28/04/2008

A GUERRA DOS APARTADOS


Pedro Laranjeira


Existe uma fobia visceral em certas instituições deste país - incluindo algumas governamentais - relativamente à aceitação de um Apartado de Correios como endereço de uma pessoa.
Certos Bancos aceitam-no, outros não. Certas repartições aceitam-no, outras não. Não há uma regra uniforme, depende de critérios obscuros, quase nunca escritos mas dependentes apenas do funcionário em questão, ou do "chefe" que disse que tinha que ser assim.
É já quase uma tradição: dependendo da circunstância nunca se sabe qual será o "veredicto".
O curioso é que, quando se dá uma morada ou se preenche num impresso, nunca ela é verificada, o número pode nem existir, a rua ou é uma daquelas que há em todo o lado ou se for um nome obscuro é invariavelmente aceite como boa.
Por outro lado, para se obter um Apartado de Correios é preciso fornecer Bilhete de Identidade, Número de Contribuinte, morada de residência e prova dessa morada.
Ou seja, um Apartado garante muito mais fiabilidade de rigor e verdade que qualquer endereço colocado em qualquer impresso.
O comum, porém, é ouvir-se dizer: "não são aceites apartados como endereço".
Na prática, se alguém está entre-moradas ou afastado da sua residência durante algum tempo e aluga um apartado, fica afastado também da sua correspondência, porque muitas instituições preferem "cumprir as regras" a deixar os destinatários receber a correspondência.
Mesmo informadas de que a morada antiga deixou de ser actual, algumas insistem que "não se aceita um apartado" e que os dados serão alterados quando houver uma nova morada. Ou seja, até lá a correspondência será entregue ao "novo inquilino" que, na maior parte dos casos não se dá ao trabalho de fazer uma viagem à estação de correios para devolver a carta e se limita a deitá-la para o lixo.
Há muitas razões para usar um endereço sediado numa Estação Postal e nem sequer passam todas por uma centralização da correspondência - eu próprio tive, durante anos, uma morada onde os meus cães comiam a minha correspondência - chegaram a aprender a abrir a caixa do correio com os dentes… e "leram" muitas das cartas que nunca cheguei a receber, mas os remetentes insistiam, mesmo informados desta situação, em preferir os meus cães ao meu Apartado…
A situação mantém-se, velha de anos, igual ao mesmo marasmo com que o país não se adequa à realidade e, também, à vontade das pessoas ou à eficiência com que querem organizar os seus negócios ou a sua vida pessoal.
Não é caso único: situações semelhantes a esta repetem-se em incontáveis repartições, muitas vezes não porque a lei o determine mas porque iluminados funcionários "acham melhor assim"… vá lá saber-se porquê…
…é por coisas destas que continuamos, em relação ao resto do mundo e particularmente da Europa, orgulhosamente sós na nossa arrogância e, da civilização, assustadoramente… apartados!



director da revista Perspectiva e frequente no blogue