02/12/2009

Carta Aberta ao Senhor Deputado


Paulo Portas,

Sou um ex-combatente da guerra de África. Fui comandante de patrulhas de combate no norte de Moçambique. Tive vários confrontos com Samora Machel e os seus homens. Com muita sorte e algum engenho levei sempre a melhor. De minha parte, nunca tive mortos nem feridos. Nas hostes de Samora Machel fiz muitos estragos. Não sou herói. Nunca fui herói. Tive sempre medo de perder a vida em combate. Quem disser que não teve medo ou é mentiroso e fanfarrão ou não passa de um inconsciente. É que na guerra, quem não mata, morre. Quero lembrar aqui que foi o senhor deputado Paulo Portas que ergueu a sua voz no Governo de Portugal , quase ao fim de 40 anos, para que a`Pátria se lembrasse dos seus melhores filhos, os ex-combatentes da guerra de África, no sentido de lhes conceder um suplemento de pensão de 150 euros anuais. Sou, por isso, um dos que tinha o legítimo direito de requerer essa esmola do Estado, pelos quase 4 anos de vida militar, dois dos quais em zona de guerra. Pois bem, nunca requeri o suplemento de pensão por duas razões: a primeira, porque não há preço nenhum que pague a generosidade e o sacrifício da própria vida no cumprimento de um dever. Por isso a Pátria nada me deve. A segunda razão, porque seria um ultraje à memória de meu pai, que no dia da minha partida para África, me disse com o coração a sangrar ae a voz embargada mas firme: «Vai, meu filho, cumpre o teu dever. Sê digno de ti e dos teus antepassados. Sempre soubeste que na nossa família nunca houve nem cobardes nem desertores. Que Deus te acompanhe!» Eu sei que muitos ex-camaradas meus precisam desses 150 euros para a sua sobrevivência. Alguns já morreram á míngua de pão para a boca. Não os posso condenar por isso. Condeno, sim, um Estado que se lembrou tarde e a más horas dos seus melhores filhos, para lhes conceder uma esmola anual de 150 euros e que agora acaba de publicar uma lei a restringir o acesso a esse suplemento, com base no tempo de serviço, criando três escalões: 75 euros (até 11 meses), 100 euros (até 23 meses) e 150 euros (mais de 24 meses). Se os 150 euros já eram uma mísera esmola para quem cumpriu o seu dever para com a Pátria, agora com esta lamentável redução, lançará ainda mais na miséria os meus ex-camaradas do infortúnio e da ingratidão. Por isso, senhor deputado Paulo Portas, levante mais uma vez a sua voz para denunciar mais esta injustiça e lute denodadamente para que esta lei inócua seja imediatamente revogada. Não tenha medo! A arrogância é sinal de fraqueza. E dos fracos não rezará a História!

Francisco Azevedo Brandão