Marta Costa*
Os estereótipos são um fenómeno inevitável. Podem ser definidos como um conceito ou ideia investida de particular significado para um grupo de pessoas. Do meu ponto de vista, um estereótipo é uma caixa demasiado apertada onde se tentam encaixar as pessoas, transformando-as em menos ou mais do que aquilo que são.
Os estereótipos são “organismos vivos” sujeitos às leis da evolução cultural: nascem, crescem, alteram-se para se adaptarem aos tempos e morrem.
Um dos estereótipos que mais dificuldade tem tido em ser adaptado à nova realidade social é o estereótipo do que é ser feminista. Uma das crenças mais comuns é a de que as feministas são apenas mulheres. Felizmente, a multidão de feministas inclui homens e mulheres e engrossa a olhos vistos.
Outra crença muito comum é a de que as feministas são umas exageradas e fundamentalistas (como já foi ventilado num ou outro comentário do Clube). O comportamento que mais frequentemente visa exemplificar isto mesmo é a queima de soutiens em manifestações de rua. Pesquisas extensas que têm sido feitas demonstram que, em Portugal e nos EUA, nunca se queimou nenhum soutien. E se estar interessada/o em aumentar a qualidade de vida de mulheres e homens é um comportamento fundamentalista, então espero que hajam muitas/os feministas ferrenhas/os.
Acredita-se ainda que as feministas são mulheres frustradas e pouco femininas, que rejeitam a maquilhagem, as idas às compras. Certamente que, como em todos os locais, existem feministas que deram ou dão pouco importância à aparência física, tal como acontece entre as mulheres não feministas.
Por outro lado, acredita-se frequentemente que as feministas rejeitam a maternidade. O que o feminismo rejeita é a maternidade e a paternidade imposta e irresponsável.
Finalmente, acredita-se que o feminismo luta contra os homens. Ora, desde logo podemos dizer que não existe feminismo. Existem feminismos uma vez que, em função da evolução histórica, a procura da igualdade caracterizou-se e caracteriza-se por várias vagas. A 1ª caracterizou-se pela procura de uma identidade, do direito à educação, do direito de exercer certas profissões, do direito de votar e ser votada. A 2ª vaga procurou assegurar direitos jurídicos na esfera familiar, na maternidade, no trabalho, na nacionalidade, na legislação penal, no controlo da reprodução. A 3ª vaga pretende integrar a perspectiva de género em todas as políticas, do ambiente à segurança, passando pela economia e saúde, ou seja, demonstrar que a humanidade tem duas faces, a feminina e a masculina, que possuem construções sociais específicas e que as políticas têm que ter em causa essas diferenças. Procura ainda considerar que os direitos das mulheres sejam considerados direitos humanos assim como garantir uma efectiva partilha de poder, de paridade e a parceria em todas as esferas da vida. Assim sendo, facilmente se pode ver, o feminismo não é nem nunca foi contra os homens. É contra o sexismo.
É claro que, com toda esta carga negativa, muitas mulheres e homens evitam ser rotuladas/os de “feministas” porque consideram que este está associado ao passado e à vitimização, papel que não assenta à grande maioria das pessoas do sexo feminino. No entanto, mesmo as pessoas e sobretudo as mulheres que rejeitam a associação e o envolvimento nas questões da igualdade de género estão, na sua grande maioria, a construir igualdades, ocupando com à-vontade os espaços públicos e privados. E os homens, que têm aqui um papel fundamental, estão cada vez mais conscientes da sua importância neste processo e começam a perceber que as mulheres são tão péssimas ou excelentes como eles próprios (em todas as áreas) porque partilham a condição humana.
Parece-me assim que a sociedade portuguesa está preparada para começar a reflectir mais seriamente sobre as questões da igualdade de género. E as pessoas que ainda não estão preparadas certamente terão a primeira grande oportunidade para o fazer já em 2007. O próximo ano será considerado o "Ano Europeu da Igualdade de Oportunidades para Todos/as – Para uma Sociedade Justa” (instituído pelo Parlamento Europeu e pelo Conselho da União Europeia). A reflexão será certamente potenciada pela presidência Portuguesa no segundo semestre de 2007 uma vez que, como se sabe, quando um país tem a presidência tem que dar sinais claros e evidentes de mobilização e trabalho frutífero ao nível da igualdade. Assim, espera-se até ao final de 2007 novas iniciativas legais e discussão acesa acerca de direitos fundamentais. Sobretudo, espero discussões esclarecedoras, informadas e não baseadas no habitual senso comum. Afinal, a área da igualdade é uma área que exige estudo, como qualquer outra.
* psicóloga e membro do clube