29/06/2008

Tiros contra o PM ou sinais dos tempos?



Mário Russo


O episódio dos tiros em Portimão, contra o pavilhão onde o Primeiro-ministro José Sócrates havia discursado é lamentável. Deve ser averiguado e o seu autor ou autores punidos adequadamente. É muito mais que uma brincadeira de mau gosto e um precedente que tem de ser banido.
Igualmente grave, foram as declarações da Governadora Civil, que desvalorizou exageradamente o evento. Só faltou mesmo dizer que é normal festejar a presença de PM deste modo, à moda turca.
Claro que são declarações de uma governadora civil, cargo inútil da nossa administração, normalmente objecto de extinção pelos partidos quando estão na oposição, mas que se esquecem quando estão na situação, porque é um cabide de empregos faustoso para “boys/girls”, à custa do povo. Uma vergonha indecorosa que ajuda à percepção que todos temos dos políticos de que são uns troca-tintas e mentirosos, misturando tantos deles que são verticais e com estaleca, dos que são mesmo uns “picaretas”.
No entanto, é uma representante local do governo central que desvaloriza o episódio, obviamente no sentido de tranquilizar as pessoas. Só que não tranquiliza. Antes, deve levar-nos a questionar com rigor o porquê de um acto tresloucado destes.
Penso que a crise, e o que ela vem arrastando, pode justificar tal demência. É um sinal dos tempos difíceis que se avizinham e que os políticos com responsabilidades não podem descurar: as questões sociais. A classe média está a ser esmagada, mas ainda mantém alguma dignidade, mas começa a dar sinais de que está no fundo. É o prenúncio da ruptura social e do descalabro que remete a acções impensadas e desproporcionadas.
Os políticos que não têm esta percepção e antecipam medidas correctoras dos desequilíbrios, estão a cometer um erro que pode levar à desintegração e instabilidade, similar à que aconteceu nas primeiras décadas da nossa república.
Com efeito, a economia pífia que temos experimentado nos últimos anos, em que cada vez mais ganham os ricos e poderosos, em nada ajuda. Veja-se os lucros abjectos e indecorosos sucessivamente apresentados pelos bancos, num estado de crise como a que vivemos.
Veja-se a justiça a seu serviço, que não toma nenhuma posição contra as imorais e abusadas cláusulas contratuais unilaterais que impõem aos clientes. Veja-se como beneficiam injustificadamente de um regime privilegiado de impostos. Enquanto isso a classe média é esmagada.
Hoje o mercado global é movimentado por esses grupos financeiros poderosíssimos num verdadeiro jogo de casino (bolsas de mercadorias, do petróleo, dos metais, da soja, do café,..). Compram as mercadorias e impõe preços. Açambarcam o petróleo e os países compram-nos a esses atravessadores, ante a passividade dos governantes, causando efeitos em cascata na escalada dos preços de bens e alimentos.
O resultado é a crise real, artificialmente construída por essa casta de cartel, que está a minar a coesão social e a empurrar os pobres para o desespero. O que se pode seguir é uma nova Bastilha, se os dirigentes políticos continuarem a ter a falta de sensibilidade para se anteciparem a tragédias anunciadas. E o nosso governo, erradamente dito de socialista, é paradigmático dessa inércia.


engenheiro e permanente no blogue