03/06/2008

Crise do Petróleo ou a vergonha instalada?


Mário Russo


O clima económico mundial passou, de um momento para o outro, de uma quase euforia para a catástrofe, tal o discurso persistente que contamina toda a imprensa. Todos se lembram das previsões optimistas e até eufóricas que os sábios da economia faziam não faz muito tempo. Era o FMI, a UE, o Banco de Portugal, etc.
Agora só se fala da crise, o fim do mundo ao virar da esquina. Parece que um tsunami varreu todos os meios de produção do planeta num ápice. O discurso é o do racionamento de alimentos e o espectro da fome no horizonte.
O preço do petróleo de facto não pára de subir, afectando todas as mercadorias, dada a correlação directa que há entre esta fonte de energia e a produção de bens, numa sociedade preparada para o consumir vorazmente. Mas esta não é uma justificativa que me satisfaz.
Que se saiba não há nenhum factor real que possa ter ditado que o custo de extracção do petróleo tenha aumentado. Os meios humanos e materiais para a sua extracção são os mesmos e o seu custo também (5 US$ no Médio Oriente e 20 US$ nos EUA). Bom, dizem que é o mercado a absorver o previsível aumento do consumo exponencial face ao crescimento da Índia e da China daqui a 2, 5, 10 anos. Bela desculpa à Marcelo R. Sousa.
Já questionei aqui este discurso catastrófico. É a visão que interessa propagar. Quanto mais se vender esta ideia melhor para a especulação de casino que se abateu, tal como o terrorismo fanático pós 11 de Setembro, neste planeta. Tal como o Cartel da droga de Medelim, os outros cartéis, dirigidos por cleptocratas, descobriram que é mais fácil tornar-se hiper-multi milionário “brincando” com o mundo, do que trabalhar. Começou com o “lágrima de crocodilo” George Soros e a especulação sobre a libra que abanou a economia da Inglaterra.
Agora são os CEOs dos grandes fundos de investimento que jogam com a vida das pessoas nos casinos em que se transformou a economia global (bolsas de tudo e mais alguma coisa).
O que se pode fazer com este tipo de economia de casino? Acabar com ela. De fato a ideia inicial era bondosa e consistia em tornar os bens acessíveis a todos pelo melhor preço pela concorrência e transparência. Mas ao se constatar que é perversa, pois foi tomada pelos oligopólios financeiros poderosíssimos que tudo subjugam, só há um caminho que é aniquilar o monstro, antes que ele dê cabo de tudo.
Alguém me diz o que fazem os lideres da União Europeia, EUA, Austrália e Japão nesta crise, para acabar com esta especulação vergonhosa? Nada, para além de ideias rudimentares, pese embora a boa intenção, como a de Sarkozy e lamentarem-se (?).
Individualmente não podemos fazer nada. Não é com os boicotes (que tenho aderido) em abastecer na GALP, BP, que vamos lá, mesmo concordando que a cleptocracia reinante dos gestores pagos a ouro e diamante com base nos lucros, fazem-no a qualquer custo, usando e abusando da sua posição dominante.
Bastaria que a UE, EUA, Japão e Austrália se unissem e determinassem que a aquisição de petróleo para todos eles seria feita em conjunto, ao preço acordado pelos respectivos governos, compatível com o crescimento sustentado da economia mundial. Todos os países têm reservas de vários meses. Bastava não comprar um litro durante 15 ou 20 dias que o preço caía para o valor justo (salvo melhor cálculo, por volta dos 60 US$, face aos custos de extracção e por comparação com a correcção monetária de outros bens).
Porque cairia? Simples. Não haveria como armazenar tanto petróleo produzido e, de uma assentada, liquidaria os especuladores, arruinando-os, por terem de vender muito abaixo do valor de cartilha. Por isso pergunto: a quem interessa este discurso e prática senão a estes especuladores agiotas e seus agentes?
O problema é que neste momento estes especuladores já são mais fortes que governos, de tal sorte que os dominam e determinam as políticas a seguir (que nem carneirinhos). Se assim não fosse certamente não fariam este jogo ultrajante. Falta imaginação e, sobretudo, vergonha, para não ficar nas mãos dos especuladores, e não só dizer que não se pode ficar nas suas mãos, como disse Manuel Pinho.