20/03/2011

PEC n+1


Portugal precisa de fazer ajustamentos na sua economia e reduzir o seu défice. Para tanto, o governo de José Sócrates apresentou um orçamento há menos de meio ano com o argumento de que é o que o país precisa, que é imprescindível e o que vai acalmar os mercados.
Como não aconteceu nada do que previu, apresentou um primeiro PEC, como essencial e a retórica do costume. Em comum a austeridade, os cortes de benefícios sociais, aumento de impostos e reduções de subsídios, sempre para a mesma classe de contribuintes: os que não podem fugir e são os sacrificados.

Porém, em pouco tempo, apresentou o PEC 2 com o mesmíssimo argumento. Os mercados reagiram ao contrário do que Sócrates vaticinou e eis que apresenta um PEC 3, com a mesma receita de austeridade, para os mesmos de sempre. Cortes salariais, congelamento das pensões, cortes cegos na administração pública e empresas públicas, independentemente de serem ou não eficientes. Independentemente de serem essenciais ou não.

Sabe-se lá porque devaneio dos deuses, os mercados não ouviram Sócrates depois desta sangria sobre uma franja significativa e maioritária do povo que trabalha e não foge aos impostos (porque não pode). Então o nosso PM apresenta o PEC 4, esse essencial e definitivo.

Logo no dia seguinte Portugal foi financiar-se nos mercados, que não ouviram Sócrates e Teixeira dos Santos (que ao contrário de JJ não considero-o bom ministro, apenas um técnico com qualidade, é certo, mas sem visão política e social, mas uma pessoa séria).

A entrevista que o economista chefe da Moody´s deu esta semana após cortar no rating de Portugal, vem esclarecer muita coisa. Primeiro desmentir categoricamente o conceito de “essencial” de Sócrates. O que os mercados querem saber é se os partidos do arco do governo têm ou não predisposição para ajustar o défice para valores considerados normais. Não querem saber se é o PS ou o PSD. Outra questão que não querem saber é se a receita é A ou B. Querem os resultados.

Dito isto, temos de analisar porque é que a coisa tem corrido mal a Sócrates. Mas antes gostaria de dizer que é minha convicção que o governo está a fazer o que pensa ser o certo e adequado para o país. E, como diz o povo, a quem faz o que sabe, mais não se lhe pode exigir.

Porém, o que o governo tem feito não serve minimamente ao país, como demonstram facilmente os resultados do orçamento e dos PEC receitados. Se deixarem virá um PEC 5 e a seguir outro até ao n+1, se existir entretanto povo português que sobreviva. Aliás, a velocidade com que apresenta PECs é demonstrativo que não são sérios e daí a desconfiança dos mercados e de toda a gente.

Para além da forma como foram impostos, na base da chantagem e do medo, como se fosse a única solução, na substância é um fracasso e na forma um desastre, como diz António Costa e bem.

É dos livros que um plano com as características exigidas (profundo ajustamento ao nosso estilo de vida) não pode conter apenas medidas imediatistas, mas de médio e de longo curso que possam suscitar da sua leitura a convicção do caminho que o país percorrerá. Não está em causa os sacrifícios que teremos de aguentar, mas saber que são por uma boa causa e que encontraremos o caminho e não como hoje, que são inglórias.

Este governo, já o disse à saciedade, não tem competência nem ideias, porque não tem pessoas que possam corporizar essa competência tão necessária. O que falta neste domínio, sobra em arrogância, autismo, mentira e jogo baixo. Sócrates e o seu governo estão a mais no país. Não fazem parte da solução há muito tempo. Não constituem um grupo credível, porque são capitaneados por um obstinado teimoso, que não é suficiente quando não se tem razão e não se sabe.

Porém, do lado da oposição, sobretudo o PSD de PPC também não pode continuar a dizer que é injusto e que não aceita a fórmula. Não pode argumentar que na hora certa é que diz, como se estivesse a esconder um troféu.

O PSD tem que perceber que é a alternativa e tem já que esclarecer qual é o seu plano a curto, médio e longo prazo. Tem que dizer como vai baixar o défice. Que reorganização na administração pública e nas empresas públicas pretende encetar e em que extensão. Que institutos vão acabar ou fundir-se. Que empresas municipais têm de acabar; que fará da reorganização administrativa do país. Se vão ou não manter-se as Freguesias e municípios atuais e os governos civis, cabides de boys dos partidos que governam.

Se vai ou não rever profundamente o logro que são as “virtuosas” PPP (parcerias público-privadas) que enterram o pais a cada ano e comprometem as gerações futuras.

As cartas estão em cima da mesa, só não percebo a relutância de quem ainda acha que o governo não tem mesmo de cair o mais rapidamente possível, antes de derrubar o pais com maior força que um tsunami, para as profundezas.

Mário Russo

*novo acordo ortográfico ainda não em vigor