24/01/2008

Política




Maria Teresa Goulão


«As perigosas tentações que espreitavam de todos os lados, para apanhar de surpresa o crente desprevenido, atacavam-no com redobrada violência nos dias de festas solenes».
Declínio e Queda do Império Romano, Edward GibbonNo PSD parece que ainda pouco aprenderam com a lição dada pelas eleições de Fevereiro passado.O mundo mudou e a política também. O que não acompanhou esta mudança é a forma de fazer política e os novos ideais que esta tem que revelar aos portugueses.


Sabemos que esta é uma tarefa de Golias: mudar um partido que durante décadas se encostou ao facilitismo do poder, se habituou às mordomias dos corredores da influência, que fez um novelo de teias entre partido e Estado, que colocou a sociedade civil nas catacumbas e que só se importou com ela em épocas eleitorais.O PSD promoveu e alimentou a confusão entre partido e Estado, Administração Central e Local. Gerou uma imensa teia de cumplicidades entre governo e parlamento, sector empresarial do Estado, empregos públicos locais e outros patamares onde surgia o poder, o poderzinho, o favor, a cunha e a comissão.

Ao que ao nosso sistema viciado em corporativismos oportunos e atávicos ajudou, nunca contestando, antes introduzindo-se, capciosamente no próprio interior do partido e do governo, nas estruturas locais, para que vingassem de forma mais fácil os poderosos interesses das classes corporativas.A «J» feita de uma tribo ignara e sedenta de poder, que subiu ao governo e ao parlamento à conta de lugares conquistados nos festins dos congressos palacianos, ajudou à festa da diminuição da qualidade dos agentes políticos.

O poder foi exercido por séquitos unicamente pelo próprio poder, pela vaidade e lisonja, sem competência técnica, alicerçado numa lógica partidária e de eleição em concelhias e distritais, escola de muitos (não de todos, diga-se), políticos actuais do PSD.Essa diminuição da qualidade dos seus agentes políticos e a sua imensa impreparação política para uma situação sem precedentes onde esquerda está no poder em maioria absoluta, vai ser uma factura muito cara a pagar nos próximos tempos para o PSD.Deste congresso falou-se de regressos messiânicos, de líderes vindos da estrutura partidária, com a inflamação dos discursos com os aforismos de sempre. De novo, só quase se falou sempre de líderes.

No congresso, o PSD de novo a olhar para o seu umbigo.Onde está a viragem que tem que ser dada? Perceber que o eleitorado jovem foge do PSD e não se revê neste partido, entender a erosão do eleitorado rural e do que vive nas cidades. Curioso é que sabendo que 39% da população portuguesa vive em 55% do território nacional que em 2015, 68% dos portugueses viverá em aglomerados com mais de 1 milhão de habitantes, o congresso não tenha reflectido sobre o que esse movimento sobre cidade traz para o PSD e que implicações e que novas respostas exige.

Como é que o PSD vai conquistar esse eleitorado que tem aspirações diferentes e que tem baixas expectativas quanto ao PSD? Quais são os novos ideários? Que resposta tem para eleitorados diferentes? Portugal não é um país de esquerda. O que mudou então? Que alternativa tem o PSD a este Governo? Como irá ele fazer uma oposição activa, credível e permanente e ao mesmo tempo mostrando a Portugal que tem um programa próprio e que não segue fielmente a agenda da esquerda.

Tarefa de Golias para um partido que nunca se viu neste registo: fazer uma boa oposição e ao mesmo tempo construir alternativas de políticas, que não sejam erráticas nem demagógicas.Como é que o PSD vai fazer para que os portugueses vivam melhor. Qual ao modelo que quer para o Estado? Como vai sair do cerco da esquerda? O eleitorado que irá votar em 2009, data da 1º eleição após este ciclo eleitoral que acaba nas presidenciais, tem agora 14 anos. Como é que o PSD vai agir neste mundo pós Google?

Estas deviam ser as respostas que deviam ter inquietado o congresso e o PSD.Há uma nova geração que não tem memória do 25 de Abril. Já nasceram em democracia e que querem coisas novas dos partidos. Os blogs, que surgem 70 por dia em Portugal, mostram que há gente que reflecte sobre a política. Mas que não cola ao que é hoje o programa do PSD, um programa acantonado por temas tradicionais. O PSD para mudar, tem que integrar os novos tempos, as novas pobrezas que nos são revelados por estudos da Saúde e da Segurança Social, a exclusão social, a cidade, a desertificação do mundo rural, as novas causas que o mundo hoje não cessa de nos mostrar.

Usa-se muito a expressão ruptura. O PSD precisa de uma nova governação. Mas é isso mesmo, o PSD para voltar ao poder tem que fazer a ruptura de dentro para fora, ir buscar novas pessoas, apresentar respostas novas aos desafios contemporâneos e emergentes da sociedade, fazer emergir uma nova classe política preparada e formada fora do contexto das redes tradicionais, que também elas assentes em interesses olham com ambição o exercício da política, promover a reforma do sistema política sem a qual Portugal está refém de um modelo datado e nada eficiente.Há que perceber que o BE ganhou eleitorado porque fez política a uma escala que os grandes partidos, o PSD não entende. As pessoas não querem já grandes causas, a política não cola a grandes combates.

A política tem que ser feita numa escala mais reduzida: na escola, no bairro, no quarteirão, na net, onde estão as pessoas que têm expectativas e inquietações locais; o ambiente, o desordenamento urbanístico, a segurança. Tornaram-se pequenas grandes causas. A política é uma missão para as pessoas. È nisso que os portugueses estão descrentes em relação ao PSD. Entendem que o PSD se serve da política e que não os serve a eles. Nada há mais perigoso que esta distância e este desacreditar no exercício da política: só promove radicalismos e anomias.O PSD só pode crescer na procura da diferença de políticas e no confronto de novas causas, desapegado de consensos que por nunca terem sido objecto de contestação, são dado como bons. Um trabalho de Golias.

Escrito na Coluna de Opinião Mensal "Torre de Babel ", In Jornal de Negócios, em 18 Abril 2005
jurista , especialista de Ambiente , convidada de honra do Clube.