|
Mário de Oliveira |
Depois
de “excelentes” provas dadas durante 6 anos no Porto
Bispo
Manuel Clemente desce a Lisboa para subir a patriarca/cardeal e, porventura, a futuro
Bispo de Roma/Papa
Duas
procissões, uma com a imagem da senhora de fátima, no seu andor, que a pobre
coitada, se a não transportarem aos ombros ou nos braços, nunca sai do sítio, assim
como não come nem bebe, não respira nem fala, e a outra, com uma custódia de
ouro, transportada pelo próprio Bispo, onde se escondia uma minúscula hóstia
branca, por sinal, duas imagens de marca do tipo de pastoral que Manuel
Clemente, nos seis anos em que foi Bispo do Porto incentivou, promoveu e
presidiu, são igualmente os dois últimos actos de paganismo cristão religioso a
que ele presidiu, pela Avenida dos Aliados e outras ruas do centro da cidade, já
na sua dupla qualidade de patriarca da diocese de Lisboa e de Administrador Apostólico
da Diocese do Porto.
Como a
acumulação dos dois títulos indica, o Bispo Manuel Clemente está de regresso a
Lisboa, de onde veio, há uns seis anos para o Porto, fazer tarimba como bispo
titular e dar provas se tinha ou não perfil, política e eclesiasticamente
correcto, para poder suceder ao cardeal patriarca de Lisboa, D. José Policarpo,
então, já com a resignação compulsória no horizonte. Pelos vistos, passou, summa cum laude, ainda que sem
unanimidade, nos testes que duraram seis anos, mais dois do que o inicialmente previsto,
já que, entretanto, houve conveniência eclesiástica que o titular de Lisboa
permanecesse dois anos mais, para lá dos 75.
Foram seis
anos de total paz de cemitério na diocese, com o bispo a correr de um lado para
o outro, a distribuir sorrisos e palavras sem substância profética, o que lhe
valeram o Prémio Pessoa, sem que ele próprio tenha suspeitado porquê, uma vez
que, tanto quanto se sabe, o Poema escrito ou praticado está longe de ser o seu
forte. Aliás, o Poema, lá, em quem acontece e se fiaz carne e sangue, práticas
económicas e políticas maiêuticas, duelos teológicos desarmados, como em Jesus,
o de antes do cristianismo, adeus paz dos cemitérios, adeus cumplicidades com
os grandes do Poder político, do Dinheiro e da Religião.
Com esse
objectivo, no seu horizonte de bispo do Porto, Manuel Clemente cumpriu à
perfeição o que os Poderes instituídos esperavam dele. E, como estes sabiam, de
fonte suja, que esse era o objectivo do Bispo Manuel Clemente, nunca lhe
regatearam ajudas. Os convites para discursar em variadíssimos ambientes
culturalmente fúteis e participar em debates sobre tudo e coisa nenhuma, foram
mais que muitos, e ele não se fez rogado. O próprio Prémio Pessoa 2009 faz
parte destas ajudas (não estivéssemos em vésperas de comemorar os cem anos de
República no país, e o prémio ter-lhe-ia sido atribuído?!) e ele, obviamente,
não deixou os seus créditos por mãos alheias e aceitou-o, sinal inequívoco de
que a missão de Evangelizar os pobres e os povos, primeiro e único dever de um
bispo da Igreja que se reclama de Jesus, não era com ele, como não é com nenhum
dos clérigos, cujos sonhos maiores, se eles tiverem unhas para tocar guitarra, são
sobretudo fazer carreira eclesiástica.
Mas, para
melhor dar a impressão de que evangelizar era o que o Bispo Manuel Clemente
mais fazia, correu a diocese de lés a lés, mais do que uma vez, presidiu a
missas sem conta e sempre usou da palavra, durante elas, sem qualquer
contraditório. Pelo contrário, sempre com o submisso silêncio dos presentes,
condenados ao papel de seus eternos ouvintes. E toda aquela sua vontade de
congregar multidões em seu redor, como faz o papa, em Roma e fora de Roma,
quando sai de viagem de chefe de estado do Vaticano?! Este foi um outro trunfo
do Bispo que, agora, deixa tudo e vai-se embora, atraído pelo íman do título de
patriarca de Lisboa e de cardeal, no próximo consistório que vier a ter lugar
em Roma.
Ora, para
arrastar e congregar multidões, nada mais eficaz do que pôr a imagem da senhora
de fátima no seu andor, pelas ruas do Porto e pelos caminhos das aldeias que
são também paróquias da diocese do Porto. Um ano de Missão foi um ano de
passeatas da imagem da senhora de fátima, de reza de terços, de missas a
granel, Evangelho de Jesus, nenhum. A festa litúrgica do corpo de deus, foi
outro “coelho” que ele tirou da cartola e era vê-lo radiante com as multidões a
seus pés. Tal como na chamada “bênção das pastas”, com missa, na Avenida dos
Aliados, a fazer lembrar o Papa Bento XVI, quando esteve em Portugal e
prolongou a sua visita por mais um dia, para vir presidir à missa nesta Avenida
central do Porto.
Entretanto, que
se saiba, o Bispo, com todo este frenesim, não chegou a “tocar” o coração de
ninguém e, agora, manda tudo às urtigas, ao deixar, inopinadamente, a diocese
do Porto, numa frustrante sensação de “orfandade”, porque ele, durante estes
seis anos, não foi capaz ou não quis suscitar lideranças, não foi capaz ou não
quis ser presença maiêutica, geradora de saudáveis conflitos e polémicas, o que
sempre quis foi fazer carreira para patriarca e cardeal de Lisboa e, daí, quem
sabe, subir a papa de Roma. Foi sempre ele, o protagonista, ao ponto de deixar
estiolar nas rotineiras visitas pastorais pelas respectivas regiões pastorais, até
os seus próprios Bispos auxiliares.
Decididamente,
o patriarca Manuel Clemente nasceu e veio ao mundo, para subir, subir, subir na
carreira eclesiástica. A sua mãe não se terá agradado da ideia deste seu filho
querer ser padre. Desconhecia, nessa altura, que, para ele, esse seria apenas o
primeiro degrau de uma carreira eclesiástica fulgurante. Hoje, orgulha-se dele,
assim como os seus conterrâneos. E, quando, depois de tomar posse como patriarca
de Lisboa e cardeal, conseguir achar tempo para ir de visita à sua aldeia
natal, tem toda a população a seus pés a aplaudi-lo. Exactamente, o oposto do
que sucede a Jesus, quando, algum tempo depois de ter iniciado a Missão de
Evangelizar os pobres e começar a praticar/edificar o Reino/Reinado de Deus
entre nós e connosco, foi a Nazaré, onde se tinha criado. Depois do que lhes
disse, na sinagoga do lugar, em lugar de ser ovacionado, foi insultado e
escorraçado pelos vizinhos e familiares, que, ofensivamente, diziam uns aos
outros, Não é este o camponês-artesão de Nazaré, o filho de Maria?!, duas
designações que, na cultura social da época e do país, eram o que de mais
insultuoso se podia dizer de um homem judeu!
Meu querido
irmão Bispo Manuel Clemente. Sei que serás um vencedor, porque tudo tens feito
para isso. Mas não te louvo. Choro. Como Jesus chorou sobre a cidade de
Jerusalém, a do grande templo e dos sumos-sacerdotes. Sabe, entretanto, que a
minha alegria será ver-te descer, fazer-te o mais pequeno de todos, o último de
todos. Longe de todo esse mundo do Poder e dos poderosos, intrinsecamente
perverso, mentiroso, ladrão e assassino. Se um dia vieres a dar este fecundo passo,
na linha do grão de trigo que desce à terra para dar fruto, tens-me aqui, nesta
casinha arrendada onde vivo, entre o povo de Macieira da Lixa e com ele, como um
pequenino sinal de contradição. Os meus braços estão sempre abertos para te
acolher. E conversaremos, horas, dias, semanas, meses, sem fim. Fico à tua
espera. Vem!