20/06/2010

Cavaco não dá cavaco

Mário Russo



José Saramago é uma personalidade internacional incontestável, quer se goste ou não. E é português. Foi um homem polémico que nunca virou a cara à luta. Tinha tudo para ficar um desconhecido, mas lutou contra a adversidade e, como autodidacta, estudou línguas e literatura. Era um mestre que não precisou do canudo para ser mundialmente famoso.

Só por isto, representa o que melhor se poderia desejar para o povo português copiar para sair desta crise eterna em que está há muito mergulhado. Exemplos de sucesso como o de Saramago deviam ser seguidos.

Teve períodos menos bons, sem dúvida. Os apoios a Cuba e à Coreia do Norte, duas “democracias” que “respeitam os direitos do homem” só podia ser um ensaio sobre a cegueira.

O saneamento político que promoveu a colegas de profissão, jornalistas, quando foi nomeado para dirigir o Diário após o 25 de Abril, prova o seu lado obscuro e intolerante que atormentaria a vida a qualquer pessoa minimamente sensível. Mas Saramago teve o discernimento de recuar no apoio incondicional às ditaduras e reconhecê-las como tal.

Foi um sonhador que ousou sonhar e venceu. Foi Nobel e reconhecido no mundo. Um verdadeiro monumento para muitos milhões de admiradores pelo mundo fora. Não teve reconhecimento em seu país, na época de Cavaco Silva, que nada fez para contrariar o veto do intolerante “xiita” Sousa Lara, seu sub-secretário da Cultura, à indicação do livro de Saramago para um prémio europeu.

Por isso Cavaco sente-se pouco confortável diante deste evento triste que foi a morte do escritor José Saramago. Até compreendo. Se fosse o cidadão Aníbal, por coerência não tinha mesmo que ir ao funeral de Saramago. Mas o vulto e o prestígio que trouxe a Portugal fizeram de Saramago um monumento nacional e um herói que merece as honrarias da nação. Por isso, Não se trata de Cavaco ir ao funeral. É o Presidente da Republica que deve marcar a sua presença. Tudo que não seja esta presença, é pura hipocrisia digna da que os políticos nos têm brindado.