08/02/2007

SIM À DESPENALIZAÇÃO DA IVG

MANUEL ALEGRE

Portugal é o país da Europa onde mais abortos se praticam ilegalmente por ano, onde mais mulheres morrem por causa de abortos clandestinos e onde mais mulheres ficam mutiladas em consequência de abortos feitos em condições degradantes, sem um mínimo de higiene e segurança. E é também um dos últimos países da Europa onde, depois de sofrerem a humilhação do aborto clandestino, há mulheres que continuam a ser presas, julgadas e condenadas. É por isso que este problema não é só um problema do foro íntimo, mas um flagelo que exige uma decisão política. Essa responsabilidade é nossa, de cada um de nós e de todos os cidadãos. É por isso ainda que, desta vez, não pode haver o comodismo nem a refúgio da abstenção. Nem tão-pouco ambiguidades. Ao contrário do que já ouvi, não houve excessos do lado do SIM no último referendo. Houve desmotivação e confusão. Perdeu-se por míngua, não por excesso. É preciso que desta vez os sinais sejam claros. Quem é pelo SIM não tem que ter complexos, nem se deve deixar inibir ou condicionar. Firmeza de convicções e de argumentos. E ao mesmo tempo moderação, tolerância, respeito pela opinião contrária.

Dizia Voltaire que não é a tolerância que constitui um perigo para a ordem pública, mas sim a intolerância. Vai longe o tempo em que Galileu foi condenado por afirmar uma evidência. Vai igualmente longe o tempo em que Portugal esteve na vanguarda do espírito moderno. Chegou a altura, nesta matéria, de deixarmos de ser uma das poucas excepções na Europa, para que amanhã não se diga, como outrora disse Antero, “enquanto as outras nações subiam, nós baixávamos.”A Terra move-se. E é preciso que Portugal também se mova.

Entendo que o SIM é a resposta que assegura a liberdade qualquer que seja o sentido do seu exercício. Porque se o Tribunal Constitucional já deliberou no sentido da conformidade de uma resposta afirmativa com o modo como a nossa Constituição consagra a inviolabilidade da vida humana, a despenalização da interrupção voluntária da gravidez, tal como formulada na pergunta a referendo, é legítima face ao direito - que é do que neste debate se trata. Assim, tanto é legítima a liberdade de quem pretenda interromper a gravidez no quadro indicado, como a liberdade de quem a pretenda prosseguir.

É porque considero que não há que recusar a qualquer pessoa o exercício de uma liberdade legítima, é porque defendo a igual dignidade destes dois modos de encarar a liberdade, que voto SIM e apelo ao SIM, no próximo dia 11 de Fevereiro.