Bagão Félix proferiu no Clube dos Pensadores uma brilhante lição sobre as grandes questões do nosso tempo, como dizia Edgar Morin. Questões centradas nos comportamentos da economia e da sociedade onde a ética está pelas ruas da amargura e sobra uma sociedade sem valores.
Depois da apresentação do convidado, por Joaquim Jorge, que enalteceu as qualidades do convidado, a quem chamou de verdadeiro Senador, Bagão Félix esmiuçou sob o ponto de vista económico e demográfico a evolução de um conjunto apreciável de indicadores que justificam o estado deplorável em que se encontra Portugal e a génese da crise.
Começando pelo PIB mostra a persistente queda deste indicador, década após década. Com efeito, na década de 60 o país crescia, em média, 7,5% ao ano, passando na década seguinte para cerca de 5% e sempre a descer até chegar à última década com uma média de crescimento de apenas 0,4%. Em contrapartida, as dívidas pública e externa têm experimentado crescimentos significativos, a ponto de Portugal ser hoje o 5º país mais endividado do mundo.
Enquanto o PIB cresce 20%, a dívida no mesmo período cresce 100%. Porém, Bagão Félix chama a atenção para o trágico da situação portuguesa que contrai dívida não para o crescimento, mas para se tornar mais pobre.
Outro aspeto da maior importância é a evolução da demografia portuguesa, que arrasta o país para o limbo do precipício, porque depois de 1990 a quebra na natalidade é tal que deixou de haver a reposição geracional. Por outro lado, garças à melhoria das condições de vida, a mortalidade infantil é residual e a esperança de vida dos portugueses aumentou muito, mas que não atenuam a fraca natalidade e introduz, por outro lado, maior pressão sobre a saúde financeira do setor da segurança social.
De facto, enquanto em 1974 havia cerca de 5,6 trabalhadores na ativa para cada pensionista, hoje é de cerca de 1,9 trabalhadores para cada pensionista, que põe em risco a sustentabilidade do sistema de reformas dos trabalhadores portugueses, se nada for feito.
Conjugando todos os fatores, só resta a Portugal a via da maior produtividade e, por isso, trabalhar e trabalhar.
A rematar a lição, Bagão Félix traçou o diagnóstico da crise que assola o mundo e apontou para a falta de ética na economia, na política e nas relações sociais. Há uma desvalorização dos valores éticos que Homens generosos como Ghandi, Mandela, Luther King e tantos outros, abraçaram.
A propósito, apresentou um curioso gráfico cartesiano para definir as pessoas em inteligentes, generosas, malfeitoras e estúpidas. Os grandes Homens são generosos pois ao potenciar ganhos pensam sempre nos outros em detrimento de si próprios. São cada vez menos. Em contrapartida sobram os egoístas e os malfeitores. Até poderia realçar o recente episódio do homem mais rico de Portugal, que “consegue” apenas pagar 10% do IRS que pagam outros, muito menos milionários que ele, e se recusa a ajudar a “pagar” a fatura da crise, pois reclama-se trabalhador. O grau zero da decência, ou seja, a indecência em toda a sua pujança.
A falta de ética é patente quando políticos gastam hoje e remetem para as gerações vindouras o pagamento da conta. Apelou para a transformação da escola do facilitismo, que hoje ensina ferramentas mas que deixou de ensinar valores, arrastando a sociedade para o lodaçal em que nos encontramos.
Em resposta a perguntas da plateia, disse ser contra a baixa da TSU, justificando com clareza meridiana, que ninguém pode garantir minimamente a sua eficácia, arrastando o país para uma aventura sem saber qual o destino. Disse que Portugal não é uma cobaia do FMI, como sugere esta medida.
Um debate da maior qualidade, como tem sido timbre no CdP. Joaquim Jorge tem este feeling de convidar na hora certa a pessoa certa, com o tema apropriado para o momento.
Mário Russo