12/11/2009

2ªparte

Sou crítico da generalidade das religiões e não me furto a dizê-lo com a maior veemência a qualquer tipo de religioso. Este espírito crítico relaciona-se geralmente com o funcionamento dos clubes e as regras a que os crentes estão sujeitos, a maioria delas escritas na idade média inferior, ou ainda em épocas pré-cristãs, e que vigoram e ditam a vida a tanta gente. Como não poderia deixar de ser, a igreja católica está muito mais debaixo de olho do que outras confissões, dada a sua representatividade e influência social no país que somos.Para dizer a verdade, a resistência à mudança é sobejamente conhecida. Falamos então da mesma igreja que coloca explicitamente a mulher numa posição de subalternidade – pergunto-me a propósito, quem vai obedecer e honrar a quem num casamento homossexual a posição relativa de um dos elementos do casal hetero, porque quererá um casal homo, sendo que, nesse caso, a igualdade de género estará assegurada?Mas tal vem de trás, da tal bíblia, sagrada para muitos, que proíbe essas coisas de homossexuais, aberrações que, segundo excelências católicas, se trata, afinal, do prolongamento no tempo de algumas tendências que, de tenra idade, surgem e que se transformam, se existentes ainda a partir da puberdade, num desvio.

Nada de novo, portanto, pelo menos desde nem sequer o tempo existia.Mas os tempos modernos são tempos de media, e os conservadores, católicos e de outras confissões, ateus conservadores e conservadores de outra espécie qualquer, mais os ignorantes que são transversais a todas estas classes,não conseguem escapar a essa realidade. E vai daí, lá vão arranjando algumas pessoas, assim com um ar de rapaz bem pensante e moderno q.b., nada de exageros que também não é necessário, que aparecem com tons progressistas a clamar pela legitimação da opinião pública acerca do assunto em referendo.São assuntos de consciência, cada qual tem a sua, sim senhora, e até dizem que são fracturantes. Mas a verdade é que a Assembleia da República não pode fazer concessões à manipulação da opinião pública por parte destes agentes, quando o que está em jogo é uma questão intimamente relacionada com os direitos humanos, com a dignidade das pessoas.Costumam ainda apelar para algo na Constituição da República que, aparentemente, diz que um casamento é entre pessoas de sexos opostos.

E eu pergunto, porque não mudar a lei, já que são esses os mesmos, precisamente os mesmos, que vêm clamando por uma revisão constitucional muito mais suspeita do que a simples modificação de um texto com o objectivo simples de estabelecer uma correspondência entre este e o dos direitos e a dignidade do cidadão – e do homem?Por fim, há os que nos dizem, enfastiados, «tudo bem, eu até seria capaz de pensar no assunto, se não tivéssemos problemas mais urgentes para tratar, isso só serve é para por o pessoal a pensar em outras coisas que não a crise e as políticas»…O que dizer, senão que estes são os que acham que os direitos humanos não se devem imiscuir nas grandes opções do plano, quinquenal, já agora, que estalines há-os para todos os gostos, à esquerda, à direita e ao centro...

O problema desta gente toda é não conseguirem pensar que são heterossexuais (?) por acaso e que apenas tiveram a sorte de estarem do lado certo da barricada das convenções, primeiramente fundadas pela interpretação primitiva da natureza, depois interpretadas à luz da religião e, por fim, enfiadas num saco de gatos como estas duas, mais o preconceito, a insegurança na identidade e, sobretudo, com o gato gordo que é a hipocrisia.Não consigo deixar de ter a secreta esperança de que, se acontecesse o que diziam ainda hoje no tasco onde costumo almoçar, que «esta paneleirada está a tomar conta disto tudo», nunca seria necessário um referendo ao casamento heterossexual. Nem ao casamento, já agora...


Carlos José Teixeira