Mário Russo |
Há uma perceção popular de que os medicamentos (quase sempre
comprimidos) que temos em casa não são perigosos e que são tão pequenos que
podemos descartar com o dito “lixo doméstico” através dos sistemas de gestão
municipal ou mesmo deitando pela sanita abaixo. A maioria das pessoas também
não faz ideia das quantidades que tem em casa, se estão dentro da validade ou
não. Só vão verificar, os que o fazem, quando aparece alguma maleita costumeira
e vasculham nas caixas de comprimidos se existe algum que sirva
(automedicação).
De facto, toda a gente tem medicamentos em casa para
tratamentos esporádicos ou permanentes. Um estudo feito recentemente em
Portugal concluiu que em média, em cada residência há cerca de 1100 g de
medicamentos, dos quais 72% estão sem uso mas com datas de validade em dia e 8%
fora de validade, sendo os restantes 20% os que estão em uso.
Quanto ao descarte dos medicamentos vencidos ou fora de uso,
normalmente são descartados através de descargas nas sanitas para a rede de
drenagem de águas residuais desembocando nas ETAR municipais, ou através dos
sistemas de gestão de resíduos urbanos. Apenas uma percentagem pequena é
corretamente descartada em ecocentros disponíveis em todas as cidades e vilas
de Portugal ou através das farmácias que os recolhem gratuitamente.
Nestes casos os medicamentos terão o encaminhamento correto,
evitando danos ao ambiente que a maior parte das pessoas nem faz ideia dos
danos e da gravidade que as más práticas acarretam.
A UE promulgou uma Diretiva em 2004 que impõe aos Estados
Membros a implementação de esquemas de recolha dos medicamentos sem uso, ou
resíduos farmacêuticos domiciliares. Em Portugal a entidade que tem essa
responsabilidade é a VALORMED, empresa sem fins lucrativos constituída pelos
farmacêuticos, industriais do medicamento e distribuidores, que providencia a
recolha e o posterior encaminhamento para as diversas unidades de tratamento em
função da periculosidade do resíduo em causa. Espera-se que em 2020 já se
consiga que 20% deste tipo de resíduo farmacológico seja separado corretamente
para ter o destino adequado. Ainda estamos longe desta meta.
Porque é que se deve ter maior atenção na gestão deste tipo
de resíduos, sendo tão pouco o que cada família possui:
Os medicamentos contêm ingredientes farmacológicos ativos
que causam danos ambientais e de saúde pública quando descartados nos sistemas
de drenagem de águas residuais ou de resíduos urbanos, cuja consequência ainda é
pouco conhecida sobretudo em termos de saúde pública e ao longo do tempo. No
entanto, análises em águas de rios na Europa evidenciou a presença destes
ingredientes ativos que colocam em risco a saúde pública porque são em muitos
casos fontes de água para a preparação de água para abastecimento público. Há
evidências dos seus efeitos disruptivos na reprodução de populações de peixes,
assim como na criação de condições de resistência bacteriológica aos
antibióticos. Cada vez mais se assiste ao aumento progressivo da resistência de
certas cepas de bactérias patogénicas a antibióticos usuais, pondo em causa a
eficiência de terapêuticas ainda há poucos anos eficazes.
Aquilo que pode parecer inofensivo na realidade é muito
perigoso. Por isso são resíduos com legislação especial e considerados
perigosos e como tal assim devem ser geridos.
Urge passar a palavra para que ninguém descarte os
medicamentos nos esgotos ou juntamente com os resíduos urbanos. Devem ser
separados e entregues nas farmácias ou em ecocentros que os encaminharão de
forma adequada.