03/05/2009

Gripes e lucros gananciosos de mãos dadas


Mário Russo

Está na mente de todos o alarme que foi a gripe das aves e as estimativas de mais de 20 milhões de mortes, que felizmente não se verificaram.
Agora, uma nova cepa patogénica da recombinação de vírus da gripe suína com humana, transmitida entre humanos. Como verificou-se quando o célebre H5N1 (das aves) estava em alta na imprensa, reportagens investigativas mostraram as condições de produção de aves em áreas enormes, sem condições higiénicas, com ênfase na Ásia e os lucros das grandes produtoras de medicamentos (Roche e Glaxo).

A criação de porcos, para alimentar a poderosa indústria de transformação de carne de porco, é feita em grande escala, com milhares de porcos confinados em áreas reduzidas. Os excrementos, urina, restos do processamento industrial (sangue, vísceras e seus conteúdos, etc.) produzem-se em grandes quantidades e o seu tratamento em países como o México (apenas porque a origem mais forte é daqui) é deficitário, na maior parte dos casos lançados em linhas de água.


A cidade do México, com área urbana de cerca de 10 milhões de habitantes e no seu entorno cerca de 20 milhões, não tem sistema de saneamento básico capaz de tratar o esgoto ali produzido. As granjas que rodeiam o Distrito Federal do México produzem os hortícolas para a população com rega por esgoto não tratado. O seu produto é vendido em especial num mercado central da cidade onde mais de 300 mil compradores se deslocam diariamente e produz cerca de 500 toneladas de resíduos biodegradáveis descartados em lixeira eufemísticamente chamado de aterro sanitário. Em termos sanitários é um quadro dramático de vectores de doenças.

Milhões de pessoas convivem com o esgoto a céu aberto, não apenas no México, mas em muitas regiões periurbanas de grandes cidades no mundo inteiro com especial ênfase para a América Latina, Ásia e África. População mal nutrida, que vive em condições infra-humanas, convivem com os animais de criação (porcos e galinhas), o lixo, e esgotos a céu aberto.
A agravar este estado sinistro, as crises económicas e as guerras gananciosas que se espalharam têm levado à fuga das populações para as cinturas das cidades à busca de segurança e com estas migrações o transporte de doenças e o seu espalhamento. Este é quadro negro em que vivemos. Como não proliferarem as doenças com maior voracidade que no passado quando se multiplica a mobilidade das pessoas?

Urge pôr cobro às desigualdades que o século XXI teima em não vencer e que constitui um rotundo fracasso do denominado mundo civilizado. A ganância continua a imperar. É preciso regulamentação apertada para a criação de animais para a alimentação em larga escala, definindo áreas mínimas compatíveis com regeneração ambiental e que evitem o que se está a passar hoje com as consequências da gripe suína, aliás, mal explicada pelas autoridades.

É imperioso olhar para as condições em que vivem milhões e milhões de pessoas, independentemente da sua localização na Terra. Para além de melhorar as suas vidas, também favorece a nossa, pois contribuiria para a saída da crise económica, porque desde a habitação ao saneamento básico, é preciso investir o que os banqueiros e gestores de topo roubaram estes anos todos e levaram ao crash do mundo financeiro. É uma oportunidade ante tão dramático quadro que alimenta todos os nossos medos deste século
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