"Não me quero focar no passado, pois estou numa Secretaria de Estado virada para o futuro. Apenas direi que falhou a ligação entre a ciência e a economia" declarou ao "Expresso" (6-8-2011) o Secretário de Estado do Empreendorismo, Competitividade e Inovação Carlos Oliveira.
A criação dos grandes laboratórios de investigação científica do estado, fora das universidades, iniciou-se em Portugal em 1936, com o nascimento, no Ministério da Agricultura, da Estação Agronómica Nacional (EAN). Com ela foi estabelecida a carreira de investigação científica, paralela da docência universitária. Dez anos mais tarde, decalcado da EAN mas tendo podido livrar-se de algumas das suas limitações, foi criado, no Ministério das Obras Públicas, o Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC). Alguns outros laboratórios, segundo o mesmo modelo, apareceram mais tarde.
Considerando apenas a EAN e o LNEC, o que deram a Portugal, em ciência, em prestígio internacional e de contribuição para a economia, foi imenso, algo várias vezes o dinheiro nelas investido, o que equivaleu, para o estado, a um investimento a render juros que os nossos economistas mostram não saber que existem.
Há anos, foi estabelecida uma "lei", não escrita mas religiosamente seguida, que mandava extinguir toda a investigação do estado que não fosse das universidades. Isso foi sendo feito pela calada, passo a passo, cortando meios de trabalho - por exemplo, em 1985 foram cortadas quase todas as revistas científicas da Estação Agronómica - não substituindo o pessoal que se reformava ou deixava a instituição, desviando avultadas quantias a elas destinadas, etc. etc. e culminando com a vergonhosa legislação de finais de 2007. A EAN (oficialmente extinta, pois até o nome causava engulhos aos autores da famigerada "lei") e o LNEC são hoje uns míseros restos do enorme know how que foi destruído. As consequências para a economia foram terríveis e estamos agora na situação de que se queixa o Secretário de Estado. Situação que não existia há vinte ou trinta anos!
(Não sei se o Senhor Secretário de Estado já alguma vez comeu a uva 'D. Maria', uma uva branca, de mesa, com bagos muito grandes e gosto excelente, em tempos abundante nos mercados - agora a ressurgir novamente - que tanto deu à agricultura e, portanto, à economia portuguesa. E também não sei se saberá que ela resultou do trabalho de investigação agronómica realizado na EAN, em Oeiras, pelo meu falecido colega José Leão Ferreira de Almeida, que lhe deu o nome de sua mãe. Quantos casos como este, a darem boa contribuição para a economia de Portugal, deixaram de aparecer em consequência da criminosa destruição?)
O Senhor Secretário de Estado Carlos Oliveira mostra ter consciência do problema quando diz que "na agricultura queremos ter uma maior produção de produtos nacionais e ajudar a que eles sejam escoados para os mercados". É precisamente para revitalizar a agricultura - que tem andado a ser destruída nas últimas décadas - que a investigação agronómica é necessária, para que haja inovação. E para isso há que fazer o mais urgentemente possível a recuperação do que tem andado a ser destruído.
Miguel Mota
A criação dos grandes laboratórios de investigação científica do estado, fora das universidades, iniciou-se em Portugal em 1936, com o nascimento, no Ministério da Agricultura, da Estação Agronómica Nacional (EAN). Com ela foi estabelecida a carreira de investigação científica, paralela da docência universitária. Dez anos mais tarde, decalcado da EAN mas tendo podido livrar-se de algumas das suas limitações, foi criado, no Ministério das Obras Públicas, o Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC). Alguns outros laboratórios, segundo o mesmo modelo, apareceram mais tarde.
Considerando apenas a EAN e o LNEC, o que deram a Portugal, em ciência, em prestígio internacional e de contribuição para a economia, foi imenso, algo várias vezes o dinheiro nelas investido, o que equivaleu, para o estado, a um investimento a render juros que os nossos economistas mostram não saber que existem.
Há anos, foi estabelecida uma "lei", não escrita mas religiosamente seguida, que mandava extinguir toda a investigação do estado que não fosse das universidades. Isso foi sendo feito pela calada, passo a passo, cortando meios de trabalho - por exemplo, em 1985 foram cortadas quase todas as revistas científicas da Estação Agronómica - não substituindo o pessoal que se reformava ou deixava a instituição, desviando avultadas quantias a elas destinadas, etc. etc. e culminando com a vergonhosa legislação de finais de 2007. A EAN (oficialmente extinta, pois até o nome causava engulhos aos autores da famigerada "lei") e o LNEC são hoje uns míseros restos do enorme know how que foi destruído. As consequências para a economia foram terríveis e estamos agora na situação de que se queixa o Secretário de Estado. Situação que não existia há vinte ou trinta anos!
(Não sei se o Senhor Secretário de Estado já alguma vez comeu a uva 'D. Maria', uma uva branca, de mesa, com bagos muito grandes e gosto excelente, em tempos abundante nos mercados - agora a ressurgir novamente - que tanto deu à agricultura e, portanto, à economia portuguesa. E também não sei se saberá que ela resultou do trabalho de investigação agronómica realizado na EAN, em Oeiras, pelo meu falecido colega José Leão Ferreira de Almeida, que lhe deu o nome de sua mãe. Quantos casos como este, a darem boa contribuição para a economia de Portugal, deixaram de aparecer em consequência da criminosa destruição?)
O Senhor Secretário de Estado Carlos Oliveira mostra ter consciência do problema quando diz que "na agricultura queremos ter uma maior produção de produtos nacionais e ajudar a que eles sejam escoados para os mercados". É precisamente para revitalizar a agricultura - que tem andado a ser destruída nas últimas décadas - que a investigação agronómica é necessária, para que haja inovação. E para isso há que fazer o mais urgentemente possível a recuperação do que tem andado a ser destruído.
Miguel Mota