A jornalista Manuela Moura Guedes
(MMG), é uma pessoa incómoda sobretudo para o poder instituído, seja ele qual
for. Pelo seu prestígio nacional, Joaquim Jorge convidou-a para dissertar sobre
o jornalismo, política e a liberdade de imprensa em Portugal. Depois da
habitual bem estruturada apresentação do convidado, neste caso, convidada, Joaquim
Jorge deu a palavra à distinta jornalista que começou por fazer uma resenha do
início da sua carreira de jornalista e a sua passagem pela política, onde foi
independente nas listas do CDS. A sua versatilidade e talento levaram-na ao
mundo da música, tendo editado um álbum que foi o mais vendido em Portugal na
década de 80.
Na passagem pelo Parlamento constatou
que os jornalistas ali baseados, bastas vezes, estavam moldados e no regaço do
poder. Não se querem “chatear” e até combinam o que sair na imprensa, o que a desencantou.
Contou o caso mediático Freeport que envolve Sócrates, de quem MMG diz nada ter
pessoalmente contra, e que nem o conhece pessoalmente, mas foi sua vítima. A
uma pergunta da plateia negou que fosse um caso pessoal contra Sócrates.
Elencou um conjunto de casos estranhos que suscitou investigação jornalística,
como o Portucale, envolvendo figuras públicas importantes, o caso BPN, o GES,
sofrendo pressões de todos os lados, aliás, como se deve imaginar. Só não tem
culpa, diz MMG, de ao investigar coisas “estranhas” caírem ligações onde está
Sócrates: a licenciatura, as casinhas da Beira, a herança, a casa da Brancamp,
a Cova da Beira, etc.. Como jornalista sempre teve a convicção de que quanto
mais uma pessoa é responsável político, mais de lhe deve exigir. Para
demonstrar que não é um caso pessoal, relatou o que lhe aconteceu ao tempo de
Cavaco como PM, em que Marques Mendes a pôs na prateleira.
Sobre o jornalismo na televisão diz
serem todos iguais, porque bebem a informação da mesma fonte, escasseando o
jornalismo de investigação independente. É contra os comentadores políticos
profissionais, cuja informação é direcionada aos respetivos partidos, por mais
que façam a ginástica de independência. Brincou com o caso, dizendo que não
conhece outro país em que tal acontece (um provincianismo, digo eu). O novo
Diretor de Informação da RTP, Paulo Dentinho que viveu em Paris, manifestou
desejo de acabar com essa prática. Vamos ver se consegue o intento.
Uma constatação da convidada
sobre os jornalistas portugueses é a de que sofrem de complexo de esquerda. Dá
o exemplo, se o atual PM fosse acusado de corrupção (como Sócrates está sendo
acusado com evidências monstruosas), qual seria o comportamento? Seguramente que
não seria o de proteção como está a acontecer com Sócrates.
Joaquim Jorge perguntou porque
Manuela Moura Guedes retirou a queixa contra Sócrates e a convidada não deixou
de contar pormenores do assunto, confessando que chorou no escritório do seu
advogado ao tratar do andamento do processo, porque constatou que tudo lhe era
hostil, desde o Presidente do ST, Noronha do Nascimento que obrigou um juiz a
destruir as provas que incriminavam Sócrates até à proteção que o PGR, Pinto
Monteiro, dedicava ao caso. Por isso, não quis reviver as angústias de uma
perseguição e difamações em vão.
O comportamento dos portugueses
foi também avaliado. Manuela Moura Guedes é de opinião que de modo geral os
portugueses não são interventivos civicamente por causas, mas por interesses
particulares. Quando lhes toca no bolso vão à rua, de contrário ficam no sofá
que é mais cómodo e por isso estamos onde estamos, ao contrário de outros
povos, designadamente os espanhóis, com movimentos organizados com peso na vida
pública (2 recentes movimentos têm quase 50% das preferências eleitorais).
A cobertura das campanhas
eleitorais pela imprensa e o bate boca político que se tem feito também foi
tema abordado pela convidada, que refere que a lei que a rege é de 1975, quando
os portugueses na sua maioria nem sabiam o que eram partidos políticos e
democracia, eleições, etc. Hoje, 40 anos após essa data histórica, há
conhecimento e responsabilidades de todos. Não faz sentido que não se distinga
propaganda eleitoral de notícias de eleições. Até jornalistas confundem. Faz
sentido os horários eleitorais obrigatórios (tempos de antena que são
propaganda) e as notícias, que devem ser do foro da liberdade jornalística.
A crise na TAP foi comentada com
veemência por Manuela Moura Guedes, que diz que a classe dos pilotos, uma
classe privilegiadíssima é desleal com o Governo com quem celebrou um acordo,
com os restantes trabalhadores e com o país, dadas as repercussões económicas
graves que a irresponsável atitude conduz. Acha que os pilotos são os responsáveis
pela empresa ir ao charco. É de opinião que o Governo deveria ser mais
enérgico, simplesmente fechando a empresa e abrindo uma outra, limpando a
agenda política dos dirigentes sindicais dos pilotos da TAP.
Mário Russo |
Do dealbar da sessão, Joaquim
Jorge pediu licença a Manuela Moura Guedes e anunciou novo debate a 25 de Maio,
de grande impacto, convidando todos à sua participação.
Uma noite de excelente debate com
uma pessoa simpática, incómoda e muito direta, que não tem papas na língua.
Parabéns JJ e CdP.