24/09/2009

PRIMADO DA CULTURA

Francisco Azevedo Brandão


Aqui há tempos,Manuel Maria Carrilho, numa entrevista a um semanário nacional, teceu duras críticas à política cultural do governo socialista de José Sócrates que, na sua opinião, foi medíocre ou quase inexistente.Nos programas eleitorais o PS continua a considerar a Cultura um parente pobre da política e o PSD vem também dizer que a Cultura não é uma prioridade governamental se for poder. Estas duas posições dos dois maiores partidos vão assim contra a corrente modernista que considera e bem a Cultura como base fulcral para o desenvolvimento social e económico de um povo e de uma nação. Nesta linha de pensamento está o escritor libanês, radicado em Paris desde 1976, Amin Malalouf que no seu último livro «Um Mundo Sem Regras», escreve lucidamente sobre o papel da Cultura no mundo contemporâneo. Não resisto, por isso,de transcrever aqui algumas das suas teses: «A humanidade acaba de experimentar em duas ou três gerações bastantes derivas contraditórias. As do comunismo e as do capitalismo, as do ateísmo e as da religião. Deveríamos resignar-nos a estas oscilações e aos desregramentos que delas resultam? Não estamos nós suficientemente escaldados para querermos retirar as lições destas experiências? E para desejar sair finalmente destes dilemas debilitantes? Que um escritor, ou qualquer outra pessoa que trabalhe no domínio da cultura, pretenda preconizar uma escala de valores baseada na cultura parece-me demasiado previsível e pode levar a sorrir. Mas é porque há um mal-entendido no significado das palavras. Considerar a cultura como um domínio entre outros, ou como um meio de adornar avida para uma certa categoria de pessoas, é enganar-se de século, é enganar-se de milénio. Hoje, o papel da cultura é fornecer aos nossos contemporâneos os instrumentos intelectuais e morais que lhes permitirão sobreviver - nada de menos. ... Se não pretendemos esgotar rapidamente os recursos do planeta, teremos de privilegiar tanto quanto possível outras formas de satisfação, outras fontes de prazer, nomeadamente a aquisição do saber e o desenvolvimento de uma vida interior risonha. ... As necessidades e os prazeres da existência podemos procurar satisfazê-los consumindo mais, o que pesará nos recursos do nosso planeta e suscitará tensões destruidoras. Mas poderíamos também satisfazê-los de uma maneira diferente, privilegiando a aprendizagem em todas as idades da vida, encorajando todos os nossos contemporâneos a estudar línguas, a apixonar-se pela disciplinas artísticas, a familiarizar-se com as diversas ciências, para que sejam capazes de apreciar o significado de uma descoberta em biologia ou em astrofísica. O conhecimento é um universo incomensurável, todos nós poderíamos aprofudá-lo incessantemente durante toda avida que nunca o esgotaríamos. Malhor ainda: quanto mais o aprofundarmos, menos esgotaremos o planeta. Esta é há uma razão para considerar o primado da cultura como uma disciplina de sobrevivência. Mas não é a única razão. Há uma outra, igualmente fundamental e que só justificaria que coloquemos a cultura no centro da nossa escala de valores. Trata-se da maneira como ela pode ajudar-nos a gerir a diversidade hunana. Estas populações com múltiplas origens, que vivem lado a lado em todos os países, em todas as cidades, vão continuar a olhar-se entre si através de prismas deformantes - algumas ideias feitas, alguns preconceitos ancestrais, algumas fantasias simplistas? Parece-me que chegou o ,momento de modificar os nossos hábitos e as nossas prioridades para nos colocarmos seriamente à escuta do mundo onde estamos embarcados. Porque neste século já não há estrangeiros, já só há «companheiros de viagem». Quer os os nossos contemporâneos habitem o outro lado da rua ou no outri lado da Terra, estão a dois passos de nossa casa. Os nossos comportamentos têm efeito na sua carne,e os os eus comportamentos tê efeito na nossa. Sew pretendemos preservar a paz civil nos nossso países, nas nossas cidades, nos nosssos bairros e no conjunto do planeta, se desejamos que a diversidade humana se traduza por uma coexistência harmoniosa e não por tensões geradoras de violência, já não podemos permitir-nos conhecer «os outros» de maneira aproximativa, superficial, grosseira. Temos necessidade de conhecê-los co subtileza, de perto, direi mesmo na sua intimidade. O QUE SÓ PODE FAZER-SE ATRAVÉS DA SUA CULTURA. ... DEVEMOS ATRIBUIR Á CULTURA E AO ENSINO O LUGAR PRIORITÀRIO QUE LHE CABE»