16/04/2012

Poema de Günter Grass

AQUILO QUE TEM QUE SER DITO



Por que me tenho me calado, calado por tempo demais
acerca do que é patente e já vem sendo ensaiado
em simulações no fim das quais nós, como sobreviventes,
somos no máximo umas notas de rodapé?


É o alegado direito de ataque preventivo
que poderia extinguir aquele povo
subjugado por um valentão
e empurrado ao júbilo organizado,
porque se suspeita da construção
de uma bomba atómica nos seus domínios.


Porque, no entanto, eu me proíbo
de mencionar o nome daquele outro país
no qual se dispõe há anos - ainda que em segredo -
de um potencial nuclear crescente
e sem controle, pois não se dá acesso
a nenhuma inspeção?


A generalizada omissão desse fato,
à qual se subordina o meu calar,
eu sinto-a como incriminadora mentira
e coerção com promessa de punição:
assim que desobedecida,
o veredicto antissemitismo está em toda parte.


Agora, porém, porque o meu país,
- que pelos seus crimes próprios,
que estão para além de comparação,
é frequentemente chamado à colação ¬-
deve entregar a Israel
(por razões meramente comerciais,
embora declarando-se ligeiramente
que se trata de reparação)
mais um submarino, cuja especialidade
é ser capaz de dirigir ogivas
de destruição maciça a um lugar
onde não foi comprovada a existência
de uma bomba atómica que seja, e no entanto
com o fim de atemorizar pretende-se
que existam provas conclusivas -
por isso eu vou agora dizer
o que precisa ser dito.


Por que razão, no entanto, até agora eu me calei?
Porque eu pensava que a minha origem,
marcada com mácula nunca extinguível,
proibia dizer tais fatos como verdadeiros
em relação ao país Israel, com o qual tenho laços
e quero continuar a ter.


Porque é que eu digo somente agora,
envelhecido e no fim da minha tinta,
que o poder atômico de Israel põe em risco
a paz mundial, já frágil sem isso?


Porque precisa ser dito
Porque amanhã pode ser muito tarde dizer;
e também porque nós
- como alemães já o suficiente incriminados -
podemos vir a ser fornecedores para um crime previsível,
com o que nenhuma das usuais desculpas
teria o poder de redimir
a nossa participação na culpa.


E admito: não mais me calo
porque estou farto da hipocrisia do Ocidente,
e tenho esperança que com isso
se possam libertar muitos desse calar
e proclamar o causador do perigo reconhecível perigo
a abrir a mão da violência, e igualmente
a que seja permitido pelos governos dos dois países
um controle permanente e sem impedimentos
do potencial atómico israelita
e das instalações atómicas iranianas
por um orgão internacional.


Somente assim será possível ajudar
todos, israelitas e palestinianos,
e mais: todos os seres humanos

que nessa região ocupada pela loucura
vivem oprimidos em inimizade, e afinal
a nós mesmos também

*traduzido O caixa d`óculos

Este poema está a gerar grande controvérsia em Israel , Alemanha e resto do Mundo