25/02/2012

Viragem na Política Agrícola Comum


A PAC - Política Agrícola Comum - iniciou-se logo nos começos da CEE, com apenas seis membros, Bélgica, Holanda, Luxemburgo, França, Alemanha e Itália. Esse grupo era deficiente em 50% de produtos agrícolas, o que era grave não só sob o ponto de vista económico mas também da defesa. Em caso de conflito os povos são mais facilmente vencidos pela fome do que pelo canhões. Graças à elevada competência dum ilustre agrónomo holandês, Sicco Mansholt (que tinha sido Ministro da Agricultura da Holanda, foi nomeado Comissário da Agricultura de 1957 até 1972, quando passou a exercer, até Janeiro de 1973, o cargo de Presidente da CEE), foi iniciada uma Política Agrícola Comum (PAC). (O então chamado Mercado Comum só o foi, durante muitos anos, apenas para a agricultura). Para obter efeitos rápidos de aumento da produção agrícola, foi decidido pagar um preço ligeiramente acima do preço mundial e adquirir toda a produção de cereais, lacticínios e carnes. Ao mesmo tempo, porque Sicco Mansholt sabia que sem investigação agronómica não é possível haver desenvolvimento da agricultura, uma parte do dinheiro foi devotada a essa investigação.
O programa teve completo êxito. A agricultura da CEE, que se manteve até 1973 apenas com os seis países originais, desenvolveu-se enormemente e deixou de ter de importar aqueles produtos. A partir de certa altura, não sei precisar quando mas bem antes da nossa adesão
em 1986, a PAC passou a acumular uma sucessão de erros, que muito caro custaram à Europa. Logo que o mercado ficou saturado com cereais, carnes e lacticínios, em vez de reduzirem, progressivamente, os preços de protecção, como mandariam as mais elementares regras de economia, mantiveram-nos durante muito tempo de forma que se foram acumulando quantidades astronómicas de excedentes daqueles produtos. Aos custos do pagamento desses excedentes acrescentavam-se enormes despesas de transporte e armazenamento. E quando conseguiam ser exportados era com prejuízo. A PAC gastava nessa altura bem mais de metade do orçamento da CEE. Em 1993 gastou
cerca de 9.000 milhões de contos, mas menos dum terço desse total é que foi para os agricultores.
Na altura da nossa adesão ainda havia quem compreendesse que sem investigação agronómica não há progresso na agricultura, de tal forma que, mesmo antes da adesão de alguns países de agricultura atrasada, como era o caso de Portugal, a CEE deu-lhes dinheiro para a investigação. Não sei quanto recebeu Portugal nesse ano mas no Departamento de Genética da Estação Agronómica Nacional, em Oeiras, então a meu cargo, recebemos uns 30.000 contos, que nos permitiram comprar um semeador para ensaios, uma debulhadora para ensaios, diversos aparelhos acessórios para o microscópio electrónico e mais equipamento miúdo, o que permitiu incrementar muito o nosso trabalho.
Para além de vários erros e zig zags sobre subsídios aos agricultores, de que não tratarei, passou a haver uma diminuição progressiva, até à extinção, das verbas devotadas à investigação agronómica. Alguns projectos conseguiram ser aprovados mas para isso tiveram de ser "mascarados" de que se destinavam ao ambiente ou ao desenvolvimento rural.

Está a ser preparada a nova PAC, para vigorar depois de 2013, de 2014 a 2020.Numa excelente conferência dum colega envolvido nesse trabalho, fiquei a saber que há uma viragem na atitude que tem dominado nos últimos tempos: voltou a ser considerada uma verba para a investigação agronómica. Não é muito, uns 4.500 milhões de euros, para 27 países durante sete anos, creio que pouco mais de 1% das despesas totais. Espero, contudo, que esse dinheiro consiga dar algum impulso à agricultura europeia, que nas últimas décadas se atrasou vergonhosamente, com graves prejuízos para a economia. Não me admirava se a principal causa da injustificada luta contra os transgénicos fosse por eles virem do outro lado do atlântico, pois a Europa - incluído Portugal - que há muito devia ter iniciado a sua produção quando aplicável, não o fez. Esperemos que a nova PAC - mas há que esperar ainda mais de ano e meio... - ajude a corrigir os erros do passado e dê à agricultura e, portanto, também à economia, o impulso de que tanto necessitam.

Miguel Mota