22/09/2011

Os limites da moralidade fiscal


Há quem defenda uma taxa única para impostos e descontos, alegando que essa mesma taxa, aplicada a valores mais altos já leva a pagar mais de imposto. Entre os que defendem um sistema fiscal que dê algum benefício aos de menos proventos, para que não se alargue - e, se possível, diminua - a diferença entre ricos e pobres, é normalmente considerado que a quem tem mais proventos deve ser aplicada uma taxa mais alta que aos que têm menos. É assim que o IRS tem escalões, de forma a cumprir esse bom princípio de moralidade económica e fiscal, ou seja, fazer com que quem mais leva para casa pague uma mais alta percentagem do que quem leva menos.
Quem teve, em 2010 rendimento colectável de 4.793 até 7.250 euros pagou 13,58%; entre 41.349 e 59.926 euros pagou 37,38%; com rendimento colectável superior 150.000 euros pagou 45,88%.
O mesmo sucedeu quando recentemente foi aplicada aos funcionários públicos esse princípio de boa moral, de aplicar uma taxa de desconto mais elevada aos vencimentos mais altos, tendo o desconto máximo, 10%, os vencimentos superiores a 4.200 euros mensais.
Parece um bom sistema e muito particularmente a todos os que se dizem de esquerda, o sistema político que tem como objectivo atenuar as diferenças entre pobres e ricos. Acontece, porém, que essa moralidade tem limites. Porque razão quem tem 50.000 euros de rendimento colectável deve pagar IRS a uma taxa superior à dos que têm 40.000 e porque razão os que têm 200.000 devem pagar a uma taxa superior à dos que têm 100.000, se os que têm 300.000, ou 500.000 euros não pagam a taxas mais elevadas? Igualmente, porque razão é que os funcionários que ganham 4.500 euros por mês devem ter um desconto a taxa superior à dos que têm 3.500 euros se os que ganham 5.500 euros ou mais descontam à mesma taxa? Repete-se: é uma moralidade aplicada até certo nível; daí para cima... desaparece! Isto é, desse valor para cima desaparece o esquerdismo e impera a extrema direita.
Sem ser especialista de finanças, penso que o sistema seria mais justo se se traçasse a curva contínua (que nunca atingiria um patamar) da taxa a aplicar em função dos proventos, o que até evitaria o caso de, dentro dum escalão, o valor mais baixo e o mais alto pagarem à mesma taxa. Com os computadores actuais não haveria o problema da complexidade e demora a fazer os cálculos.
Na minha opinião, a correcção do sistema actual, que considero errado, seria bem mais lógica e socialmente mais eficaz do que "uma taxa especial para ricos" ou taxar o património, como agora se aventa.

Miguel Mota
*Investigador Coordenador e Professor Catedrático, jubilado