Rodrigo Costa
É inseparável, a nossa condição de bicho social, com a de animal, ainda que humano, porque as traves que nos sustentam são as mesmíssimas que tramitam a existência de todas as espécies. É o Instinto que nos impõe o jogo de sedução; que nos impõe a luta pela comodidade e pela sobrevivência, sempre como partículas que devem obediência ao estabelecimento do Universo. Daí as inconstâncias, entre paixões e tédio. Até que, gastos, a Vida nos recicla e nos transforma –por mais plásticas que façamos– e nos substitui por outros que, mais capazes, mais fortes, se apaixonam e se entediam, suportando inconstâncias, na manutenção dos ciclos de mimetismos e de disputas.
Não há, sem corrupção, nem marcha nem progresso –chamemos-lhe assim– . Ninguém está disponível sem que haja prémio. O altruísmo é uma necessidade de recebimento que não tem mistério; é a razão por que eu, agora, vos escrevo. Porque recebo, em troca, amadurecimento e alívio –não pensem que isto não é matéria–. Damos, porque nos damos. Não chega, a nossa autonomia, à independência. Nós somos, sempre, vítimas, carecidas, de matéria e de afecto.
Não há reis nem ministros nem presidentes sem troca de cedências. Há-de haver, no mínimo, a empatia do aspecto. No cerco que só aparentemente se aperta, só corruptos, divididos em três espécies: activos, passivos e os que não têm outra saída. Um dia, se a Vida permitisse que todos fossem presos, quem, impoluto, faria os julgamentos?
A esperança dos poderes esteve na educação e em Deus. Na falta de percepção e de leitura –ah, maldição! São tantos os que percebem e sabem ler!... Já não é possível roubá-los às escuras–. Por isso, sem evasivas e por falta de meios, aquele Secretário de Estado, sem poder esconder-se nem esconder a truta, teve o descaramento de atribuir as culpas.
P.S: Eu quero acreditar, sem nem alimentar a esperança de mudar o mundo, que este espaço se manterá aberto, e que a sua razão de aparecimento há-de manter, como alicerce, as ideias e as palavras sem medo. É preciso que os falsos e os fantasmas se habituem ao destemor do pensamento, e que encarem as palavras, mais do que como veneno, remédio.
Estou grato, porque posso ser eu em espaço aberto, ao invés de me fechar numa caneta sem préstimo, por não poder dar voz às palavras que me pareçam certas.
A paixão é uma flor, Joaquim Jorge, que não pode viver de secura. Continua.
artista plástico