10/09/2011

Carta aberta a Pedro Passos Coelho

Senhor PM, eu tenho a melhor das impressões de si. Estou convencido que é uma pessoa séria e patrioticamente empenhado em ajudar Portugal a sair da crise, mas a atuação do seu governo deixa muito a desejar.

Naturalmente lembra-se do que disse do seu antecessor, que o considerava mentiroso e um não cumpridor de promessas. E tinha razões para isso, pois bastava confrontar o discurso com a prática. Recusou ter de aumentar impostos e até pediu desculpas por ter acedido.

Prometeu fazer diferente do que Sócrates vinha fazendo, e milhares votaram em si. Nomeou membros novos para dotar o governo de sangue novo, com novas ideias e de facto as escolhas prometiam essa faceta. Volvidos cerca de 100 dias e o país está prostrado com o murro no estômago que o Senhor lhe presenteou. Lembra-se do que disse quando a agência de rating desclassificou Portugal? Pois nós estamos assim. De ideias novas quase nenhuma. É mais do mesmo, como se diz.

O seu governo já aumentou mais impostos que o de Sócrates. Muito mais. Ora, para sair de uma dívida, em tempos de crise de liquidez financeira, aumentando impostos sobre impostos, não precisa de um governo. Pode dar a receita a qualquer contabilista que o faz com menos custos.

A cada 9 dias há uma medida no mesmo sentido, que é aumentar impostos e já se ouvem as vozes de descontentamento no seu partido e no da coligação, e isso, como deveria saber, não indicia nada de bom.

Não basta dizer que é um corajoso e que não vira a cara às dificuldades. Porque de coragem pode ter pouco e ser muito mais de voluntarismo e de muita falta de sensibilidade ao pulsar das “ruas”. A perceção do perigo é uma virtude e está a faltar-lhe. Os seus jovens ministros serão tecnicamente bons, mas estão a mostrar que lhes falta a estatura política, e essa, meu caro PM, não lhe devia faltar.

Sei que deve estar mais angustiado que eu, pois estará a rever-se no que disse de Sócrates. O seu governo comunica mal e está a ser fatal. A sua credibilidade corre sério risco de se apagar e o pior que poderia acontecer a este país seria ouvirmos não uma, mas milhares de pessoas dizerem, “Sócrates vem, que estás perdoado”.

Senhor PM, sabe que uma conta de 100, pode ser paga em 10 parcelas de 10 ou em 100 de 1. E é aqui, nesta singela e despretensiosa imagem que reside a falta de sensibilidade e, quiçá, de competência, do seu governo. Com efeito, ainda não percebeu que não pode fazer uma perseguição fiscal aos contribuintes, de que não há memória. Está a fazer a um povo inteiro o que Hitler fez aos judeus. Claro que não pode estar contente. Mas também está com falta de ideias.

Se o senhor quiser governar, é melhor que seja com povo e não sobre cadáveres. Por isso, não pode aniquilá-lo, como está a fazer. E é pena que esteja a caminhar para o abismo se não mudar. De crescimento só fala nos impostos. E a economia? Onde está o Ás do Canadá? Eclipsou-se do baralho?

Obviamente que sabe o que é a dúvida metódica. Pois bem, questione-se a si próprio se tem de ser um capacho da Tróika tecnocrata e insensível e dos seus jovens guerreiros “turcos”. Eu desejo que cumpra os compromissos de redução do défice, mas, Senhor PM, tem de ser na medida exata das nossas possibilidades como povo, e não na medida dos bolsos dos senhores ricos da tróika. Não podemos pagar em 10 parcelas, mas talvez em 100. Mas pagamos e honramos os compromissos.

Mário Russo


*novo acordo ortográfico