias caducam muitíssimas multas, não se compreende porque é que, passado um período, talvez de dois ou três meses, sem a multa paga nem contestação em tribunal, não é imediata a penhora, mas para uma quantia dupla da da multa.
Se esta duplicação não for suficiente para refrear os faltosos pode, em vez de se multiplicar o valor em dívida por 2, multiplicá-lo por 3, por 4 ou mais. Se as infracções continuassem, tínhamos, pelo menos, uma boa receita para o Estado, o que permitiria reduzir os impostos dos cidadãos cumpridores da lei. Se os portugueses não forem capazes de conseguir ter governos com acção eficiente, só têm que se resignar a ser um povo pobrezinho, atrasadinho e a ser constantemente explorado por uns quantos oportunistas.
Temos ainda a venda de património valioso por preços ridiculamente baixos. O caso "Lanalgo" (de que nunca mais se falou) está longe de ser o único. E não passa pela cabeça de ninguém que tais vendas sejam decididas por funcionários de baixo nível...
(continua)
O défice, diferença entre as despesas e as receitas, quando estas são inferiores às primeiras, é sempre algo indesejável. Seja a nível duma dona de casa, seja a nível do governo duma nação, o caso é idêntico: gastou-se mais do que se recebeu.
Só duas causas levam a uma tal situação: ou se vendeu património (delapidando o capital) ou se ficou a dever, seja não pagando compras, seja contraindo um empréstimo.
A nível nacional, há que analisar os dois lados da questão e ver onde estão as causas, isto é, que defeitos houve nas receitas e que excessos houve nas despesas.
Num artigo que escrevi em fins de 1995, mas que não chegou a ser publicado, dizia:
Em 18 de Agosto de 1995, o "Tal & Qual" publicou números, do próprio Ministério das Finanças, que mostravam o que é que pagavam de imposto, em média, por ano, diferentes trabalhadores por conta própria. Alguns desses números eram de estarrecer:
Dono de café e restaurante........12 contos
Comerciante...............................25 "
Dono de pensão ou hotel...........32 "
Construtor civil.........................33 "
Comerciante por grosso............61 "
Agente imobiliário....................70 "
Arquitecto e engenheiro..........140 "
Advogado................................152 "
Médico....................................420 "
Isto é, o governo do PSD mantinha um sistema (legal ou ilegal) de pagamento de impostos que, além de extremamente injusto, deixava o governo sem uma receita de impostos importantíssima. Olhando para os valores da tabela fica-se com a impressão de que estão ali, em impostos que deveriam ser pagos, alguns centos de milhões de contos, talvez o suficiente para cobrir o défice orçamental. Mas também não pode deixar de se assinalar a espantosa apatia dos mais prejudicados que, perante um facto que "toda a gente sabia", não levantavam um clamor de exigência de justa correcção do sistema.
Entretanto, vieram a público outros casos igualmente afrontosos e revelando igual inépcia dos governos. Um deles foi a notícia de terem "prescrito" dívidas ao IRS de contribuintes que não pagaram o que deviam. Este facto espantoso é difícil de explicar só por "incompetência" e sugere algo bem pior. Não é possível compreender como é que não foi feita uma penhora aos faltosos antes dessa "conveniente" (para alguns...) prescrição. Deve ser fácil a qualquer Ministro ou Secretário de Estado das Finanças determinar que os Chefes de Repartição de Finanças enviem ao seu gabinete as listas dos nomes das pessoas cujas dívidas ao fisco estão a menos de um ano e a menos de dois anos de "prescrever". E se algum desses membros do governo não sabe o que fazer em tais casos... é porque não está à altura do cargo. E logo entrariam alguns milhões.
No caso de haver contestação e a dívida ir para tribunal, sugere-se que ela deixaria automaticamente de prescrever e, se o tribunal não desse razão ao devedor, a quantia a pagar seria duplicada e a penhora imediata. Crê-se que só medidas drásticas poderão moralizar o sistema e evitar o escandaloso descalabro actual.
O mesmo sistema de duplicação da quantia em dívida seria aplicada aos casos das multas, se o multado for para tribunal e este não lhe der razão. E como também veio nos jornais que todos os dias caducam muitíssimas multas, não se compreende porque é que, passado um período, talvez de dois ou três meses, sem a multa paga nem contestação em tribunal, não é imediata a penhora, mas para uma quantia dupla da da multa.
Se esta duplicação não for suficiente para refrear os faltosos pode, em vez de se multiplicar o valor em dívida por 2, multiplicá-lo por 3, por 4 ou mais. Se as infracções continuassem, tínhamos, pelo menos, uma boa receita para o Estado, o que permitiria reduzir os impostos dos cidadãos cumpridores da lei. Se os portugueses não forem capazes de conseguir ter governos com acção eficiente, só têm que se resignar a ser um povo pobrezinho, atrasadinho e a ser constantemente explorado por uns quantos oportunistas.
Temos ainda a venda de património valioso por preços ridiculamente baixos. O caso "Lanalgo" (de que nunca mais se falou) está longe de ser o único. E não passa pela cabeça de ninguém que tais vendas sejam decididas por funcionários de baixo nível...
(continua)

