29/01/2010

Um certo 31 de Janeiro


Joffre Justino





Estamos em plena semana do 31 de Janeiro, data que comemora a 1ª Revolta Republicana, no Porto, e que se desenvolve num contexto de combate contra o Império Britânico que pretendeu e conseguiu, dada a fragilidade da corte portuguesa, quase sem conflito, tomar o Mapa Cor de Rosa, parte africana dominante do Império Português e, assim, fragilizar definitivamente a corte, a monarquia e evidentemente também Portugal.

Já vos recordei em outro email a importância do nosso, da Academia de Estudos Laicos e Republicanos, Jantar/debate de 30 de Dezembro de 2010. Neste que vos envio opto por vos relatar uma história da minha vida, vivida no Porto, a 31 de Janeiro de 1970…

Tinha chegado de Angola em Agosto de 1969 e rapidamente instalado no Porto, cidade origem da minha família, em casa da minha irmã. Lá, tal qual o fizeram os meus compinchas angolanos em Lisboa, tentei estabelecer contactos com gentes do MPLA que vivessem nesta Invicta Cidade.

Por isso mesmo e sem perceber bem como, diga-se, dei por mim como dirigente associativo, eleito democraticamente, da Associação de Estudantes da Faculdade de Economia do Porto, numa lista, percebi mais tarde, largamente de estudantes afectos ao PCP.

E foi assim que nos primeiros dias de Janeiro de 1970 estava num comité especial a organizar, com o Movimento da Juventude Trabalhadora, uma manifestação contra a Guerra Colonial, a arrancar no dia 31 de Janeiro de 1970, á saída do cemitério onde os Republicanos se juntavam todos os anos a comemorar o aniversário do 31 de Janeiro.

Por forma a darmos impacto mais revolucionário ao Evento.

É claro que é importante recordar que se vivia então uma cisão na Oposição Democrática com a CDE a ter sido, em 1969, a força eleitoral do PCP e com a CEUD enquanto a força eleitoral dos republicanos históricos, como o meu Pai e a sua família.

Bem, diga-se que eu, vindo de Angola, ainda assim, já na altura, mesmo conhecendo bastante mal a minha família, a sabia Republicana e activa, com o meu tio avô Artur Valença a ser um significativo activista da CEUD e com o meu pai a visitar as instalações da CEUD várias vezes.

No entanto não o via militante republicano.

Chega o dia 31 de Janeiro e tal como combinado lá fomos para a porta do cemitério a ver chegar os Republicanos, gente de idade, para mim, provecta e sinceramente desconhecidos, angolano que era, do seu papel e da sua História.

Já que meu Pai apesar de se Republicano e anti salazarista assumido, se nos deu uma educação liberal, pouco nos relatava das suas vivências politicas…

E é por isso que a minha surpresa ainda foi maior quando vejo surgir à porta do cemitério – o meu Pai.

Em estado de choque e imaginando que seria fortemente repreendido por estar a li, optei por investir de antes dele e cheguei-me perguntando o que fazia ele ali.

Isso pergunto-te eu disse-me ele também bastante surpreendido com a situação.

Claro que tive de lhe dizer que estava com uns amigos que se preparavam para arrancar com uma Manifestação Contra a Guerra Colonial e que, claro, iria com eles.

Eu também vou disse meu Pai.

E lá fomos, entre fugas á policia, horas a fio, correndo o Porto e gritando palavras de ordem contra a Guerra Colonial.

E o meu Pai sempre connosco.

É formidável o teu Pai diziam os meus Amigos e Camaradas daquele Combate.

Eu sorria e lá ia dizendo que ele estava ali sobretudo para tomar conta de mim, não fosse acontecer-me algo.

Terminámos o dia num Comício da CEUD, com o resto da família do meu Pai, sem que eu tivesse alguma vez a certeza sobre se ele teria estado comigo, por mim ou também por estar contra uma Guerra, que ele, anos antes, apoiava, Republicano da Linha do Cunha Leal que era.

Foi o meu 1º 31 de Janeiro e a minha segunda Manif contra a Guerra Colonial….e, claro, é dia que nunca esquecerei, também porque o meu Pai esteve comigo todo o tempo.


Director Pedagógico