Alda Lara nasceu em Benguela, a cidade das acácias, em 1930. Estudou em Lisboa onde fez o antigo 7º ano do Liceu, tendo depois feito a licenciatura em medicina na Universidade de Coimbra. Em Lisboa esteve ligada a algumas das actividades cívicas na Casa dos Estudantes do Império. Era uma médica de grande sensibilidade que deixou um legado poético de rara beleza. Partiu cedo demais desta vida aos 32 anos.
Numa altura em que mergulhados numa deprimente crise de valores éticos, morais e sociais, em que impera a tristeza, a melancolia e a desesperança, mas também a ganância material que levou à falência os pilares desta sociedade capitalista ocidental, deixo aqui, como aperitivo da grandeza desta mulher, um dos seus belos poemas:
Testamento
À prostituta mais nova
Do bairro mais velho e escuro,
Deixo os meus brincos, lavrados
Em cristal, límpido e puro.
Àquela virgem esquecida
Rapariga sem ternura,
Sonhando algures uma lenda,
Deixo o meu vestido branco,
O meu vestido de noiva,
Todo tecido de renda.
Este meu rosário antigo
Ofereço-o aquele amigo
Que não acredita em Deus.
E os livros, rosários meus
Das contas doutros sofrer,
São para os homens humildes,
Que nunca souberam ler.
Quanto aos meus poemas longos,
Esses que são de dor
Sincera e desordenada...
Esses que são de esperança,
Desesperada mas firme...
Deixo-os a ti meu amor,
Para que na paz da hora
Em que a minha alma venha
Beijar de longe os teus olhos,
Vás por essa noite fora
Com passos feitos de Lua,
Oferecê-los às crianças
Que encontrares em cada rua!..
AIda Lara -1950
(enviado por Mário Russo)