De regresso duma reunião de trabalho em Orléans, num dos centros do Institut National de la Recherche Agronomique (Instituto Nacional de Investigação Agronómica, mundialmente conhecido pela sua sigla, INRA), o meu filho trouxe-me algumas publicações desse famoso Instituto, um deles o Relatório Anual de 2010.
Muito bem apresentado e profusamente ilustrado, em formato grande, abre com um
Editorial assinado pela sua actual Presidente Directora Geral Doutora Engenheira Agrónoma Marion Guillou e subordinado ao título "Alimentar 10 mil milhões de mulheres e homens exige muita inovação".
A Presidente Directora Geral é assistida por três Directores Científicos, um para Agricultura, uma para a Alimentação e um para o Ambiente.
Com a sua sede em Paris, o INRA tem um total de algumas dezenas de centros de investigação, cobrindo todo o território da França. Em 2010 o INRA tinha 8.488 funcionários, 43,5% dos quais cientistas e dirigentes, e o seu orçamento foi de 822 milhões de euros, a maior parte de dinheiro do estado e o restante proveniente de contratos, verbas da União Europeia, venda de produtos, etc. Como em qualquer instituição de investigação agronómica (tal como na investigação médica), uma parte da investigação realizada não vai ser directamente utilizada pelos agricultores. É aquilo a que é uso chamar ciência "pura", por oposição a "aplicada". (Eu não gosto dessa designação e sou da opinião de Pasteur que dizia que não há ciência pura e ciência aplicada. Há ciência e aplicações da ciência). Neste sector a Genética tem um importante papel, especialmente nos estudos dos cromossomas e na sequenciação dos genomas (decifrar os códigos genéticos) de organismos de importância agrícola. No INRA estão a realizar essa sequenciação do DNA da vaca, do porco, do carneiro e da cabra.
Nos estudos de cromossomas o INRA tem uma longa e valiosa tradição. Quando, no início da década de 1950, iniciámos em Elvas, na Estação de Melhoramento de Plantas, a criação de triticales (híbridos entre trigo e centeio, seguidos da duplicação do número de cromossomas), já o INRA tinha iniciado trabalho semelhante com a Dr.ªIvonne Cauderon.
Em 2010 o INRA registou no Catálogo Nacional de Variedades três novos trigos (Flamenko, Folklor e Musik), com boas características de produtividade e resistência. A produção unitária de trigo na Europa, mesmo nos países de agricultura mais progressiva, tem estado estacionária desde os meados da década de 1990, o que é considerado preocupante. Investigadores do INRA e duma organização Arvalis publicaram um estudo em que sugerem como causas a sensibilidade às variações climáticas e alterações nas rotações, em que a colza (uma Crucifera) substituiu as
leguminosas. Não posso deixar de lembrar que, há muitos anos e em vários escritos, eu penso que a produção unitária do trigo no Alentejo, mesmo no sequeiro, poderá aumentar muito quando as terras forem convenientemente drenadas (algo muito importante nos anos de inverno chuvoso, não este ano) e as rotações incluírem mais leguminosas.
Tem havido, desde há muitos anos, bons contactos entre a Agronomia portuguesa e o INRA. Em 1966, como Secretário Geral do Simpósio "A Investigação Agrária e o Desenvolvimento Económico-Social do País", organizado pelas Secções de Engenharia Agronómica e Engenharia Silvícola da Ordem dos Engenheiros, tive a honra de convidar o então Presidente Director Geral, o Engenheiro Agrónomo Jean Bustarret para fazer a conferência de abertura. A sua conferência foi sobre "A Investigação Agronómica: o seu ligar na Investigação Científica e o seu papel no desenvolvimento
económico e social". Mais recentemente, um outro Presidente Director Geral do INRA fez uma conferência na Estação Agronómica Nacional em que tratou de tema semelhante.
Como eu gostaria que os governantes portugueses fossem capazes de aprender estas
lições!
Miguel Mota