RICARDO ARROJA*
A escalada de violência no Médio Oriente registada na última semana, e o consequente impacto na cotação do preço do petróleo, realçou uma vez mais a vulnerabilidade mundial em matéria de energia. A tudo isto há que acrescentar os argumentos macroeconómicos defendidos pelos analistas financeiros: a) o consumo de energia está a crescer a taxas anormalmente elevadas e; b) a oferta de produtos petrolíferos não está a acompanhar o crescimento da procura. Nestas circunstâncias, o desfecho é simples: o preço da energia aumenta e o investimento em energias alternativas torna-se inevitável. Em Portugal, os especialistas mencionam a energia eólica como o caminho do futuro. Outros, porém, divergem de opinião e afirmam que a solução é a energia nuclear. Eólica, nuclear, ou outra coisa qualquer, o importante é desenvolver novas fontes energéticas que permitam acomodar as necessidades da economia e da população mundial. O mundo precisa de energia eficiente e menos poluente. Necessita de uma alternativa séria ao petróleo.
Um estudo recente publicado pelos canadianos da Sprott Asset Management (www.sprott.com), intitulado “Investment Implications of Abrupt Climatic Change” (Alterações Climáticas Abruptas e suas Implicações no Investimento), destaca que o incentivo ao investimento em energias alternativas é induzido, não apenas pela alta do preço do petróleo, mas também pelo fenómeno do Aquecimento Global da Terra. O relatório da Sprott menciona que as emissões de dióxido de carbono representam cerca de 83% do efeito estufa produzido pelo Homem. De acordo com diversos cientistas, o crescente número de emissões libertadas na atmosfera contribui para alterações climáticas que são já visíveis em algumas estatísticas citadas pelo mesmo estudo. Em 2005, foi registado um número recorde de tempestades tropicais e furacões no Oceano Atlântico – um total de 26. No mesmo período, observaram-se no Pólo Norte 32 terramotos glaciares – um número três vezes superior à média anual desde 1993. E, nos últimos dois anos, a temperatura média em certas zonas do Alaska, do Canadá e da Rússia, aumentou 3 graus centígrados face à média dos últimos cinquenta anos.
A pressão da opinião pública, influenciada por estudos como este, acabará por persuadir os governos e a própria indústria na direcção de alternativas credíveis à energia fóssil em geral e ao petróleo em particular. Alguns economistas estimam que, em 2050, a população mundial ascenderá a 9 mil milhões de pessoas – um aumento de 50%. Outros indicadores apontam para que, no longo prazo, a taxa de crescimento do PIB mundial seja de 2% ao ano, concentrado em países emergentes como a China e a Índia. Assim, o crescimento populacional e económico previsto criarão necessidades energéticas adicionais. Os transportes e a electricidade serão, provavelmente, as componentes mais importantes no consumo mundial de energia. A Agência Internacional de Energia cita que, actualmente, o carvão representa a fonte energética a partir da qual é produzida a maior parte da electricidade mundial – cerca de 37% da total. Seguem-se o gás natural (18%), a energia hídrica (18%), a energia nuclear (17%), o petróleo (8%) e outras fontes residuais (2%). Com base nas estimativas de crescimento da população e economia mundial, prevê-se que, em 2025, será necessário produzir 5500 gigawatts de electricidade. Tratar-se-á de um aumento de 65% face à capacidade instalada que existe hoje.
Os números são indiscutíveis: o consumo de energia vai continuar a aumentar. Representa a melhoria da qualidade de vida mundial, por isso, a questão não reside em restringir o acesso à energia, mas sim em torná-la mais limpa, mais eficiente e mais barata. A Sprott sugere a adopção da energia nuclear como o caminho a seguir – para igual eficiência de utilização, é a menos onerosa e a menos poluente. Os cálculos apresentados deduzem que, ao contrário da energia gerada a partir de carvão e gás natural, no caso da energia nuclear, a proporção de custo da matéria-prima associada ao custo final da electricidade é residual. Assim, o custo do carvão e do gás natural representam 35% e 73%, respectivamente, do custo final da electricidade. No caso da energia nuclear, o custo do urânio representa apenas 5% do custo final da electricidade. Cada libra de urânio está, hoje, cotada a cerca de 40 dólares. Quanto ao custo por kilowatt de electricidade produzida, o nuclear representa uma poupança de 66% face ao petróleo. E de 50% face ao gás natural. Em relação ao carvão, cada kilowatt de electricidade gerada a partir de energia nuclear fica ao mesmo custo nominal. Contudo, a energia nuclear, comparada com o carvão, reduz em grande escala a emissão de dióxido de carbono na atmosfera.
Sempre que se discute o tema da energia nuclear aparece logo quem recorde a catástrofe de Chernobyl. Contudo, convém sublinhar que o desastre de Chernobyl foi o resultado de falha humana – algo que podia e devia ter sido evitado. A própria tecnologia de Chernobyl nada tem a ver com a de hoje. Existem actualmente mais de 400 reactores nucleares em funcionamento – nos últimos anos não há registo de catástrofes. As estatísticas da Agência Internacional de Energia evidenciam também que, dos dez países que mais dependem do nuclear para a produção de electricidade, nove são europeus. A França lidera a lista – cerca de 78% da sua electricidade é gerada a partir de energia nuclear. Seguem-se a Lituânia, a Eslováquia, a Bélgica, a Suécia, a Ucrânia, a Bulgária, a Eslovénia, a Coreia do Sul e a Suíça. Esta lista mostra que não estamos a falar de países do terceiro mundo. Esta lista mostra, também, que países como a França, a Suécia, a Bélgica ou a Suíça, tidos como paradigmas de cidadania, já adoptaram o nuclear na sua política energética. Julgo que Portugal deveria fazer o mesmo.
*Analista Financeiro e membro do Clube dos Pensadores
artigo de 28/07/2006 publicado no semanário Vida Económica