Mário Russo |
De visita à Malásia, após Kuala Lumpur, não podia deixar de
visitar Malaca, uma antiga possessão portuguesa que sempre me fascinou, perdida
nos confins do mundo. Ao chegar, pensando tratar-se de uma pequena cidade,
fiquei surpreendido com uma cidade com cerca de 800 mil habitantes, moderna e
muito forte no turismo, naquela região.
Mas o que mais me surpreendeu foi a pronta informação dada
em qualquer lugar, de ser uma cidade que foi portuguesa e património da
humanidade. Claro que é obrigatório visitar os redutos portugueses existentes,
sendo que em termos de património subsiste a Igreja de São Pedro e as tradições
festivas à moda portuguesa e o que resta da fortaleza de Malaca, apelidada de a
Formosa, por Afonso de Albuquerque. O portão de Santiago, que no passado serviu
de entrada na cidade e para sua defesa dos ataques dos inimigos. E o bairro
português, “Portuguese Settlement”, onde
encontramos várias ruas com nomes portugueses e placas muito bem cuidadas, com
uma explicação da origem do nome.
Aqui se encontram restaurantes com nomes portugueses, com a
nossa bandeira e símbolos nacionais e gente a falar português.
Pois bem, em conversa com um cristang (descendente dos
portugueses) de Malaca (Melaka), ele fez questão de nos levar a casa do pai
porque ficaria feliz de falar connosco.
Assim fizemos e o Sr. Jorge Alcantara, filho de descendente
de portugueses e de uma Singapuriana, falava português, ensinou português aos
filhos como o fez seu pai, cantou canções portuguesas, confessou-se português e
falava com um orgulho incrível sobre a pátria lusa, tão distante. Perguntei-lhe
se o Cônsul português na Malásia os tinha visitado (bairro português com cerca
de 2000 pessoas, maior que algumas freguesias em Portugal)? Ele disse que nunca
lá foi. No bairro há um rancho folclórico que canta, dança e se veste á moda
minhota. As canções populares têm muito do folclore português. As comidas
também têm os ares nacionais, numa região em que a culinária é muito
condimentada e picante, diferenciando-se por isso desse matiz.
Portugal conquistou o território em 1511 e o manteve até
1641, quando o perdeu para os holandeses. Mais de quatrocentos anos depois o
pequeno reduto teima em manter as tradições, com um orgulho que não vi até hoje
em lugar nenhum do mundo por onde andaram os portugueses.
A cidade foi considerada património mundial pela Unesco em
2008, precisamente devido ao passado português, que é um orgulho para os seus
habitantes.
As ruínas da antiga fortaleza é local onde se tiram fotografias de eventos,
de casamentos e batizados. Visita obrigatória de milhões de visitantes, mas que
não sabem quase nada de Portugal. Portugal não aproveita estas janelas de
oportunidades que o passado nos legou.
De facto, Portugal que tem recuperado património, em solo
Europeu, esqueceu-se de o fazer de forma consertada em outros territórios, como
é o caso. Gastar uns milhões nesta parte do mundo a recuperar o património,
implantar na fortaleza recuperada um museu multimédia a mostrar o poderio
imperial do passado e o Portugal moderno a milhões de viajantes endinheirados
que visitam a cidade, é retorno garantido. Primeiro é a forma de mostrar como
Portugal é mais importante que o pequeno retângulo europeu muitas vezes
menorizado pelos seus pares da UE. Depois, porque potencia o Portugal moderno a
milhões de visitantes de todos os quadrantes do mundo que visitam Malaca, e com
isso, potencia também o desejo de muitos conhecerem o tal país que foi uma
potência mundial na época dos descobrimentos, quiçá investidores.
Senti orgulho infinito e também tristeza pelo desprezo que
aquela gente foi votada pelas diversas autoridades portuguesas. Os cônsules
portugueses, a maior parte deles uns pavões, cheios de vaidade e que nada fazem
para valorizar o nosso país, são exemplos vivos de como se gasta mal dinheiros
públicos mantendo-os em atividades frívolas e inócuas. Um alerta ao Governo
Português para olhar com olhos estratégicos para os territórios que mantêm
ainda marcas indeléveis da nossa grandeza como oportunidades de valorização do
nosso país.