Mário Russo
Crise é a palavra de ordem em todos os noticiários. O mundo descobriu que estava assente numa economia de faz-de-conta, em que um punhado de senhores organizou um modelo de vilanagem e roubalheira indescritível, com a especulação como arma. Aqui denunciei várias vezes o que emergia das atitudes e comportamentos dessa economia e do deleite que muitos governos sentiam em se embalar no neo-liberalismo dominante sob a bênção do Deus Mercado. Sócrates como virgenzinha vem culpar “quem” não atribuía papel importante ao Estado e tudo ao Mercado, como se ele não se enamorasse dessa onda, transformando a governação do país na gestão de uma empresa comercial ou industrial, cujo único objectivo é o lucro (imediato).
Imaginem agora que uma empresa de engenharia projecta e constrói pontes, barragens e edifícios por todo o mundo, que se desmoronam. O que acontecerá? A empresa é fechada e os responsáveis presos. Pergunto: onde estão os gestores de topo responsáveis por monumental roubalheira? Bancos, as consultadorias/revisoras de contas Arthur Andersons, Deloites, PricesWaterers, empresas de Ratting, reguladores, bancos centrais, etc.? Continuam a receber fortunas.
No entanto, desta vez os Estados têm sido mais rápidos a agir, injectando liquidez no sistema financeiro, do que em situações similares do passado recente em que deixaram bancos ir à falência, na expectativa do reequilíbrio potenciado pelo dito Mercado. Os gurus exaltam esta atitude, pois evita males maiores.
Mas as bolsas animaram? Não. Estão os investidores e os bancos como se estivessem diante de um incêndio. Cada um que se salve. Não há confiança de uns nos outros. Mas, sobretudo não há ideias, pois as receitas para a crise são dos mesmos responsáveis por este descalabro. A hora é dos governos e dos políticos, senão vejamos:
Com o preço das acções a níveis históricos de saldo, é a oportunidade política da intervenção dos Estados fazerem valer o seu peso na economia, adquirindo em bolsa posições maioritárias de activos estratégicos (empresas petrolíferas, de electricidade, mineiras, siderúrgicas, cimenteiras, bancos, seguradoras,..), sem ter que fazer golpe de Estado, porque é ao abrigo da liberdade do dito Mercado.
Nomeiam gestores com regras claras de remuneração para essas empresas. Desenvolvem e contribuem directamente para a animação dos mercados, injectando não só liquidez directamente na economia real, como confiança. O que os governos têm estado a fazer é abastecer o sistema financeiro com a ilusão de resolver a crise de liquidez e de confiança, quando dentro dele os “sanguessugas” aproveitam de novo a fartura, como aconteceu aos 6 presidentes de bancos americanos em plena turbulência do mercado, que vão receber de prémios 70 mil milhões este ano (in DN), ou seja, 10% do que o plano Paulson injectou, que induz a desconfiança no mercado ante tamanha vilanagem.
O Estado, deste modo, valorizará estes activos estratégicos até ao momento em que a economia permita a sua venda em bolsa, ou leilão, ganhando mais-valias aplicáveis em programas sociais e ambientais do governo.
Não onera o erário público, não compra activos tóxicos e torna-se agente activo e interventor, num momento que é dos políticos e dos governos, ante o claudicar do Deus Mercado. É entrar no jogo, substituir o treinador e fortalecer a equipa para vencer.