05/04/2009

FELICIDADE INTERNA BRUTA

JOAQUIM JORGE



Vêm aí eleições e os senhores da política deveriam fazer um estudo para se inteirarem do que as pessoas pretendem – e depois, sim, fazer sondagens de opinião para ganhar eleições. Esses estudos e resultados seriam muito úteis para a tomada de decisões por parte da classe política. Os portugueses são os menos felizes e mais deprimidos da Europa. Mas a felicidade é o motor do comportamento humano – é necessário saber como medi-la. Ora, um estudo quantificável do bem-estar das pessoas – o que elas pensam e necessitam – não seria despiciendo, nem frívolo. A felicidade é algo subjectivo, mas associo a extensão da democracia a mais liberdade pessoal, e prefiro sentir-me livre de dependências e dos dependentes. Por exemplo, considero haver mais felicidade no altruísmo que no hedonismo, e prefiro ter mais tempo para dormir que comprar um carro novo. Políticas que promovam felicidade podem ser uma boa maneira de traduzir mais riqueza nacional e bem-estar. Mas há uma questão que deixo à vossa consideração: se o dinheiro não traz a felicidade e o prazer pessoal tão-pouco, porque é que a sociedade actual se concentra tanto neste mal tão necessário?

Superado o nível mínimo de riqueza, dinheiro e felicidade, a capacidade aquisitiva multiplica-se e o sentimento de bem-estar apenas varia. O meu filho tem computador e iPod, telemóvel, PlayStation, etc – e não é mais feliz do que eu, que jogava às cordas com uma bola de pano e caixas de cartão. As pessoas gostariam de ter mais tempo livre do que dinheiro para comprar coisas, mas estão a tornar-se mais egoístas, com muito medo do futuro, temem perder o emprego. Têm de ser mais corporativas e carinhosas. Seria importante medir os indicadores de Felicidade Interna Bruta inseridos no PIB (Produto Interno Bruto). Portugal é dos países que apresentam níveis mais baixos de bem-estar na Europa. Pudera! De que é que estavam à espera? As entrevistas realizadas pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa efectuaram-se entre Outubro de 2006 e Fevereiro de 2007!... E se fossem feitas até aos dias de hoje, o resultado seria muito pior. Não sou um pessimista – sou realista. Melhor dizendo: um optimista informado.

Portugal tem falta de tudo. Falta qualidade de vida, qualidade política, qualidade dos valores ... Como se pode ser feliz se não se tem dinheiro para as coisas mais básicas? Portugal está despido. Interiormente. A resignação, a abulia, a inércia regem o nosso quotidiano. Resulta de um longo, extenso e complexo processo de vivências negativas (trabalho, escola, hospital, tribunal, educação, etc.) que distanciam os portugueses do usufruto salutar da sua qualidade de vida, contudo um direito de cada indivíduo.
Estas expectativas defraudadas e frustrações acumuladas levam à infelicidade e à desmotivação. Tenho a nítida sensação que terei de ajudar o meu filho, para lá do que é habitual: os 30 anos. O futuro é sombrio: dificuldade em arranjar emprego e dinheiro para ter casa própria.
A felicidade passa por valorizar o que temos, perseguir o essencial, desfrutar de pequenas alegrias e fazer felizes os outros. Ser feliz é um direito do cidadão. Jean-Marie Gustave Le Clézio, prémio Nobel de Literatura em 2008, diz: “O dinheiro é o gosto das coisas fúteis, é a possessão derrisória, é também o medo de o perder”. Contudo, viver sem dinheiro é impossível. É preciso comer bem e viver bem, e gozar o direito de se ter qualidade de vida. O dinheiro não compra a felicidade mas ajuda a sermos felizes.

Texto publicado na página 19.
Revista distribuida todos os primeiros domingos de cada mês com o jornal Público.