24/09/2011

Como um mundo sem Ética na política e na economia gera uma crise: dissertação de Bagão Félix no CdP

Bagão Félix proferiu no Clube dos Pensadores uma brilhante lição sobre as grandes questões do nosso tempo, como dizia Edgar Morin. Questões centradas nos comportamentos da economia e da sociedade onde a ética está pelas ruas da amargura e sobra uma sociedade sem valores.

Depois da apresentação do convidado, por Joaquim Jorge, que enalteceu as qualidades do convidado, a quem chamou de verdadeiro Senador, Bagão Félix esmiuçou sob o ponto de vista económico e demográfico a evolução de um conjunto apreciável de indicadores que justificam o estado deplorável em que se encontra Portugal e a génese da crise.

Começando pelo PIB mostra a persistente queda deste indicador, década após década. Com efeito, na década de 60 o país crescia, em média, 7,5% ao ano, passando na década seguinte para cerca de 5% e sempre a descer até chegar à última década com uma média de crescimento de apenas 0,4%. Em contrapartida, as dívidas pública e externa têm experimentado crescimentos significativos, a ponto de Portugal ser hoje o 5º país mais endividado do mundo.

Enquanto o PIB cresce 20%, a dívida no mesmo período cresce 100%. Porém, Bagão Félix chama a atenção para o trágico da situação portuguesa que contrai dívida não para o crescimento, mas para se tornar mais pobre.

Outro aspeto da maior importância é a evolução da demografia portuguesa, que arrasta o país para o limbo do precipício, porque depois de 1990 a quebra na natalidade é tal que deixou de haver a reposição geracional. Por outro lado, garças à melhoria das condições de vida, a mortalidade infantil é residual e a esperança de vida dos portugueses aumentou muito, mas que não atenuam a fraca natalidade e introduz, por outro lado, maior pressão sobre a saúde financeira do setor da segurança social.

De facto, enquanto em 1974 havia cerca de 5,6 trabalhadores na ativa para cada pensionista, hoje é de cerca de 1,9 trabalhadores para cada pensionista, que põe em risco a sustentabilidade do sistema de reformas dos trabalhadores portugueses, se nada for feito.

Conjugando todos os fatores, só resta a Portugal a via da maior produtividade e, por isso, trabalhar e trabalhar.

A rematar a lição, Bagão Félix traçou o diagnóstico da crise que assola o mundo e apontou para a falta de ética na economia, na política e nas relações sociais. Há uma desvalorização dos valores éticos que Homens generosos como Ghandi, Mandela, Luther King e tantos outros, abraçaram.

A propósito, apresentou um curioso gráfico cartesiano para definir as pessoas em inteligentes, generosas, malfeitoras e estúpidas. Os grandes Homens são generosos pois ao potenciar ganhos pensam sempre nos outros em detrimento de si próprios. São cada vez menos. Em contrapartida sobram os egoístas e os malfeitores. Até poderia realçar o recente episódio do homem mais rico de Portugal, que “consegue” apenas pagar 10% do IRS que pagam outros, muito menos milionários que ele, e se recusa a ajudar a “pagar” a fatura da crise, pois reclama-se trabalhador. O grau zero da decência, ou seja, a indecência em toda a sua pujança.

A falta de ética é patente quando políticos gastam hoje e remetem para as gerações vindouras o pagamento da conta. Apelou para a transformação da escola do facilitismo, que hoje ensina ferramentas mas que deixou de ensinar valores, arrastando a sociedade para o lodaçal em que nos encontramos.

Em resposta a perguntas da plateia, disse ser contra a baixa da TSU, justificando com clareza meridiana, que ninguém pode garantir minimamente a sua eficácia, arrastando o país para uma aventura sem saber qual o destino. Disse que Portugal não é uma cobaia do FMI, como sugere esta medida.

Um debate da maior qualidade, como tem sido timbre no CdP. Joaquim Jorge tem este feeling de convidar na hora certa a pessoa certa, com o tema apropriado para o momento.

Mário Russo