Mário Russo |
O BES era um banco liderado por
uma família de banqueiros tradicional que passava a ideia de se pautar por
gestão rigorosa e séria, à luz dos princípios dos grandes banqueiros. Há cerca
de dois anos veio a lume um “esquecimento” de uns milhões a mais nos
rendimentos de Ricardo Salgado, o patriarca da família, não declarados ao
fisco. Para remediar a situação pagou o imposto e a multa e tudo se sanou. Nada
que milhares de portugueses não façam ou tenham feito.
O que me surpreendeu foi o
motivo: Ricardo Salgado recebeu uns milhões, de um construtor civil, a troco de
informações privilegiadas a respeito de negócios em Angola. Mas de um banqueiro
com a reputação de Ricardo é que me surpreendeu. Se Ricardo Salgado intermediasse
empresários portugueses com interesses em Angola, beneficiando do seu grande
prestígio, sem receber a clássica “luva” à moda de qualquer pato bravo, ainda
se compreendia. Mas assim, como qualquer comissionista? O avô de Ricardo deve
estar a dar voltas no túmulo.
Nos últimos tempos tivemos a
guerrilha em família que só mostrou fragilidade, a que se juntou uma desastrada
intervenção do Presidente do BdP que sai de mão a abanar, como Pilatus, depois
de mergulhar o Banco em incertezas. Para agravar a situação só mesmo a
inusitada detenção de Ricardo Salgado para averiguações, saindo da prisão sob fiança.
Uma reputação de décadas deitada na lama num ápice. Uma cena entristecedora.
Ricardo e família eram donos de
cerca de 25% do BES. Eram os donos, mas não únicos. No entanto, usaram o banco
para financiar 400 e tal empresas do grupo, umas bem, outras mal geridas e que
deram para familiares e amigos se aproveitarem e viver como marajás das Índias
no mais sumptuoso luxo. Nada contra este tipo de vida, desde que com o próprio
dinheiro. O BES está, por isso, muito exposto a todo o crédito concedido que me
arrisco a dizer incobrável.
O dinheiro do BES foi usado para a
família se movimentar nos vários palcos do mundo dos negócios. Agora o caminho
parece ser o de um BPN. Os indícios são mais que muitos. O argumento do “too
big to fail” que tantas vezes se ouviu, foi desmentido com a falência do Lemann
Brothers. O futuro é negro para o BES e um revés profundo naquilo que ainda há
uns anos parecia indesmentível que é a solidez dos bancos. Hoje desponta a
ideia de que os bancos são organizações de malfeitores, muito bem assessoradas,
que manipulam mercados, que influenciam negócios, que aconselham mal os
clientes para se beneficiarem e fogem aos impostos a sete pés, pondo os
contribuintes a pagar a fatura com o beneplácito dos governantes.
Não é uma boa notícia para Portugal ter um banco ícone ir
por água abaixo. A nova presidência e administração por mais séria e competente
que seja tem limitados poderes e pode não ter condições para devolver a
confiança de que tanto necessitam os bancos. Infelizmente estou pessimista
quanto ao futuro deste Banco que transpirava saúde até há bem pouco tempo. O
trilho parece ir direto para o precipício, tal como aconteceu com o BPN. As semelhanças
são tantas que dificilmente o desfecho será outro. Espero estar enganado e
ficarei muito contente se estiver equivocado.