31/12/2006

A INDIFERENÇA








JOAQUIM JORGE


A indiferença, o deixar-se levar, nada fazer para alterar o rumo dos acontecimentos, é uma atitude grave de que enferma a sociedade portuguesa. Mas também deixar avançar uma política, uma posição ou determinação, sem a questionar ou meditar, sobre as suas consequências é apanágio dos cidadãos portugueses.
Um sintoma inquestionável que a nossa sociedade não vai bem, tendo perdido o sentido comum do que se deve fazer e do que está correcto. O cretinismo impõe-se lenta e silenciosamente e consideram-se “normais”, “naturais” e “lógicas” determinado tipo de atitudes e posturas que têm relação com a dignidade, a responsabilidade, a memória, honrar a palavra e ter um comportamento ético.
Chega-se a este estado de coisas e aceita-se tudo e mais alguma coisa devido à indiferença, ao laissez faire, laissez passer, não dá para te incomodares. A tudo isto mais a falta de entusiasmo, diria até de curiosidade e sensibilidade passa por sermos negligentes e até não termos preocupações de ordem moral. Os portugueses vivem num estado mental em que não existe dor nem prazer, nem mistura de uma outra. O poder de decidir independentemente dos motivos.

Na política é um exemplo atroz da indiferença que podemos observar em determinadas posições políticas em que excluem, o exemplo e a prática do seu léxico. É igualmente preocupante que os cidadãos apesar de acreditarem na democracia como o melhor dos regimes, se distanciem e alheiem da gestão da vida pública. A moralidade e o sentido de justiça estão gravemente diminuídos, enquanto for possível exibir padrões de vida, luxos e até reprováveis desperdícios sem se saber de onde vem o dinheiro. Temos de continuar a afirmar a abertura da sociedade em todos os domínios, opondo às velhas hierarquias e aos velhos privilégios, o mérito, o talento e a qualidade, assegurando as boas condições para a sua expressão.
A indiferença leva à negligência, à ignorância ao abandono e à inacção. Devemos evitar a todo o custo nada fazer, não pensar e não sentir. Não nos devemos calar perante as atrocidades, as injustiças de algumas políticas. Chamar à atenção para a realidade existente, exigindo atitudes e modos de proceder consentâneas com valores, a sua responsabilização com compaixão e consciência.
Eu sei que falar de ética seja um pouco como a cultura: quanto menos se tem mais se faz alarde dela - e falar muito pode ser suspeito. Por isso não digo mais nada.

Aprendi que para além da morte e dos impostos existe, pelo menos, um outro facto absolutamente incontornável. Não desistir perante a adversidade. É necessário ser perseverante e trabalhar com afinco uma ideia, as ideias ou um ideal.
É importante controlar as promessas feitas pelos políticos em campanhas eleitorais e denunciar as não cumpridas. Os políticos são bons a “mandar” aplicar regras ou exigir o cumprimento de deveres mas ser aplicante, não é com “eles”. Existência de observatórios que tenham poder para verificação da prática governamental com capacidade de questionarem e reprovarem o que se faz mal assim como poderem ser consultados sempre que se tomem decisões importantes que tenham implicações na vida das pessoas. Os cidadãos só são consultados naquilo a que eu chamo os “picos de cidadania”, ir votar de quatro em quatro anos. Convenhamos que é muito pouco!

Uma das maiores malevolências que existe sobre a política é que a maioria dos seus actores “os políticos” são uns mentirosos, outra é acharem-se individualidades tão altas que acham que tudo lhes passa por baixo. Imaginam que têm direito a certos caprichos e de fazer tudo o que querem, sem que ninguém tenha nada a dizer. Há políticos que antes de serem eleitos têm intenções perfeitamente puras. Mas, uma vez em funções, tornam-se uns convencidos e esquecem completamente o objectivo que se tinham fixado. Se me perguntarem se tenho esperança que isto mude? Eu respondo com uma metáfora:” ter tenho esperança, mas é uma esperança negativa”. Não me esquecendo o que diz José Saramago quando lhe perguntam se é um pessimista? Responde:”Não sou um pessimista, mas um optimista informado”.

clubedospensadores.blogspot.com

Está na hora de nos revoltarmos: contra as seguradoras que não zelam pelos segurados; comissões exageradas por serviços prestados; reparações sem garantia; cortes da Net e o consumidor não ressarcido; contas do telefone e telemóveis incorrectas ; etc . Numa frase o respeito dos direitos do consumidor e a efectiva reparação do dano.


jota.jota@sapo.pt
artigo publicado no JANEIRO em 31/12/2006


Biólogo