31/01/2009

Angola e a miopia do governo português


Mário Russo

Angola está a ressurgir após dezenas de anos de guerras entre irmãos. Muitas obras estão a ser executadas por todo o lado a um ritmo inimaginável.

O crescimento tem sido acima de 10% ao ano e tudo leva a crer, pese embora a actual crise, que continuará a assim ser nos próximos anos, pois a riqueza em petróleo (maior produtor de África), diamantes, ferro, ouro, urânio, madeiras, café e sisal são mais que suficientes para suportar os investimentos necessários.

Mas há mais. O solo em Angola e a fartura em água são excelentes condimentos para a produção agrícola e para a pecuária. Angola tem tudo para ser o celeiro de África. Começam a desenvolver-se explorações com milhares de hectares para produção de milho, batata-doce, oleaginosas, hortícolas, etc.
A concessão de terras é feita aos milhares de hectares. A produção de sementes de oleaginosas para a produção de biodiesel é outra das vertentes com grande potencial de crescimento.

Num quadro de profunda crise, é uma oportunidade de ouro para empresas e técnicos portugueses, que têm de passar um martírio para conseguir um visto de trabalho. As exigências do governo através do consulado em Portugal são mais que muitas. Ao contrário do que acontece com o Brasil, em que os portugueses entram no país e lá estando se vão legalizando, em Angola é difícil a obtenção de um visto, com muitas exigências (carta de chamada, carta de responsabilidade pela estadia, prova do local de estadia, prova bancária de compra de 200 USD$ por dia de estadia, registo criminal, vacinas, etc.

Será que Angola está a exagerar? Não. Está apenas a fazer o que Portugal exige a um angolano que demande Portugal. É o que se chama de reciprocidade diplomática. Os angolanos com quem falei, com responsabilidades políticas e/ou governamentais, lamentam que Portugal não tenha um mecanismo de flexibilidade recíproca, como tem com o Brasil, de modo que o governo de Angola aplique também o mesmo aos cidadãos portugueses.

Poderia esta situação ser diferente? Penso que sim, mas a miopia do governo português é grande, já com cataratas e tudo. Não percebeu ainda este governo que não são os angolanos que desejam “invadir” Portugal, mas ao contrário, são portugueses que estão a invadir aquela antiga colónia à procura de pão, que o seu solo pátrio lhe nega.

A boa relação de Sócrates com Eduardo dos Santos deveria ser o mote para o estabelecimento de uma plataforma de entendimento e de tratamento recíproco, para que milhares de portugueses participassem do programa de desenvolvimento de Angola. Milhares de professores portugueses, técnicos e pequenos empreendedores, poderiam ter a sua oportunidade de ouro naquele rico e próspero país.

Sabemos há muito tempo desta janela de oportunidades, porém não a rentabilizamos, porque não temos governo com bom senso, nem com estratégia alguma, mesmo com a mais profunda crise das últimas décadas a pressionar.